sábado, novembro 14, 2015

Wim Wenders: redes sociais e solidão (2/2)

Rodagem de Tudo Vai Ficar Bem
— James Franco e Wim Wenders
A passagem de Wim Wenders pelo LEFFEST foi pretexto para uma conversa sobre redes sociais, o futuro do cinema e o 3D — esta entrevista foi publicada no Diário de Notícias (8 Novembro), com o título '“As redes sociais estão a gerar uma imensa solidão'.

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Como podemos caracterizar a experiência do escritor [James Franco] de Tudo Vai Ficar Bem?
Acontece-lhe algo de terrível que, afinal, pode acontecer a qualquer pessoa: estar envolvido, mesmo sem culpas, num acidente em que a vítima é uma criança. A maneira que encontra para lidar com a questão é integrá-la no seu trabalho — de alguma maneira, usa a experiência para se tornar um escritor melhor.

Do seu ponto de vista, porque é que ele regressa à personagem da mãe [Charlotte Gainsbourg] da criança?
Em boa verdade, é ela que o convida. Trata-se de alguém que compreende que pode ser bom para ele saber que não é o único a sofrer. No fundo, ela diz-lhe: “Também me culpo e não sou eu que tenho de o perdoar a si — tem de começar por se perdoar a si próprio”.

Se ela o convida, qual é, da sua parte, o convite que dirige aos espectadores?
Trata-se de convidá-los para uma partilha muito especial. Em particular na versão do filme em 3D, os espectadores podem ter um envolvimento muito maior com as personagens, os seus modos de vida e pensamentos. Sentimos que estamos na mesma sala, com eles, sentados a seu lado — o 3D tem essa capacidade de nos dar a sensação de uma presença muito forte, à nossa frente; as câmaras de 3D conseguem ver mais do que qualquer câmara anterior, quase como um raio X da alma.

Parece-lhe que o 3D está a mudar a ligação emocional que o espectador pode estabelecer com um filme?
Tenho a certeza que está. Há mesmo partes do nosso cérebro que não estavam e passaram a estar envolvidas na visão de um filme em 3D — todo o nosso ser está mais envolvido porque estamos também mais imersos. A questão está em saber se as pessoas conseguem lidar com isso, já que o 3D que temos visto em blockbusters e filmes de acção tem feito exactamente o oposto, sendo encarado apenas como um instrumento de entertainment. Ora, do meu ponto de vista, o 3D é antes uma via ideal para penetrar, não no mundo de outros planetas, mas no nosso mundo interior.

Na sua trajectória com o 3D, que importância teve a experiência do filme sobre Pina Bausch [Pina, 2011]?
Foi um filme que me fez sentir a necessidade do 3D — se não fosse em 3D, não o teria feito, não me teria atrevido a entrar no reino da dança. Digamos que o 3D foi mesmo o instrumento que fez com que me sentisse autorizado a abordar a dança. Aliás, também em 3D, fiz um filme sobre arquitectura [Cathedrals of Culture]. Em qualquer caso, penso que continuam por explorar muitas das suas capacidades para nos fazer entrar numa determinada história — e espero que Tudo Vai Ficar Bem seja um primeiro esforço no sentido de mostrar o que o 3D pode fazer numa história intimista.

Entretanto, está também entre nós para expor um conjunto das suas fotos de Portugal.
Algumas são de 1980, quando fiz O Estado das Coisas; outras de 1989/90, quando rodámos aqui algumas cenas de Até ao Fim do Mundo; a maioria são de 1994, quando filmei Viagem a Lisboa.

São também marcas de uma relação emocional com Portugal?
Sem dúvida. E também com o escritor que, na verdade, me revelou Portugal e Lisboa — foi Pessoa.