PABLO PICASSO Duas Mulheres a Correr na Praia 1922 |
1. Em Portugal, a participação dos atletas portugueses nos Jogos Olímpicos deixou de ser um evento desportivo, passando a existir como reprodução da nossa mais pueril tradição nacionalista.
2. Antes das provas, os atletas são entrevistados apenas para garantirem que vão mesmo à procura de uma medalha... São, assim, heróis antecipados de um universo em que não existe mais ninguém, nem mesmo as dezenas ou centenas de atletas de outros países que, escândalo supremo, se atrevem a também disputarem os primeiros lugares, esquecendo que estão lá portugueses...
3. Depois, há os gloriosos minoritários: ganham uma medalha e parece que o país redescobriu o caminho marítimo para a Índia. Com os maioritários, vivemos a tragédia compulsiva: são obrigados a explicar por que perderam, quase sempre omitindo-se o facto de, estranhamente, haver outros atletas que também estavam a competir.
4. Quando ganham, os responsáveis políticos confirmam, ansiosos: não só voltámos a descobrir o caminho marítimo para a Índia como nos preparamos para reduzir a pó as viagens de Richard Branson e Jeff Bezos na atmosfera — Portugal passou a ser o líder incontestado do mundo do desporto, da política e do provincianismo como cultura nacional.
5. De onde vem, para que serve, qual o saldo colectivo deste nacionalismo, literalmente, de trazer por casa? Uma coisa é certa: deixámos de admirar e respeitar o difícil labor dos atletas; limitamo-nos a celebrá-los, quando ganham uma medalha; caso contrário, olhamo-los com obscena piedade.