R.E.M.
“Green”
Rhino
4 / 5
Não é fácil ganhar dois desafios num mesmo dia. Os R.E.M. tentaram-no a 8 de novembro de 1988. Os cidadãos norte-americanos iam às urnas nesse dia para escolher o sucessor de Ronald Reagan na Casa Branca. As sondagens eram favoráveis ao candidato republicano George Bush (que havia sido o vice de Reagan), mas os quatro músicos, em particular o vocalista Michael Stipe, foram incansáveis no apelo ao voto no candidato democrata: Michael Dukakis. No mesmo dia Green chegava às lojas de discos nos EUA (no resto do mundo o lançamento tinha ocorrido na véspera). Era o seu sexto álbum de originais, um disco menos irado que o anterior Document (de 1986), mas igualmente político. Bush venceria a eleição com 53,4% dos votos e 426 (contra apenas 111) grandes eleitores no colégio eleitoral. Melhor sorte teve contudo o álbum. Não só foi a sua primeira múltipla-platina como, e sem que o grupo perdesse o respeito da crítica e a sua base de fãs primordial, abriu o caminho para que, entre os sucessores Out Of Time (1991) e Automatic For The People (1993), atingissem aquele raro patamar apenas habitado por bandas como sucesso maior à escala global.
Aos oito anos de vida (e cinco passados sobre o lançamento do mítico álbum Murmur que os colocou no mapa), os R.E.M. davam com Green um primeiro passo numa nova etapa. Depois do disco de 1986 e das antologias Dead Letter Office (1987) e Eponymous (1988), o grupo (que gravara para a independente I.R.S. desde os primeiros tempos) sentira a necessidade de procurar outra editora que lhes permitisse ir mais longe. Acertadas as condições com a Warner, partiram rumo à composição das novas canções com essa agenda de preocupações já arrumada. O próprio Stipe chegou mesmo a descrever este “salto” como “enorme, mesmo colossal” para os R.E.M. “como uma banda e como trabalho” e também como tudo o que eram “como amigos” (conforme o recorda From Chronic Town To Monster de D. Bowler e B. Dray).
Começaram por marcar 11 semanas de estúdio, um período que refletia já o investimento que a nova editora parecia disposta a fazer no disco (e na banda). Entre os ensaios e as sessões de gravação sentiram-se como quem começa algo de novo, daí as frequentes comparações que depois surgiriam entre Green e Murmur. Ao mesmo tempo procuravam reagir contra a memória do mais recente Document, tentando, em ano de eleições, fazer um disco igualmente político, mas menos agreste.
Se a agenda política era a que os mesmos quatro homens já defendiam (Stand, um dos singles, revelar-se ia um hino “verde” no sentido ecologista do termo), musicalmente o álbum revelava sinais evidentes de uma banda em tempo de mudança. Decidiram ensaiar a presença mais clara de instrumentação acústica (que aprofundariam pouco depois), aceitaram flirts com espaços mais próximos da folk. Mas tudo isto sem o acarretar de quaisquer indícios de perda de identidade.
Os velhos fãs gostaram. E novos públicos entraram em cena através da presença na rádio dos quatro singles extraídos do alinhamento e pelo sucesso da digressão que se seguiu, abrindo caminho a uma carreira de um álbum que globalmente atingira vendas na ordem dos quatro milhões. Três anos depois Out Of Time chegaria aos 18 milhões. Mas essa é outra história.
PS. Este texto foi originalmente publicado no DN