domingo, junho 07, 2020

Cannes: não há festival... mas há filmes

O cancelamento da edição de 2020 do Festival de Cannes não impediu o certame de fazer a sua selecção oficial. No dia 3 de Junho, Thierry Frémaux, delegado-geral do certame, deu a conhecer os títulos escolhidos, manifestando também a vontade de apoiar a sua difusão este texto foi publicado no Diário de Notícias (4 Junho).

Cancelada a edição de 2020 do Festival de Cannes, o certame não desistiu de fazer o seu trabalho de escolha de filmes. E agora, o seu delegado-geral, Thierry Frémaux [foto], deu a conhecer os títulos de um festival que… não vai acontecer. De acordo com a tradição, a apresentação da selecção oficial decorreu no UGC Normandie, sala de cinema de Paris, desta vez sem jornalistas na plateia. Frémaux estava acompanhado por Pierre Lescure, presidente do festival, hoje mesmo reconduzido no seu cargo para cumprir um terceiro mandato de três anos.
O menos que se pode dizer é que a 73ª edição do maior festival de cinema do mundo não deixaria os seus créditos por mãos alheias. Desde logo, porque a selecção inclui um leque de “habitués” em que podemos encontrar os trabalhos mais recentes de autores como o americano Wers Anderson, o francês François Ozon, o inglês Steve McQueen, o dinamarquês Thomas Vinterberg ou o espanhol Fernando Trueba, sem esquecer a presença também regular da animação dos estúdios Pixar.
Aposta que também se renova (e amplia) é a da escolha de títulos de realizadores estreantes, sector onde podemos encontrar dois actores bem conhecidos: o americano Viggo Mortensen e o francês Laurent Lafitte. Em qualquer caso, Frémaux optou por destacar o nome de Lafitte num outro domínio, desta vez especialmente valorizado pelo festival: o das comédias.
A selecção oficial inclui 56 filmes, escolhidos de um total de 2067 longas-metragens apresentadas ao certame, provenientes de 147 países — são números recorde, o primeiro ultrapassando pela primeira vez os dois milhares, o segundo traduzindo um crescimento de 6,5% em relação a 2019. Em alta muito significativa está também a quantidade de primeiras obras: nada mais nada menos que 909, das quais quinze integram a selecção oficial.
Isto sem esquecer que, naturalmente, o festival continua a manifestar o seu apoio ao conhecimento e divulgação da produção francesa. Há mesmo um reforço desse apoio, com a inclusão de 21 títulos na selecção oficial (mais oito do que em 2019). Como Frémaux fez questão de sublinhar num texto global de apresentação (divulgado no dia 2 no site do festival), tratou-se de expressar, “mais do que nunca”, a solidariedade do festival com a produção e o mercado de França.
Seja como for, a divulgação desta lista está longe de ser uma mera formalidade desligada da actualidade cinematográfica mundial. Desde logo porque, como Frémaux refere no mesmo texto, a existência de uma selecção oficial é “a melhor maneira de ajudar o cinema, destacando os filmes que serão lançados nas salas ao longo dos próximos meses”. Mais ainda: “depois de meses de encerramento, a reabertura das salas de cinema é uma questão crucial.”
Por um lado, trata-se de dar visibilidade a títulos que não deixarão de ser negociados para circuitos de exibição de todo o mundo, só que desta vez de maneira bem diferente: no caso de Cannes, o Mercado do Filme terá, ainda este mês (22 a 26), uma edição virtual. Ao mesmo tempo, por outro lado, o festival vai manter a sua colaboração com certames que, tradicionalmente, ao longo do segundo semestre do ano, acolhem títulos revelados em Cannes: será o caso, entre outros, de Telluride, Toronto, Deauville, San Sebastian ou mesmo Sundance, em janeiro do ano seguinte — ainda com calendário a definir, esses certames irão apresentar filmes desta selecção.
Vale a pena recordar que a selecção oficial é uma designação que não se esgota na competição (consagrada pelo palmarés oficial, encabeçado pela Palma de Ouro), uma vez que integra ainda a secção “Un Certain Regard”, os títulos extra-competição, as sessão da meia-noite e algumas sessões especiais. Pormenor curioso: desta vez, considerando que tal repartição seria supérflua para um evento que não terá concretização prática, o festival divulgou a globalidade dos filmes escolhidos sem os inserir em qualquer secção particular.
Eis os 56 títulos de Cannes 202, distribuídos pelas várias zonas “temáticas” definidas por Frémaux:

* OS FIÉIS
(ou que já estiveram pelo menos uma vez na selecção oficial)

THE FRENCH DISPATCH de Wes Anderson (EUA)
ÉTÉ 85 de François Ozon (França)
ASA GA KURU (True Mothers) de Naomi Kawase (Japão)
LOVERS ROCK de Steve McQueen (Reino Unido)
MANGROVE de Steve McQueen (Reino Unido)
DRUK (Another Round) de Thomas Vinterberg (Dinamarca)
ADN de Maïwenn (Argélia/França)
LAST WORDS de Jonathan Nossiter (EUA)
HEAVEN: TO THE LAND OF HAPPINESS de Im Sang-Soo (Coreia do Sul)
EL OLVIDO QUE SEREMOS de Fernando Trueba (Espanha)
PENINSULA de Yeon Sang-Ho (Coreia do Sul)
IN THE DUSK de Sharunas Bartas (Lituânia)
DES HOMMES de Lucas BELVAUX (Bélgica)
THE REAL THING de Kôji Fukada (Japão)

* OS ESTREANTES

PASSION SIMPLE de Danielle Arbid (Líbano)
A GOOD MAN de Marie Castille Mention-Schaar (França)
LES CHOSES QU’ON DIT, LES CHOSES QU’ON FAIT de Emmanuel Mouret (França)
SOUAD de Ayten Amin (Egipto)
LIMBO de Ben Sharrock (Reino Unido)
ROUGE de Farid Bentoumi (França)
SWEAT de Magnus Von Horn (Suécia)
TEDDY de Ludovic et Zoran Boukherma (França)
FEBRUARY de Kamen Kalev (Bulgária)
AMMONITE de Francis Lee (Reino Unido)
UN MÉDECIN DE NUIT de Elie Wajeman (França)
ENFANT TERRIBLE de Oskar Roehler (Alemanha)
NADIA, BUTTERFLY de Pascal Plante (Canadá)
HERE WE ARE de Nir Bergman (Israel)

* UM FILM DE SKETCHES

SEPTET: THE STORY OF HONG KONG de Ann Hui, Johnnie TO, Tsui Hark, Sammo Hung, Yuen Woo-Ping et Patrick Tam (Hong Kong)

* AS PRIMEIRAS OBRAS

FALLING de Viggo Mortensen (EUA)
PLEASURE de Ninja Thyberg (Suécia)
SLALOM de Charlène Favier (França)
CASA DE ANTIGUIDADES de João Paulo Miranda Maria (Brasil)
BROKEN KEYS de Jimmy Keyrouz (Líbano)
IBRAHIM de Samir Guesmi (França)
BEGINNING de Déa Kulumbegashvili (Georgia)
GAGARINE de Fanny Liatard et Jérémy Trouilh (França)
16 PRINTEMPS de Suzanne Lindon (França)
VAURIEN de Peter Dourountzis (França)
GARÇON CHIFFON de Nicolas Maury (França)
SI LE VENT TOMBE de Nora Martirosyan (Arménia)
JOHN AND THE HOLE de Pascual Sisto (EUA)
STRIDING INTO THE WIND de WEI Shujun (China)
THE DEATH OF CINEMA AND MY FATHER TOO de Dani Rosenberg (Israel)

* 3 DOCUMENTÁRIOS

EN ROUTE POUR LE MILLIARD de Dieudo Hamadi (República Democrática do Congo)
THE TRUFFLE HUNTERS de Michael Dweck et Gregory Kershaw (EUA)
9 JOURS À RAQQA de Xavier de Lauzanne (França)

* 5 COMÉDIAS

ANTOINETTE DANS LES CÉVÈNNES de Caroline Vignal (França)
LES DEUX ALFRED de Bruno Podalydès (França)
UN TRIOMPHE de Emmanuel Courcol (França)
L’ORIGINE DU MONDE de Laurent Lafitte (França)
LE DISCOURS de Laurent Tirard (França)

* 4 FILMES DE ANIMAÇÃO

AYA TO MAJO (Earwig and the Witch) de Gorô Miyazaki (Japão)
FLEE de Jonas Poher Rasmussen (Dinamarca)
JOSEP de Aurel (França)
SOUL de Pete Docter (EUA)