La La Land |
Globos de Ouro, 8 Jan. 2017 |
1. A vida "social" das redes virtuais está recheada de apelos ao conflito — não há gosto pelo confronto (de ideias, nomeadamente), mas quase sempre se favorece tudo aquilo que possa acicatar ânimos e reduzir o mundo às mais pueris formas de conflitualidade. Assim, por exemplo, o número de abertura da cerimónia dos 74ª edição dos Globos de Ouro da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA): como é possível que tal número tenha privilegiado um filme (La La Land), para mais imitando uma das suas cenas (um bailado numa paisagem de automóveis) com imagens profusamente difundidas... e o mundo "social" não faça o mais pequeno reparo sobre a gravidade de tal facto?
2. Que está em jogo? Evitemos o simplismo: nada disto tem a ver com o facto de La La Land ser um "bom" ou "mau" filme — por mim, ainda não o vi, mas não será qualquer juízo de valor (meu ou seja de quem for) que altera a questão. O que importa é confrontar, precisamente, conceitos dificilmente conciliáveis. A saber: é suposto uma organização que atribui prémios (no cinema ou em qualquer domínio artístico) manter uma sóbria equidistância face aos objectos que vai premiar. Não o fazendo, corre o risco de ser interpretada como tentando fazer passar mensagens subliminares antes de anunciar as suas distinções.
3. Outra mensagem, muito menos subliminar — e de inequívoca carga simbólica — teve a sua origem num dos patrocínios oficiais dos Globos de Ouro. A saber: o Twitter (os apresentadores na passadeira vermelha tinham mesmo microfones ostentando a sigla da HFPA e o logotipo do Twitter). Não está em causa a legitimidade da opção — por que não? Em todo o caso, tal aliança envolve a promoção de uma pobre ideia discursiva: a partir de agora, falar de filmes com um máximo de 140 caracteres deixou ser uma futilidade, passou a ser um estilo. Há coisas piores, é verdade: convenhamos que fazer a gestão da Presidência dos EUA através do Twitter será sempre mais inquietante.