domingo, dezembro 29, 2013

Os melhores discos de 2013 (J. L.)

ARCHY MARSHALL (nome artístico: King Krule)
* OS VELHOS. ... lembro-me quase sempre do mau humor de Jean-Paul Belmondo, em O Acossado (1959), de Jean-Luc Godard — numa cena de rua, quando uma jovem lhe tenta vender um exemplar dos Cahiers du Cinéma, sugerindo que, por certo, ele não tem nada contra a juventude, Belmondo responde: "Sim, gosto muito dos velhos".
Este ano, musicalmente, houve muitas e gratas razões para continuar a gostar dos velhos, a meu ver quase sempre mais genuínos e verdadeiros que muitas sofisticadas "imitações" pós-modernas, tão seriamente profissionais quanto emocionalmente inócuas. Lembro, por isso, as proezas de John Fogerty (Wrote a Song for Everyone), Paul McCartney (New) ou David Bowie (The Next Day); ou o monumento de relíquias esquecidas e recuperadas de Eric Clapton (Give Me Strength: The '74/'75 Recordings); ou ainda as novas aventuras de veteranos, embora de uma geração posterior, como The Flaming Lips (The Terror) e Nine Inch Nails (Hesitation Marks); além de que, last but not least, 2013 voltou a ter Beatles (On Air - Live at the BBC Vol. 2)!

* OS NOVOS. Dito isto, não posso deixar de reconhecer que a imagem corrente da juventude, combinando ridicularização mental e indiferença social (como é possível a MTV ter chegado tão baixo?...), foi sendo compensada e, sobretudo, corrigida pela simples e maravilhosa verdade do talento realmente jovem. É verdade: dos álbuns que fui escutando (e não tenho, nem de longe nem de perto, a pretensão de ter acedido a tudo, nem sequer a tudo o que, à partida, suscitava a minha curiosidade), muitos dos que me tocaram têm assinatura de gente muito nova, admiravelmente criativa.
Para mim, de facto, alguns dos grandes momentos musicais de 2013 foram de nomes estreantes. Daí a minha proposta, naturalmente instintiva e nada científica, de um top de primeiros álbuns — não sei se foram os "melhores", mas atrevo-me a pensar que a alegria de continuar a fazer música (velha, nova ou sem calendário) passa por aqui.

1 - 6 FEET BENEATH THE MOON, King Krule.


[Canção: EASY, EASY] Archy Marshall nasceu em Londres, usa o nome artístico King Krule e canta num registo de elaborado dramatismo que alguns incluem nos domínios da chamada neo-soul; o seu primeiro álbum foi editado a 24 de Agosto de 2013, dia do seu 19º aniversário.

2 - IF YOU WAIT, London Grammar.


[Canção: NIGHTCALL] Paisagens pop, horizontes electrónicos, alguma contaminação trip hop, dois rapazes (Dan Rothman, guitarra; Dot Major, piano, bateria e tudo o que for necessário) e uma rapariga (Hannah Reid, vocalista de serena teatralidade): são de Londres, of course.

3 - SAN FERMIN, San Fermin.


[Canção: DAEDALUS] San Fermin? O festival de Pamplona? O álbum tem um touro na capa, mas a banda é a cena de trabalho de um compositor de Brooklyn, Ellis Ludwig-Leone, ex-assistente de Nico Muhly: sofisticação pop reescrita, em apoteose, como monumento sinfónico.

4 - SILENCE YOURSELF, Savages.


[Canção: HUSBANDS] Londres, outra vez. É um quarteto feminino que abraçou as radiosas angústias do pós-punk e soa como se o mundo tivesse começado ali (ou acabado, tanto faz...). A vocalista, Jehnny Beth, é de facto francesa e chama-se Camille Berthomier. C'est la vie.

5 - PURE HEROINE, Lorde.


[Canção: TENNIS COURT] Ninguém escapou a Royals, o single que fez de Lorde uma espécie de Miley Cyrus em versão alien. É bastante melhor, digo eu. E não vem de Londres: nasceu na Nova Zelândia, tem 17 anos e no seu BI consta o nome Ella Maria Lani Yelich-O'Connor.

6 - AMOK, Atoms for Peace.


[Canção: DEFAULT] Aviso à navegação: é o joker desta selecção. Porque é um primeiríssimo álbum, mas de uma banda de experts reunidos por Thom Yorke, incluindo o produtor Nigel Godrich e Flea, dos Red Hot Chili Peppers. Mas não será que soa um pouco a Radiohead? Não um pouco... Muito!

7 - TORRES, Torres.


[Canção: HONEY] Será que podemos, ou devemos, falar de maturidade aos 22 anos? Torres chama-se, de facto, Mackenzie Scott e vem de Nashville. Em todo o caso, as suas raízes não estão exactamente no country, mas num rock primitivo, feminino, apaixonado e apaixonante.

8 - SING TO THE MOON, Laura Mvula.


[Canção: THAT'S ALRIGHT] Diz-se influenciada pelo som das Eternal. As profundezas da soul e as nuances do R&B ressurgem, cristalinas e sensuais, na voz desta intérprete inglesa, natural de Birmingham. Passou pelo coro de uma igreja, o que, bem entendido, só lhe fez bem.

9 - DAYS ARE GONE, Haim.


[Canção: FALLING] Beach Girls? As três irmãs Haim são da Califórnia (Los Angeles) e praticam uma pop tão visceral quanto versátil, a que tem sido reconhecida a influência dos Fleetwood Mac. Elas preferem evocar as Destiny's Child, o que talvez seja outra maneira de dizer o mesmo.

10 - 180, Palma Violets.


[Canção: LAST OF THE SUMMER WINE] Provavelmente, como num filme dentro de um filme, não saímos do mesmo sítio. Ou seja: ainda de Londres, aí estão os Palma Violets, senhores de um garage rock puro e duro, sem desculpas nem modernices — e quem vier atrás que feche a porta.