quarta-feira, maio 29, 2013

Novas edições:
Visage, Hearts and Knives

Visage
“Hearts and Knives”
Blitz Club
2 / 5

Ai os regressos, os regressos... Na verdade a ideia de um eventual regresso dos Visage é menos surpreendente que o que parece, apesar de não terem corrido da melhor forma as tentativas de criação de uma nova banda que Steve Strange protagonizou nos últimos anos (os Visage Mark II de há dez anos eram mesmo candidatos a uma das piores “ressurreições” da história)... Convém antes fazer um flashback... Criados em finais dos anos 70, em volta de um núcleo definido por Steve Strange e Rusty Egan (respetivamente o porteiro e o DJ das noites mais ‘in’ do momento no Blitz londrino, o “berço” da cultura new romantic), os Visage cedo se afirmaram como paradigma de uma nova ideia de celebrar a cultura pop através de uma redescoberta do sentido de apelo visual do glam rock e cruzando musicalmente ecos da etapa berlinense de Bowie com a emergente geração de ideias em volta das novas electrónicas e da sua expressão na pista de dança. Com elementos dos Ultravox e Magazine a completar o alinhamento de uma banda que na verdade tinha como rosto a figura de Steve Strange (apesar de serem determinantes na sua obra as contribuições de Midge Ure, Billy Currie e Rusty Egan), definiram com Fade To Grey o hino maior do movimento e editaram entre 1980 e 82 os álbuns Visage e The Anvil, que mostraram que havia ali mais que uma mera expressão de hedonismo para noites dançantes, revelando os respetivos alinhamentos belas canções pop e até espaço para alguma experimentação de ideias, nomeadamente na definição de texturas ambientais com electrónicas e no ensaios sobre percussão (mais evidentes no disco de 82)... A saída de Mide Ure após The Anvil fez-se sentir bem evidente no inconsequente Beat Boy (1984), o grupo anunciando um ponto final pouco depois. Steve Strange formou então os Strange Cruise, com os quais gravou um ainda mais desinteressante álbum temperado a mau rock’n’roll em 1986, seguindo-se uma travessia de longa etapa difícil, com pontuais (mas raros) episódios musicais, da qual só emergiria depois da viragem do milénio (muito graças ao refocar de interesses na memória dos seus primeiros discos, provavelmente via impacte do fenómeno electroclash e dos Fisherspooner, de longe os mais claros herdeiros dos Visage). Anunciada há alguns meses, a nova formação dos Visage junta a Steve Strange um outro antigo elemento do grupo (Steve Barnacle), um antigo colaborador dos Ultravox e Magazine (Simon Robin) e a cantora Lauren Duvall. Hearts and Knives, que assim surge como o quarto álbum de originais, 29 anos depois de Beat Boy, chama ainda colaborações de velhos parceiros de trabalho como Dave Formula, Midge Ure e Rusty Egan, sendo que é deste conjunto de nomes que surge o maior dos feitos do disco: a recuperação (fiel) da sonoridade “clássica” que definira os dois primeiros álbuns dos Visage (de resto é fácil ouvir os novos temas e identificar com que faixas da sua obra se relacionam diretamente). Mas depois eram precisas novas canções. Mas apesar do esforço relativamente bem sucedido de construção de um single de travo clássico que se materializa em Shameless Fashion (com pura genética Visage vintage), de uma curiosa aliança entre marcas primordiais (leia-se Kraftwerk e disco sound) em Dreamer I Know e de um ensaio de novas ideias que se tenta em On We Go, o álbum mais vezes parece procurar canções que se ajustem à sonoridade e não o oposto, a escrita acabando assim subjugada a uma mais evidente presença dos ingredientes... Aconteceu o mesmo na recente reunião dos Ultravox que, tal como este disco dos Visage, parece procurar a ilusão de uma viagem no tempo três décadas depois... Ou seja, o contrário do que encontramos em All You Need Is Now, dos Duran Duran, onde se recuperavam marcas da sonoridade do histórico Rio (de 1982) para fazer um disco claramente consciente do presente em que vivia e do tempo que havia passado. Hearts and Knives é assim um disco que tenta ser hoje o que em tempos foi. Traduz com solidez instrumental uma noção de identidade. Mas faltam-lhe as canções. E basta reencontrar os dois primeiros álbuns do grupo para compreender do que aqui se fala.