terça-feira, junho 17, 2014

Novas edições:
Lana del Rey, Ultraviolence

Lana del Rey
"Ultraviolence"
Interscope / Universal
3 / 5

Estávamos em inícios de 2012 quando a comunidade indie, da qual surgiu quem inicialmente aclamara a estreia de Lana del Rey (editando com esse nome, porque antes a cantora tinha já uma breve vida de insucesso musical), lhe começava a voltar as costas. Em 2011 o single que apresentara os temas Video Games e Blue Jeans, com uma carga Lynchiana sublinhada no primeiro teledisco que o acompanhara, cativara opiniões. O efeito passa-a-palavra alastrou e, à chegada de Born To Die, o seu álbum de estreia, Lana del Rey estava no limiar da sedução mainstream. O disco - uma sólida coleção de canções, que todavia não se fechava na melancolia bem cenografada dessas canções-paradigma - acabaria por vender sete milhões de unidades. E o concerto no SBSR confirmou, mesmo junto dos mais céticos, que ali havia qualquer coisa mesmo... Mas depois fez-se silêncio. E, num registo desencantado que lhe fomos conhecendo (e não sabemos se é de personalidade ou criação para a persona), chegou a dizer à Vogue que não gravaria um outro disco. Mas esta semana, e após uma série de singles-aperitivo (nem todos lá muito promissores) lançados na Internet, eis que surge Ultraviolence, novo álbum de inéditos que foca a sua orientação formal na linha das baladas sumptuosas e nas paisagens essencialmente melancólicas que caracterizavam parte do alinhamento do álbum de estreia. Entre os dois discos não esteve parada. E além da digressão gravou uma versão de Blue Velvet para uma marca de pronto-a-vestir e, mais recentemente, uma outra leitura nova para Once Upon a Dream, canção originalmente apresentada na Bela Adormecida que a Disney estreou em desenho animado em 1959 e que agora escutamos em Maléfica.
Talvez pelo facto de ter começado a carreira com outro nome, uma voz mais aguda e os cabelos loiros, ou por outras razões que quem as tem lá saberá, houve quem lhe começasse a chamar uma fraude. Se a "fraude" é pela mudança de nome, então David Bowie, Scott Walker ou Nick Rhodes estão tramados. Se é por ter mudado de cor de cabelo, então Madonna está também bem arranjada... E se o problema é mudar de voz, que dizer da vontade de procurar melhorar?... Ou fazer mal (ou menos bem) é fardo vitalício? É verdade que talvez ela não ajude. Sobretudo com entrevistas onde recorda episódios de juventude magoada, de azares e dor, que são tão cliché rock. Mas que podem ser verdade... Ou falamos novamente da persona?... Que fique claro: a construção de personagens faz parte da própria cultura pop. O que vale mesmo, no fim, são as canções (e já lá vamos).
Karma ou argumento, a verdade é o azar lhe bateu à porta quando, ao preparar este disco, se deslocou a Nova Iorque para tratar de um dueto com Lou Reed. Chega à cidade, aterra... E não é que ele morre nesse dia? Em Lana del Rey a ficção e a realidade são espaços que não sabemos onde guardam as respetivas fronteiras (não é a primeira a fazê-lo nem a melhor, sublinhemos). Fica, por isso, o mistério. Mas a verdade é que as canções sabem servir a voz (e a persona) que as interpreta. Neste novo disco, e ao lado de produtores como Dan Auerbach (dos Black Keys) ou Paul Epworth (que trabalhou já com Adele ou Florence and The Machine - e estes créditos não são lá muito entusiasmantes), Lana del Rey apresenta canções que seguem caminhos na verdade não muito distantes dos que fizeram o disco que em 2012 a revelou a meio mundo. Dois anos de vivências materializam-se agora num lote de 11 canções que pouco se afastam do modelo da balada sumptuosa, que a produção molda sem deixar nunca pregos de fora. Um presente melancólico serve-se com nostalgia de ecos da canção (e do cinema) dos anos 50 e 60. E a voz dá conta do recado. Mas tirando alguns raros momentos bem inspirados (como Brooklyn Baby), a escrita não repete o patamar de 2012 nem lhe acrescenta nada particularmente cativante. Há até uns solos de guitarra que podiam ter caído "na sala de montagem" e que só somam dispensáveis clichés às respetivas canções. Por outro lado, focando a escrita em pouco mais que um clima, ao fechar o espaço emocional a cantora encerra o álbum numa janela de vistas menos largas. E aí sim está o que correu menos bem a Lana del Rey. Afinal, foram as canções... Atenção que não são más. São até bem construídas e cuidadosamente interpretadas e produzidas. Mas, juntas, e sem o que vem de trás, não parecem ter muito mais para nos contar.