quinta-feira, novembro 17, 2016

Retalhos da vida dos Pink Floyd (parte 1)


Está em curso aquilo que parece ser a edição definitiva das obras dos Pink Floyd. Os álbuns estão a regressar às lojas em suporte de vinil em novas edições que traduzem não apenas um cuidado no corte e prensagem, mas no próprio tratamento prévio do som, remasterizado a partir das fitas analógicas originais.

Lançados segundo uma ordem cronológica, estes lançamentos já nos fizeram avançar até 1973, o ano de Dark Side of The Moon. É contudo para contar, ao mais pequeno detalhe, tudo o que aconteceu antes, que acabou de ser editada uma caixa (de volume e conteúdo impressionantes) que nos conta a história complementar ao que os álbuns nos deram a conhecer. The Early Years 1965-1972 junta uma CD, DVD, Blu-Ray, cinco singles em vinil e inúmeras reproduções de posters, flyers, bilhetes de concertos, recortes de imprensa, convidando-nos a uma viagem no tempo que define um novo paradigma pelo qual certamente poderemos esperar outras integrais de outros artistas em tempos futuros.

Ao mesmo tempo, e até porque esta caixa está longe de ser acepipe de preço reduzido, foi editada uma antologia que, com o mesmo título, conta parte desta mesma história num alinhamento compactado a dois CD. Para um olhar mais “completo” sobre este percurso entre as origens do grupo e a edição de Obscured by Clouds, o disco com a música criada para o filme La Valée, de Barbet Schroeder, que precede Dark Side of The Moon, aqui fica um olhar pela caixa, segundo os sete volumes nos quais os temas, vídeos e imagens são arrumados.


A etapa inicial da vida dos Pink Floyd, que corresponde ao período em que Syd Barrett é o seu vocalista e principal força criativa, é recordada num conjunto de gravações que recuam até inícios de 1965, quando dão a ouvir os resultados de uma primeira sessão em estúdio. Está ali, além do vocalista e dos restantes membros da formação “clássica” Roger Waters, Nick Mason e Rick Wright, o guitarrista Rado Klose, que com eles já tocava mas em breve sairia de cena. O alinhamento, com quatro temas de Syd, um de Waters e uma versão de um original de Slim Harpo – que teve primeira edição num EP de tiragem limitada em finais de 1965 – permite-nos um olhar sobre os caminhos originalmente trilhados pelo grupo, ainda sob evidente expressão de uma admiração pelos blues... 

Sinais de mudança chegam nos dois primeiros singles de 1967, Arnold Layne e See Emily Play, editados antes do álbum Piper At The Gates of Dawn, por eles passando já marcas de uma transformação nas formas, instrumentação e cores da música que faria dos Pink Floyd uma das forças mais marcantes do psicadelismo made in UK. O CD1 deste volume – que apresenta por título 1965-1967 Cambridge Station (numa alusão geográfica ao lugar onde as ideias começaram a brotar) inclui os lados B desses singles, assim como junta Apples and Oranges, bizarra (mas deliciosa) tentativa de criação de um novo single capaz de servir de sucessor ao sucesso de See Emily Play (o que não aconteceu). Há ainda aqui misturas novas para temas como Matilda Mother (excelente!) ou Jugband Blues (a única canção de Syd a figurar depois no álbum de 1968), surgindo depois inéditos como In The Beechwoods, Scream Thy Last Scream (que faz uma curiosa rima com o contemporâneo The Laughing Gnome de David Bowie) ou Vegetable Man (outra hipótese ponderada para o terceiro single), que nos ajudam a completar o retrato desse 1967, ao qual o CD 2 junta a gravação de uma atuação ao vivo em Estocolmo, num alinhamento de oito temas entre os quais emerge já Set The Controls For The Heart of The Sun. Este CD2 acrescenta ainda nove takes alternativos de John Latham, outra experiência de caráter exploratório em consonância com a demanda estética que o grupo tomava em busca de um caminho para um segundo álbum, em setembro de 1967.

 O DVD e Blu-ray que completam este “volume” inclui filmes promocionais para Arnold Layne, The Scarecrow e Jugband Blues, uma atuação no Top of The Pops ao som de See Emily Play e uma outra, no programa de Dick Cavett, nos EUA, com  Apples and Oranges. Vale a pena notar, nesta atuação, o olhar já distante de Syd Barrett, como contraponto podendo servir uma entrevista para a BBC na qual tocam Astronomy Domine e, tanto ele como Roger Waters, resistem estoicamente aos comentários do apresentador do programa, claramente incomodado pela “barulheira” da atuação. Há duas reportagens que nos levam aos ambientes do clube UFO em inícios de 1967, assim como excertos de atuações ao vivo captadas para a televisão ao longo do ano, numa delas, para a BBC, sendo apresentado Intersrellar Overdrive. As imagens mais antigas, captadas em 1966, surgem, compostas, ao som de Chapter 24, revelando-nos memórias de uma banda nos seus tempos de juventude.

 Entre as reproduções de memorabillia que aqui encontramos há um bilhete de um concerto no Queen Elisabeth Hall a 12 de maio de 1967, assim como o respetivo cartaz, no qual se sublinha (como na letra de See Emily Play), a ideia de “Games For May”... Há um anuncio de jornal para uma atuação no UFO em dezembro de 1966, flyers para diversas outras atuações e um recorte de imprensa no qual Chris Jagger (sim, o irmão de Mick), faz um elogio dos Pink Floyd, prevendo uma carreira de sucesso. Ao referir as suas prestações ao vivo diz: “em palco os Pink Floyd perdem-se completamente na sua música e o seu objetivo é o de absorver as mentes dos que estão a vê-los, o que não é fácil com as atmosferas cool que encontramos por Londres”. O booklet, com um texto de Mark Blake, ajuda a contextualizar depois todas estas músicas e imagens.