sábado, outubro 26, 2013

DocLisboa 2013: dia 3


La Monte Young, Terry Riley, Steve Reich e Philip Glass num mesmo documentário? Ainda por cima juntando Gavin Bryars, Meredith Monk e John Cage? Mais ainda: com Pauline Oliveros e Ritchie Hawtin?... Fosse um filme sobre gastronomia e seria a lista perfeita de ingredientes. Porém, e uma hora e meia depois, o soufflé não só acaba sem sabor como se desmorona e implode sobre si mesmo. Afinal nada ali aconteceu.

Passa hoje no DocLisboa o filme Les Couleurs du Prisme, La Mécanique du Temps (Culturgest 21.45, repete dia 31 às 16.15), que Jacqueline Caux apresenta como uma viagem muito pessoal através das vivências (e certamente dos gostos e referências) de Daniel Caux, desaparecido em 2008. Se o ponto de partida é uma homenagem, procurando reencontrar figuras e músicas que moldaram não só um gosto pessoal, mas toda uma forma de entender os caminhos que a música contemporânea tomou na segunda metade do século XX, afastando-se do serialismo e do que se chega aqui a falar como quase uma profecia do serialismo idealizado por Schoenberg, a verdade é que o filme desemboca numa experiência fragmentada, faltando-lhe o fio condutor que tudo pudesse unir e, afinal, fazer mais coesa experiência comum.

Voltamos à casa partida. Os ingredientes estão lá todos. A determinante visão de John Cage. A forma como a busca de uma nova forma de entender a música (com a repetição e a assimilação de ideias escutadas na tradição indiana) a definir os caminhos que conduziriam ao minimalismo com Young e Riley, mais tarde Reich e, alargando horizontes para lá do seu território de origem, Glass. Depois o modo como as mesmas experiências nos anos 60 conduziram ora a um trabalho de exploração vocal com Monk ora em confrontos com formas e heranças da tradição clássica europeia em Bryars (podia ter-se falado também de Pärt ou Nyman). E, no fim, a forma como, sobretudo Glass e Reich alimentaram as ideias que conduzem muitas expressões do techno do nosso tempo.

Há até momentos brilhantes, como aqueles em que La Monte Young canta, para demonstrar uma das suas ideias, Terry Riley toca ao piano ou Glass ensaia uma obra recente de música de câmara. Mas ao filme falta não só uma mais clara expressão da voz autoral que decide este percurso (que mesmo assim, convenhamos, está longe de ser original e só fica coisa clara ao ler o que a realizadora escreve no site) e confira ao todo um fio condutor que não seja apenas apreendido por quem já sabe da lição. Além disso, uma melhor direção de fotografia e, sobretudo, melhor captação de som, teriam ajudado. E muito. É pena.