Com Batalha do Pacífico/Pacific Rim, Guillermo del Toro aposta numa configuração aventurosa em que a dimensão humana tende a ser devorada pelo poder iconográfico dos robots... Para onde vai este cinema industrial? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Julho), com o título 'Nostalgia da lanterna mágica'.
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No genérico final de Batalha do Pacífico, Guillermo del Toro dedica o seu filme a Ray Harryhausen (1920-2013) e Ishiro Honda (1911-1993). O primeiro é o génio americano dos efeitos visuais que explorou a animação clássica de figurinhas filmadas imagem a imagem (“stop motion”), tendo o seu nome ligado a títulos lendários como O Monstro do Planeta Vénus (1957), Os Três Mundos de Gulliver (1960) ou Jason e os Argonautas (1963); o segundo é indissociável da mitologia de Godzilla no cinema japonês, tendo dirigido o primeiro dos respectivos filmes, em 1954.
Compreende-se a ambição de Guillermo del Toro [foto]. Para ele, o projecto de Batalha do Pacífico envolve a ilusão de poder recuperar um gosto primitivo de fábula e fantasia, de algum modo ligado ao encanto remoto da lanterna mágica. Os resultados evitam, pelo menos, aquilo que ele próprio já chamou o “cinismo” corrente dos super-heróis: estamos perante uma aventura de “aliens” e robots em que o essencial passa pela exuberância de um visual que quer integrar um pouco de tudo, desde a cidade negra e húmida de Blade Runner até ao delírio kitsch de Godzilla. Por vezes, a imponência cenográfica consegue mesmo gerar uma ambiência dramática pouco comum nos “blockbusters” de mera rotina.
Ainda assim, resta saber como sustentar as singularidades do espectáculo quando se depende de uma banal lógica de acumulação de efeitos especiais e, acima de tudo, se menosprezam os valores muito clássicos (e muito nobres) da arte de contar histórias. O argumento de Batalha do Pacífico resume-se a meia dúzia de palavras e, em boa verdade, está todo no trailer do filme. A única coisa que o trailer não diz é quem, entre robots e “aliens”, ganha o combate final... Mas aposto que o leitor já conseguiu adivinhar.