O cinema de Pedro Costa tem evoluído a partir de uma aguda consciência política. Entenda-se: no sentido em que a política se define a partir da tensão entre os lugares sociais e a singularidade dos corpos.
A partir de hoje nas salas, Vitalina Varela é, nessa medida, o mais político dos filmes. Não por qualquer banal inscrição "social" da sua história — a chegada de uma mulher de Cabo Verde a Portugal, três dias depois do funeral do marido —, antes porque somos levados a compreender que a odisseia da personagem central excede os limites, regras e valores da sociabilidade dominante e, em particular, da sua rotina mediática. Será preciso acrescentar que estamos perante um objecto radical que nos convoca para uma crítica metódica das imagens dominantes?
No limite, podemos recuperar uma expressão de Francis Ponge (1899-1988), relançada por Jean-Luc Godard em Deux ou Trois Choses que Je Sais d'Elle (1967): é a "raiva da expressão" que move esta contundência do olhar, a sua crueza poética e também a hipótese de redenção que o habita.