quinta-feira, dezembro 26, 2013
Os melhores filmes de 2013 (N.G.)
Ver a guerra pelo ponto de vista de quem a perdeu. Não é um espaço comum, mas também não se trata de nada inédito. Afinal, e focando a II Guerra Mundial (que é do que falamos) já Rosselini o tinha mostrado em 1947 em Alemanha, Ano Zero e, mais recentemente, é do desmoronar de um poder que trata A Queda, de O. Hirschbiegel. Mas Cate Shortland sai de Berlim e entra na Alemanha profunda para, através de cinco irmãos (que supomos filhos de uma alta patente das SS com papel no Holocausto), que ficam sem casa, sem comida, sem conforto, sem poder, nos dar um retrato de um país derrotado. O filme não procura todavia uma parábola coletiva e foca (e desenvolve) as personagens, o processo de progressiva tomada de consciência da irmã mais velha (a Lore a que o título se refere) do que era afinal o pai, sendo um dos núcleos emotivos mais poderosos de um filme rodado no campo, fazendo da paisagem não um cenário, mas um ser adverso e desconfortável pelo qual os protagonistas não têm senão de continuar a caminhar. Foi um ano cinematográfico intenso, com o espaço da II Guerra novamente explorado (sob a perspetiva da noção de honra) em No Nevoeiro. Malick deu continuidade a uma linguagem apurada n’A Árvore da Vida num filme que, ao invés desse, trata antes da perda da fé. Dos dez títulos que abaixo se destaca vale a pena referir a presença de Soderbergh, num ano em que anunciou uma retirada de cena. Ou do brilhante Gravity, que mostra como a ficção científica pode ver a luz quando os efeitos especiais surgem para ajudar a contar uma história e não são, antes, o motivo para deles fazer brotar uma narrativa.
1. Lore, de Cate Shortland
2. A Essência do Amor, de Terrence Malick
3. Like Someone in Love, de Abbas Kiarostami
4. No Nevoeiro, de Sergei Loznitsa
5. A Vida de Adèle – Partes 1 e 2, de Abdellatif Kechiche
6. Por Detrás do Candelabro, de Steven Soderbergh
7. Spring Breakers, de Harmony Korine
8. Gravidade, de Alfonso Cuarón
9. China – Um Toque de Pecado, de Jia Zhang-ke
10. Lincoln, de Steven Spielberg
Vistos em festivais (documentários)
Foi premiado em Locarno. Depois teve estreia nacional no Queer Lisboa. E voltou a ser premiado no DocLisboa (e não só). Autobiografia de um ano na vida do realizador, E Agora? Lembra-me... voltou a trazer o cinema de Joaquim Pinto a um patamar de reconhecimento que lhe é devido. Resta agora que alguém reconheça a necessidade de estrear este filme em sala e, depois, devolver-nos a presença de títulos anteriores em suporte de DVD. Filme do ano para muitos espaços da crítica, The Act of Killing mostra como o cinema pode por vezes ir para lá das fronteiras do jornalismo para relatar uma história verídica. Já Weekend of a Champion, sobre um fim de semana de Jackie Stewart num GP Mónaco de outros tempos promove, sobretudo pela janela para o presente na sequência final rodada 40 anos depois, um espantoso olhar não apenas sobre a fórmula 1 mas sobre o tempo que passa.
1. E Agora? Lembra-me..., de Joaquim Pinto
2. The Act Of Killing, de Joshua Oppenheimer
3. Weekend of a Champion, de Roman Polanski
4. Leviathan, de Lucien Castaing-Taylor, Véréna Paravel
5. The Great North Korean Picture Show, de James Leong e Lynn Lee
6. Trains of Thoughts, de Timo Novotny
7. Sacro Gra, de Gianfranco Rossi
8. Tarr Bela, I Used To Be A Filmaker, de Jean-Marc Lamoure
9. Blood Brother, de Steve Hoover
10. She Said Boom, The Story of Fifth Column, de Kevin Hegge
Esta lista junta títulos exibidos (e vistos) no Queer Lisboa, IndieLisboa, Lisbon & Estoril Film Festival, DocLisboa e Sundance.
Vistos em festivais (ficção)
Alguma da melhor ficção exibida em festivais de cinema entre nós já chegou ao circuito de sala. Mas há títulos por estrear (e outros que, provavelmente, ficarão apenas no registo dos festivais que os apresentaram). Do que os festivais de 2013 nos mostraram vale a pena assinalar a abordagem de Jarmusch a uma história de vampiros que sabe fugir aos lugares comuns de um espaço que entretanto virou filão mainstream. Silent Youth apresenta uma espécie de abordagem gay ao modelo da trilogia de Linklater encetada com Antes do Amanhecer. Dois rapazes cruzam-se nas ruas de Berlim. E em dois dias descobrem o mundo um do outro. Mas ao contrário de Ethan e Julie, pouco falam. Afinal, há momentos em que os silêncios sabem dizer mais... E as palavras se medem antes de proferidas. Atenção ainda para Lacrau, uma expressão de uma forma de respirar a paisagem rural portuguesa que nos deu um dos mais belos e poéticos filmes de produção nacional apresentados este ano.
1. Only Lovers Left Alive, de Jim Jarmusch
2. Silent Youth, de Diemo Kemmesies
3. In The Name Of, de Małgośka Szumowska
4. La Piscina, de Carlos Machado Quintela
5. Out In The Dark, de Michael Mayer
6. Lacrau, de João Vladimiro
7. Die Andere Heimat, de Edgar Reitz
8. Harmony Lessons, de Emir Baigazin
9. Boy Eating The Bird’s Food, de Ektoras Lygizos
10. White Night, de LeeSong Hee-il
Esta lista junta títulos exibidos (e vistos) no Lisbon & Estoril Film Festival, Queer Lisboa, IndieLisboa e Berlinale.
Vistos em festivais (curtas)
Fui júri este ano em dois festivais de curtas metragens. O Timishort (em Timisoara, na Roménia) e o Córtex (em Sintra). Foi uma excelente oportunidade para ver novas propostas e, juntamente com o que vi no IndieLisboa, no Doc Lisboa, Vila do Conde e Queer Lisboa, alargaram horizontes sobre o que aconteceu este ano. O filme de Eduardo Williams que surge no topo da lista estaria numa tabela dos dez melhores filmes que vi este ano. É um exemplo do melhor cinema que se faz atualmente, assinado por um realizador argentino que passou pela escola Le Fesnoy (em França) e está a lançar bases para uma carreira que vale a pena seguir de perto. Versalhes assinalou o regresso de Carlos Conceição (que mais dia menos dia tem mesmo de dar o salto para as longas). E Fúria revelou o talento de um finalista da ESTC que dará certamente que falar... Muito do melhor cinema português
1. Pude Ver Un Puma, de Eduardo Williams
2. Versalhes, de Carlos Conceição
3. Fúria, de Diogo Baldaia
4. Mahjong, de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata
5. Má Raça, de André Santos e Marco Leão
6. Maillot de Bain, de Mathilde Bayle
7. O Rei Inútil, de Telmo Churro
8. Ce Que Mon Amour Doit Voir, de François Bonnenfant
9. Wonderland, de Peter Kerek
10. Cigano, de David Boneville
Esta lista junta títulos exibidos (e vistos) no Timishort, Vila do Conde, DocLisboa, IndieLisboa e Córtex.
Por razões éticas não tomei em conta para elaborar estas os filmes nos quais participei ativamente. Foram eles Plutão, de Jorge Jácome (onde trabalhei como ator), De Manhã e As Flores do Mal, de Flávio Gonçalves (que produzi) e Noite de Aniversário, também de Flávio Gonçalves (para o qual fui consultor musical).