quarta-feira, dezembro 21, 2016

Zsa Zsa Gabor (1917 - 2016)

Foi famosa pela própria fama: Zsa Zsa Gabor simboliza de forma exemplar um certo conceito clássico de "glamour" — este obituário foi publicado no Diário de Notícias (20 Dezembro), com o título 'Morreu uma das últimas estrelas da “idade de ouro” de Hollywood'.

Para várias gerações de espectadores, mesmo os que nunca viram um dos seus filmes, ela vai ficar como um dos símbolos mais universais de Hollywood e do seu glamour: Zsa Zsa Gabor não resistiu a um ataque cardíaco e faleceu no domingo, dia 18, na sua casa de Bel-Air, Los Angeles, contava 99 anos.
Esboçar o seu retrato será sempre um misto de objectividade e ironia, aliás de acordo com uma atitude de elegante frivolidade que ela cultivou ao longo de muitas décadas de fama. De tal modo que os marcos da sua carreira cinematográfica ficam quase sempre secundarizados face a outras proezas de uma exuberante e bem disposta existência.
Na lista de tais proezas, para além de uma estalada dada a um polícia de Beverly Hills que, em 1989, a apanhou a conduzir o seu Rolls-Royce com a carta de condução caducada, constam nove heróicos casamentos, incluindo-se entre os consortes o magnate da hotelaria Conrad Hilton e o actor George Sanders. Pedagogicamente, gostava de explicar que “uma mulher deve casar por amor, e continuar a casar-se até o encontrar”. Isto sem esquecer, claro, que as pequenas atribulações inerentes às separações lhe permitiram corrigir o sentido original da célebre canção de Marilyn Monroe : “Aprendi que não são os diamantes, mas os advogados de divórcios, os melhores amigos de uma mulher”.
Tudo começou na Hungria, em Budapeste, onde nasceu a 6 de Fevereiro de 1917, no seio de uma família judia que acabaria por fugir à ameaça nazi. Em 1936, portanto aos 19 anos, era eleita Miss Hungria; no começo dos anos 40, ela e as suas duas irmãs, Magda e Eva, já estavam nos EUA, criando ligações com o vasto mundo do entertainment. Muitas vezes, o nome de Zsa Zsa surge erradamente associado à popular série televisiva Green Acres/Viver no Campo (1965-1971), protagonizada pela irmã Eva, ao lado de Eddie Albert.
A sua interpretação mais famosa aconteceu em Moulin Rouge (1952), de John Huston, biografia ficcionada do pintor Toulouse-Lautrec (interpretado por José Ferrer) em que compunha a figura de Jane Avril, lendária bailarina de Can-Can. Surgiu também, por exemplo, em Lili (1953), musical com Leslie Caron, na comédia O Rei do Circo (1954), com a dupla Jerry Lewis/Dean Martin, e ainda num pequeno papel na obra-prima de Orson Welles, A Sede do Mal (1958), como dona de um clube de striptease. Entre os seus títulos mais exóticos inclui-se a ficção científica de “série B” Queen of Outer Space/Garotas do Outro Espaço (1958), de Edward Bernds,.
Como aconteceu com vários actores e actrizes cujas carreiras tinham começado ao logo dos anos 40/50, Zsa Zsa Gabor foi encontrando cada vez menos oportunidades nos filmes da década de 60, surgindo com mais frequência em séries televisivas como Mister Ed, The Dick Powell Show ou The Bob Hope Show. Ilustrando a sua condição de símbolo nostálgico da “idade de ouro” de Hollywood, em muitas das suas participações no cinema veio a assumir, com evidente boa disposição caricatural, o seu próprio papel; entre os exemplo mais insólitos inclui-se uma breve participação no filme de terror Pesadelo em Elm Street 3 (1987), de Chuck Russell.
Só mesmo os crescentes problemas de saúde a levaram a abandonar, em meados dos anos 90, os eventos sociais em que tanto gostava de aparecer. Escreveu uma autobiografia, My Story, em 1960. Publicou ainda mais três livros cujos títulos podem resumir a sua festiva atitude perante a vida: “Guia Completo de Zsa Zsa para os Homens” (1969), “Como Apanhar um Homem, como Conservar um Homem, como Ver-se Livre de um Homem” (1970) e, por fim, “Uma Vida Não Basta” (1991).

>>> Obituário no New York Times.