sábado, julho 27, 2019

Brian De Palma: um americano em Copenhaga

Brian De Palma dirigindo Nikolaj Coster-Waldau e Carice van Houten
O veterano americano Brian De Palma mantém as suas qualidades de narrador: Domino – A Hora da Vingança, produção totalmente europeia, é um “thriller” à moda antiga — este texto foi publicado no Diário de Notícias (25 Julho).

Subitamente, eis um filme protagonizado por dois actores popularizados pela sua participação na série A Guerra dos Tronos: o dinamarquês Nikolaj Coster-Waldau e a holandesa Carice van Houten. O certo é que, ao descobrirem Domino – A Hora da Vingança, os cinéfilos não poderão deixar de celebrar o nome de quem assina a sua realização: o veterano americano Brian De Palma (78 anos).
Na verdade, o cineasta de títulos tão admiráveis como Carrie (1976), Blow Out – Explosão (1981), Os Intocáveis (1987), Missão Impossível (1996) ou Os Olhos da Serpente (1998) já não ocupa a linha da frente de Hollywood. Parece mesmo um daqueles artistas assombrados pela cegueira da indústria, “desaparecido em combate”... Depois do insucesso de Missão a Marte (2000), deixou mesmo de contar com o apoio dos grandes estúdios.
Seja como for, Domino é mais uma obstinada demonstração da energia criativa de De Palma, já há alguns anos a apoiar-se em financiamentos europeus. O seu título anterior, Paixão, com Rachel McAdams e Noomi Rapace, surgira em 2012, resultando de uma co-produção França/Alemanha. Domino tem a Dinamarca como país organizador, contando com contribuições de França, Itália, Bélgica e Holanda.
Enfim, não deixa de ser surpreendente que De Palma não se perca nesse labirinto de produção, afinal de meios relativamente escassos. A disciplina inerente à sua visão consegue mesmo recuperar um certo espírito de “série B” que se adequa às mil maravilhas ao barroquismo da realização, tansfigurando situações convencionais em pequenas proezas de mise en scène.
O argumento explora um velho cliché do “thriller” urbano: dois polícias mantêm as rotinas de vigilância na sua cidade (Copenhaga), um deles é morto logo nos primeiros minutos do filme, empenhando-se o sobrevivente em desmontar a teia de relações e cumplicidades que levou ao fim do seu companheiro... Isto num drama em que vão emergindo as mais sinistras marcas do terrorismo do Daesh, aliás expostas com gélido realismo pelas imagens de De Palma, inclusive na sua forma de ocupação dos circuitos da Internet.
Num tempo cinematográfico contaminado por tantas banalidades ligadas à crescente formatação de aventuras de super-heróis, há qualquer coisa de salutar (cinefilamente salutar, entenda-se) neste reencontro com um cineasta que não esqueceu as lições mais básicas do património dramatúrgico de Hollywood. De Palma não precisa de efeitos especiais mais ou menos estereotipados para contar uma história vibrante, conseguindo mesmo algumas cenas (veja-se a perseguição nos telhados, logo após a morte do polícia) em que vislumbramos os sinais de uma genuína elegância clássica.