A chegada de Ghost in the Shell é pretexto para uma breve deambulação por alguns dos títulos marcantes na carreira de Scarlett Johansson — este texto foi publicado no Diário de Notícias (25 Março), com o título 'De musa de Woody Allen a estrela dos filmes da Marvel'.
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O ano de 2003 revelar-se-ia decisivo na superação da imagem infantil de Johansson, através de duas obras de sedutoras singularidades: Lost in Translation, de Sofia Coppola (lançado entre nós com o título bizarro O Amor É um Lugar Estranho), e Rapariga com Brinco de Pérola, evocação de uma musa do pintor Johannes Vermeer, com realização do inglês Peter Webber e direcção fotográfica do português Eduardo Serra (nomeado para o Oscar de melhor fotografia).
Ambos os filmes valeram-lhe nomeações para os Globos de Ouro da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood. Não ganhou (aliás, nunca ganhou um Globo, não tendo qualquer nomeação para os Oscars). O certo é que o seu estatuto simbólico mudava: deixava os papéis de “eterna” adolescente e entrava nas convulsões da idade adulta. O encontro com Woody Allen faria o resto: Match Point (2005), Scoop (2006) e Vicky Cristina Barcelona (2008) definem um capítulo especial na trajectória de ambos, a ponto de haver quem tivesse sugerido que o realizador poderia ter encontrado uma nova musa para “ocupar” o lugar que já tinha pertencido a Diane Keaton e Mia Farrow.
As coisas não aconteceram assim, até porque, como o próprio Woody Allen esclareceu numa entrevista dada à MTV, em 2008, a participação de Johansson em Match Point teve algo de acidental (a primeira escolha fora Kate Winslet que, necessitando de um período de repouso, pediu para abandonar o projecto). Woody Allen reconheceu-a de imediato como “encantadora, brilhante e divertida”, doando-lhe uma personagem susceptível de transfigurar toda uma carreira — subitamente, Johansson emergia como uma mulher capaz de representar as nuances afectivas e os enigmas sexuais de uma relação adulta.