CD Memphis Industries / Popstock
4 / 5
Num mundo tão cheio de tantos discos há sempre aqueles que injustamente vão ficando para trás, adiando o momento da sua (re)descoberta ou de um outro melhor momento para um contacto mais bem sucedido com os seus autores… Vejamos os Japan… Editaram dois álbuns nos anos 70 sem que ninguém neles reparasse. Mais dois em 1980 sob discreta atenção. E quando, em 1981, editam a sua obra-prima Tin Drum, a coisa chegou com um “boa noite e muito obrigado”, partindo David Sylvian para uma das mais brilhantes carreiras a solo do nosso tempo e os demais músicos para aventuras mais ou menos cativantes, os Japan deixando uma obra que o tempo aprendeu a tomar como referencia maior do seu tempo (OK, os dois álbuns de 1978 são mais curiosidade de uma banda ainda sem bússola afinada, mas contam a primeira parte de uma história ímpar da pop de então).
Não é por acaso que falo dos Japan na hora de falar sobre os Dutch Uncles. Não pelo berço made in UK (os Dutch Uncles são de uma pequena cidade na zona da grande Manchester, ao passo que os Japan eram do sul de Londres). Nem apenas pelo facto de terem já editado três álbuns antes daquele que hoje nos faz deles falar. Mas porque há na sua música um gosto pelo labor de ideias, criando canções de algumas complexidade formal que, todavia, e tal como na etapa final da obra dos Japan, não evitam nunca a forma “clássica” de arrumar os elementos da canção. Este é um argumento que se manifesta a um nível estrutural na forma de pensar a canção já que, entre discos de uma Kate Bush – etapa de inícios dos oitentas – ou Talking Heads encontramos sugestões mais próximas da sonoridade com que os Dutch Uncles agora se apresentam.
Há assim um antes a ter em conta antes deste surpreendente Oh Shudder. Num clima pop/rock anguloso, com guitarras herdadas de memórias pos-punk encetaram em 2009 uma discografia com Dutch Uncles, evoluindo em continuidade no seguinte Candenza (2011) mas sugerindo desejos de busca de novos rumos no bem mais interessante Out Of Touch In The Wild (de 2013). É nesse álbum de 2013 que ganha protagonismo outra ordem instrumental, abrindo o caminho a uma mais evidente manifestação de cores e linhas desenhadas com electrónicas, com ocasionais presenças de madeiras e sem esquecer a mais clássica presença de guitarras, pianos e percussões. As canções exploram agora novas potencialidades que um labor mais exigente na instrumentação pode levar à canção, juntando à (relativa) invulgaridade da voz aguda de Duncan Wallis uma paleta de tons e luzes que instalam no ouvinte uma perplexidade inicial que rapidamente cede lugar a um relacionamento de atenção para com o detalhe e progressivo entendimento com canções que, desafiantes num primeiro contacto, em pouco se transformam numa presença saborosa e familiar.
O gosto pelo talhar de formas menos imediatas mas em claro contexto pop – como em tempos escutámos também nuns Tears For Fears ou nos últimos álbuns de uns XTC – serve assim um álbum onde se expressam contos e cantos sobre cenas da vida aos vinte e poucos anos. Ou seja, transporta angústias, algumas delas comuns a quem ainda ali não chegou, mas expressa-as num ponto da situação no patamar dos 25 e arredores. Saúde, sexualidade, o relacionamento com os outros… E integra os textos num contexto cenicamente elaborado, onde por vezes talvez a orquestração roube atenções. Mas que, em conjunto, não só faz deste conjunto de canções o melhor disco dos Dutch Uncles até à data como assegura a 2015 um belo exemplo do que pode ser a pop quando não está com vontade de correr atrás dos sabores mais fáceis da multidão que domina o momento.
Num mundo tão cheio de tantos discos há sempre aqueles que injustamente vão ficando para trás, adiando o momento da sua (re)descoberta ou de um outro melhor momento para um contacto mais bem sucedido com os seus autores… Vejamos os Japan… Editaram dois álbuns nos anos 70 sem que ninguém neles reparasse. Mais dois em 1980 sob discreta atenção. E quando, em 1981, editam a sua obra-prima Tin Drum, a coisa chegou com um “boa noite e muito obrigado”, partindo David Sylvian para uma das mais brilhantes carreiras a solo do nosso tempo e os demais músicos para aventuras mais ou menos cativantes, os Japan deixando uma obra que o tempo aprendeu a tomar como referencia maior do seu tempo (OK, os dois álbuns de 1978 são mais curiosidade de uma banda ainda sem bússola afinada, mas contam a primeira parte de uma história ímpar da pop de então).
Não é por acaso que falo dos Japan na hora de falar sobre os Dutch Uncles. Não pelo berço made in UK (os Dutch Uncles são de uma pequena cidade na zona da grande Manchester, ao passo que os Japan eram do sul de Londres). Nem apenas pelo facto de terem já editado três álbuns antes daquele que hoje nos faz deles falar. Mas porque há na sua música um gosto pelo labor de ideias, criando canções de algumas complexidade formal que, todavia, e tal como na etapa final da obra dos Japan, não evitam nunca a forma “clássica” de arrumar os elementos da canção. Este é um argumento que se manifesta a um nível estrutural na forma de pensar a canção já que, entre discos de uma Kate Bush – etapa de inícios dos oitentas – ou Talking Heads encontramos sugestões mais próximas da sonoridade com que os Dutch Uncles agora se apresentam.
Há assim um antes a ter em conta antes deste surpreendente Oh Shudder. Num clima pop/rock anguloso, com guitarras herdadas de memórias pos-punk encetaram em 2009 uma discografia com Dutch Uncles, evoluindo em continuidade no seguinte Candenza (2011) mas sugerindo desejos de busca de novos rumos no bem mais interessante Out Of Touch In The Wild (de 2013). É nesse álbum de 2013 que ganha protagonismo outra ordem instrumental, abrindo o caminho a uma mais evidente manifestação de cores e linhas desenhadas com electrónicas, com ocasionais presenças de madeiras e sem esquecer a mais clássica presença de guitarras, pianos e percussões. As canções exploram agora novas potencialidades que um labor mais exigente na instrumentação pode levar à canção, juntando à (relativa) invulgaridade da voz aguda de Duncan Wallis uma paleta de tons e luzes que instalam no ouvinte uma perplexidade inicial que rapidamente cede lugar a um relacionamento de atenção para com o detalhe e progressivo entendimento com canções que, desafiantes num primeiro contacto, em pouco se transformam numa presença saborosa e familiar.
O gosto pelo talhar de formas menos imediatas mas em claro contexto pop – como em tempos escutámos também nuns Tears For Fears ou nos últimos álbuns de uns XTC – serve assim um álbum onde se expressam contos e cantos sobre cenas da vida aos vinte e poucos anos. Ou seja, transporta angústias, algumas delas comuns a quem ainda ali não chegou, mas expressa-as num ponto da situação no patamar dos 25 e arredores. Saúde, sexualidade, o relacionamento com os outros… E integra os textos num contexto cenicamente elaborado, onde por vezes talvez a orquestração roube atenções. Mas que, em conjunto, não só faz deste conjunto de canções o melhor disco dos Dutch Uncles até à data como assegura a 2015 um belo exemplo do que pode ser a pop quando não está com vontade de correr atrás dos sabores mais fáceis da multidão que domina o momento.
Este texto foi originalmente publicado na Máquina de Escrever