quinta-feira, dezembro 19, 2013

Em conversa: Adrian Utley

Esta é a entrevista com Adrian Utley (que é um dos elementos dos Portishead), que serviu de base ao artigo 'Uma multidão para abordar uma obra de Terry Riley' publicada na edição de 18 dwe dezembro do DN.

Adrian Utley
Já tinha o universo dos compositores minimalistas entre os que lhe interessavam antes desta abordagem a In C de Terry Riley? 
Fui apresentado a este compositor e a esta peça em específico. Mas já foi há algum tempo, até porque esta é uma obra a que se chega naturalmente quando se investiga sobre música. Conhecia também aquela sua outra obra mais caleidoscópica, o A Rainbow In Curved Air, pelos mesmos motivos. Toquei o In C com uns amigos... Gostei... E gostei mais a tocar e compreendi-a mais ao tocá-la que quando a ouvira antes. Tornou-se mais interessante, acho. Entendi então que o que não gostava na peça era a disparidade de instrumentos. Era uma peça escrita, mas preferia escutá-la com instrumentos semelhantes entre si e sem sobressaltos. Pensei que seria assim bom fazê-la com guitarras.  

Focando a sonoridade?
Sim, foi exatamente o que fizemos e já a tocámos assim várias vezes. Tenho andado um pouco por aí, em vários lugares, a apresentar esta peça, tocando-a com músicos convidados onde quer que vá. É interessante e muda sempre a cada vez que a tocamos.

Porque são pouco representadas as guitarras na música [erudita] contemporânea?
Não sei porque não se usam mais as guitarras.

Porque optou então por abordar In C com guitarras? 
Aqui foi pelo som e por características específicas da relação que os músicos têm com as guitarras quando tocam juntos. Que na verdade não é muito diferente da que têm outros instrumentistas quando tocam juntos. Gosto do som das guitarras juntas, de muitas guitarras juntas. Não há, na verdade, muita escrita para guitarras. E uma grande influência aqui será certamente o Glenn Branca. Trabalhei com ele uma vez e acho-o espantoso. Nos últimos tempos tenho tocado alguma da música coral de Arvo Pärt com guitarras... E funciona. Tocamos o Fratres, é belíssima. Na verdade precisam,os de umas 30 a 40 guitarras para que funcione. Mas fizemo-lo com um coro. Interessa-me a textura e as potencialidades das guitarras... Gosto do som de muitas guitarras juntas de um modo não agressivo. É interessante também a forma como interagimos, até porque estamos mais habituados a jamming que a tocar peças escritas numa partitura. Não quero generalizar mas é assim muitos de nós aprendemos a tocar guitarras: tocando juntos e tirando ideias uns dos outros. É bom ter a estrutura fixa de uma peça escrita, mas ao mesmo tempo a liberdade para ir em frente, para avançar.

A obra é escrita, de facto, mas com um certo grau de liberdade deixado a quem interpreta... 
Nas instruções de Terry Riley fica logo bem claro que podemos avançar na peça quando o entendermos. Não há um momento para entrar nem um ritmo. Pode ser acelerado ou mais lento. Pode haver acontecimentos polirrítmicos. Podemos mudar oitavas, velocidade... Podemos avançar quando quisermos. Podemos estar independentes dos outros ou estar com os outros... E não se pode controlar...

Os compositores minimalistas são para si uma influência? 
São influentes sim, e noto-o ainda mais hoje em dia. Tenho trabalhado com o Will Gregory, dos Goldfrapp há já uns 25 anos. Ele tem uma formação mais profunda que eu, mas discutimos sistemas musicais. E eles são muito influentes em mim. Fazem-se pensar como hoje penso. Hoje vejo o Music For 18 Musicians do Steve Reich como sendo uma obra fantástica, mas quando a ouvi pela primeira vez não aguentei mais de metade... Não aguentei a repetição, mas hoje vejo-a como sendo a sua obra-prima. Já toquei Electric Counterpoint com o Aphex Twin num festival com Steve Reich.

Conhecia a orquestra com quem tocou antes de chegar a Lisboa?
Não sei quem são, porque foram os promotores quem os reuniu. É assim que costumo fazer. Já o fizemos na Polónia, em Birmingham... Eles já receberam a música e já a conhecem. Hoje vamos ensaiar. Não aconteceu nunca eles não conseguirem fazê-lo. Temos um núcleo de músicos mais fixo, que só usamos quando tocamos em Inglaterra.