>>> A forma do meu cinema, com todos os altos e baixos, com todos os pontos brilhantes e obscuros, com tudo o que tem de feio e de bonito é a expressão da minha personalidade. Então, eu assumo o meu ego, mas não de um ponto de vista narcisista ou individualista, mas de um ponto de vista órfico, no sentido de não tentar mudar o mundo, mas, como Orfeu, tentar criar um novo mundo audiovisual. Se eu criei condições históricas e económicas para produzir um tipo de filme segundo a minha pulsão (que é a única forma de sobreviver) tenho que assumir os riscos da incompreensão — isso para mim faz parte do jogo dramático da cultura.
GLAUBER ROCHA
— entrevista para catálogo da Cinemateca Portuguesa
Sintra, 8 de Abril de 1981
Quando entrevistei Glauber Rocha em Sintra, ninguém poderia antecipar, como é óbvio, a notícia que receberíamos cerca de quatro meses mais tarde, pouco tempo passado sobre o seu regresso ao Brasil: na sequência de uma infecção pulmonar, Glauber faleceu a 22 de Agosto de 1981, no Rio de Janeiro, contava 42 anos. A retrospectiva (integral, como ele confirmou) que a Cinemateca Portuguesa lhe dedicara em Abril ficou, assim, como memória didáctica e urgente de um criador ímpar na história do Brasil e da cultura de língua portuguesa.
Vendo ou revendo os seus filmes, podemos reconhecer que, desde a primeira longa-metragem, Barravento (1962), até ao título final, A Idade da Terra (1980), Glauber foi um incansável viajante da(s) história(s) entre identidade brasileira e uma visão cósmica do factor humano, não poucas vezes entre as verdades mais cruas da tradição e as utopias menos transparentes do progresso. Lembrá-lo é, por isso, reaprender esse jogo dramático da cultura como questão íntima e incontornável, não apenas do seu trabalho, mas também do nosso incerto presente.
Glauber nasceu no dia 14 de Março de 1939, em Vitória da Conquista, estado da Bahia — faz hoje 80 anos.
>>> A Idade da Pedra — entrevista de Luís Fernando Silva Pinto, Veneza, 1980.
>>> Enciclopédia Itaú Cultural: Glauber Rocha.