quinta-feira, abril 18, 2013

Entre memórias e lojas de discos
com Tiago Pereira

Iniciámos este mês no Sound + Vision a publicação de uma série de memórias pessoais sobre os espaços das lojas de discos. Hoje passam por aqui as palavras do Tiago Pereira, do jornal 'i', com quem trabalhei alguns anos no DN. Ao Tiago um muito obrigado pela colaboração.

In The Aeroplane Over The Sea, dos Neutral Milk Hotel, Live at the Fillmore East, pelos Allman Brothers (em vinil), ou os primeiros álbuns dos Galaxie 500. Tudo a preço de saldo, que é como quem diz 5 dólares o mais caro, coisa boa, coisa de aproveitar. Nada de Jimi Hendrix, grunge nem vê-lo. Os lugares comuns eram-no noutra terra qualquer, não ali. Tudo indie, tudo com prefixo "alt", para termos a certeza que nada de previsível iria acontecer. Ou isso ou os clássicos, com a Motown a gritar de todos os cantos da loja, mais a América tradicional, sulista e com tempero de churrasco logo atrás. The Wall of Sound - o nome ficava-lhe bem.

Seattle está recheada de lojas de discos e tem em quase todos os guias a Holy Cow Records como chão sagrado a pisar pelos peregrinos em visita. Passámos por lá, "então como vai", paragem obrigatória, claro que sim. Mas nada como deixar o óbvio e dar uma de nativo. Assim sendo, melhor subir, com Capitol Hill no horizonte. Sobre o centro da cidade, o bairro faz-se na colina sobre os arranha-céus de gente financeira, com cafés, livrarias, bicicletas, lojas de tatuagens e menus vegetarianos por toda a parte. No meio de tudo isto, é difícil não dar com a Wall of Sound: cartazes dos Black Mountain, LCD Soundsystem e Arcade Fire (ainda lá estava o poster de "Funeral", dois anos depois!), neons que gritam rock-jazz-funk-soul-metal e clientes com orgulho nas compras, a deixar a loja com os discos na mão, "ponham os olhos nisto, aprendam alguma coisa".

E nós a entrar sem piscar os olhos, a revirar prateleiras, a contar o tempo para o rendez-vous, que a viagem não se fazia em modo solitário, com horas marcadas para entrevistas e etc. Já tenho; mas que preço é este?; e vão cinco; isto cabe na mala?; não fazia ideia que isto estava editado em CD; o que é isto que está a tocar?. Felicidade às rodelas, de sobra. Tivemos que voltar, só podia. Éramos mais na segunda visita, haveríamos de repetir a viagem num regresso à cidade, anos mais tarde, já com Kendrick Lamar e Ty Segall como estrelas maiores na parede. A Wall of Sound é uma sala de estar, tem café à mão, cadeiras sofás e candeeiros onde importa. Estava prestes a mudar, com latas de tinta e materiais afins, prontos para surpreender. Se esta não é uma boa razão para voltar, há sempre os discos. Combinado.