[cartaz alemão] |
As recentes notícias relacionadas com o encerramento dos escritórios da Columbia TriStar Warner suscitam algumas dúvidas e perplexidades sobre a evolução do mercado cinematográfico — este texto foi publicado no Diário de Notícias (17 Fevereiro), com o título 'Que filmes para o mercado?'.
Há uma semana, utilizei neste mesmo espaço o título 'Que mercado para os filmes?'. O pretexto era a notícia do encerramento da empresa Columbia TriStar Warner Filmes de Portugal, pondo fim a uma representação directa, de mais de quatro décadas, de alguns dos maiores estúdios de Hollywood (os respectivos títulos continuarão a surgir nas salas, através de outras vias de distribuição). Tratava-se de reflectir um pouco sobre a evolução contraditória de um mercado que, maioritariamente, por inércia ou apenas falta de reflexão, se acomodou às lógicas de difusão e promoção ligadas ao poderio económico e simbólico dos “blockbusters”, sistematicamente reforçado pela pobreza cinéfila do imaginário televisivo.
Vale a pena, por isso, evocar mais alguns dados, tanto mais interessantes quanto nos ajudam a compreender que o mercado cinematográfico não pode ser entendido a partir de uma oposição maniqueísta entre os filmes “rentáveis” e os que “não dão dinheiro”. Até porque, como sabem todos os agentes desse mesmo mercado (independentemente de o reconhecerem publicamente), a performance comercial de um “blockbuster” que faz, por exemplo, 100 ou 150 mil espectadores nas salas portuguesas, apesar de gerar inevitáveis manchetes triunfalistas, pode ser um amargo equívoco, tendo em conta os gastos promocionais que o seu lançamento envolveu.
Será preciso relembrar que não se trata de promover qualquer moralismo crítico, deduzindo “qualidades” da boa (ou má) performance seja de que filme for? O certo é que o mercado se faz também de eventos que não envolvem necessariamente as centenas de milhões de dólares que, para algum jornalismo, parecem esgotar todo o mapa internacional do cinema. Exemplo? Será interessante referir que, de acordo com os dados oficiais do mercado português, o filme mais rentável na última semana (6/12 Fev.), com cerca de 25 mil espectadores, não foi nenhum “blockbuster” nem sequer uma grande produção dominada por “efeitos especiais” — foi sim um muito clássico melodrama, Filomena, realizado por Stephen Frears e protagonizado por Judi Dench. Aliás, a par de Filomena, outros títulos com nomeações para os Oscars têm dominado as bilheteiras, sendo mesmo o top de 2014 liderado, para já, por O Lobo de Wall Street, de Martin Scorsese (com mais de 220 mil espectadores).
Há outra maneira de dizer isto: é preciso superar a noção simplista — e, em última instância, comercialmente inconsistente — de que só os títulos com “super-heróis”, ostentando as mais variadas proezas tecnológicas, são capazes de mobilizar espectadores. Resta saber se, em termos gerais, o mercado sabe (ou pode) reconverter as suas regras, não esquecendo que nem todos os filmes podem ser promovidos da mesma maneira. E que o público não se esgota nos adolescentes formados na cultura visual, muito pouco cinéfila, dos jogos de video.