segunda-feira, janeiro 29, 2018

Quartetos de cordas na Gulbenkian

DMITRI CHOSTAKOVITCH
[Wikipedia]
* David Oistrakh String Quartet
[Gulbenkian, 27 Jan., 15h00]

* JACK Quartet
[Gulbenkian, 27 Jan., 18h00]

Os dois primeiros concertos do Festival Quartetos de Cordas, na Fundação Gulbenkian, não poderiam ter sido mais contrastados — e também mais sugestivos. Observe-se o programa: no primeiro, com o David Oistrakh String Quartet, tratava-se de percorrer caminhos exemplares do século XIX, evocando Sergei Rachmaninov, Piotr Ilitch Tchaikovsky e Niccolò Paganini, embora integrando um radical "desvio" para o século XX, com o Quarteto para Cordas nº 3, em Fá maior, op. 73, composto em 1946 por Dmitri Chostakovitch; no concerto seguinte, a primeira parte envolveu duas encomendas da própria fundação: uma muito recente, Quarteto de Cordas nº 1, Unvanquished Space (Espaço por conquistar), de Andreia Pinto Correia (em estreia mundial), outra, Tetras, composta por Iannis Xenakis em 1983 — a segunda parte foi preenchida com o tour de force do Quarteto para Cordas nº 9, de Georg Friedrich Haas, obra interpretada na escuridão total.
Como é óbvio, a obra de Haas envolve uma espécie de superação da própria percepção das matérias musicais, prendendo-nos na escuridão e, por assim dizer, libertando-nos para um espaço/tempo em que já não há coordenadas a não ser as que são estabelecidas pelos sons que nos envolvem — o seu desejo experimental foi um belo complemento das obras de Pinto Correia e Xenakis, elas próprias unidas (à distância de mais de três décadas) pela vontade de desafiar códigos e estruturas, no limite, violentando a sonoridade corrente dos instrumentos.
Enfim, no primeiro evento, o sentimento "tradicional" de Rachmaninov, Tchaikovsky e Paganini (este representado pela alegria de dois temas dos Caprichos) confrontou-se com a tensão do quarteto de Chostakovitch, reflectindo as suas experiências da guerra — remetendo para um contexto tão específico, e também tão dramático, terá sido a obra mais universal, e também mais intemporal, que se escutou nessa tarde magnífica do Grande Auditório.

>>> Este é um registo do David Oistrakh String Quartet, precisamente da obra de Chostakovitch que interpretaram na Gulbenkian (terceiro andamento, Allegro non troppo).