sexta-feira, dezembro 21, 2012

Os melhores filmes de 2012 (N.G.)

Continuando a fazer o balanço de 2012 (e num blogue que gosta de listas), hoje visitamos o espaço do cinema.

Para arrumar ideias, resolvi separar este ano os filmes que vi em sala (ou seja, que tiveram estreia comercial entre nós) dos muitos outros que vi em festivais (cá e lá fora). Como novidade junto ainda uma tabela de bandas sonoras, representando todas elas casos com lançamento em disco (o que deixa de fora as belíssimas contribuições de Mihaly Vig em O Cavalo de Turim e Kylie Minogue e Neil Hannon em Holy Motors).


Estreados em sala

É linda a vida, comenta a personagem que Emmanuelle Riva numa cena de Amor, de Michael Haneke, na qual folheia um velho álbum de fotografias onde o presente confronta o passado perante um futuro que a assombra. É apenas um dos muitos instantes profundamente humanos de um filme onde o pouco faz muitos, o simples explora o complexo e o olhar depurado à essência mostra tudo e que, tendo dado ao realizador a sua segunda Palma de Ouro em Cannes, chegou às nossas salas já nas últimas semanas do ano. Fecha assim um ano onde devemos destacar num mesmo plano dos acontecimentos maiores uma outra visão do fim, meticulosamente coreografada e magnificamente fotografada (e uma vez mais contando com a preciosa contribuição da música de Mihaly Vig) naquele que deverá ter sido o derradeiro filme de Béla Tarr e ainda um olhar desencantado do panorama do ensino, do papel do professor e da escola, em O Substituto, que brilha pela realização de Tony Kaye e a interpretação de um soberbo Adrien Brody. O ano trouxe-nos ainda um ponto de vista diferente (o dos criados) sobre a revolução francesa por Benoît Jacquot, a confirmação da relação ímpar entre Jeff Nichols e Michael Shanon (com importante contribuição de Jessica Chastain) em Procurem Abrigo e novo exemplo de um saber na exploração das relações familiares por Hirokazu Koreeda. O lugar e o tempo, como moldura para uma história na Anatólia pelo olhar de Ceylan, a desafiante composição de jogos de máscaras (e cinefilia) de Léos Carax em Holy Motors, o incompreendido e tão injustamente sovado olhar coletivo (centrado numa vivência pessoal) do 11 de setembro segundo Daldry e a Rússia do nosso tempo em mais um espantoso filme de Zvyaginstsev completam um quadro de dez escolhas que, fosse alargado (mas um top 10 é um top 10) poderia abarcar filmes como Deste Lado da Ressurreição de Joaquim Sapinho e o mais belo filme de Oliveira nos últimos anos (O Gebo e a Sombra) e o internacionalmente muito elogiado Tabu de Miguel Gomes, assim como experiências recentes de Steven Soderbergh, Steve McQueen, Steven Chobovsky (e é raro um escritor tratar tão bem do seu próprio livro como vimos em As Vantagens de Ser Invisível, o filme mais ignorado este ano pela imprensa portuguesa), o regresso de Tim Burton ao seu melhor (em Frankenweenie) ou o documentário sobre o último concerto dos LCD Soundsytem. Note-se ainda que, com Sam Mendes, 007 teve em Skyfall um dos seus melhores filmes de sempre. Já em O Hobbit, Peter Jackson tropeçou como nenhum momento da trilogia O Senhor dos Anéis poderia ter imaginado...

PS. O filme É Na Terra Não É Na Lua, de Gonçalo Tocha, integrou a minha lista de 2011, pelo que não se repete nesta, apesar de ter sido uma das melhores estreias do ano.

1. Amor, de Michael Haneke
2. O Cavalo de Turim, de Béla Tarr
3. O Substituto, de Tony Kaye
4. Adeus, Minha Rainha, de Benoît Jacquot
5. Procurem Abrigo, de Jeff Nichols
6. O Meu Maior Desejo, de Hirokazu Koreeda
7. Era Uma Vez Na Anatólia, de Nuri Bilge Ceylan
8. Holy Motors, de Léos Carax
9. Extremamente Alto e Incrivelmente Perto, de Stephen Daldry
10. Elena, de Andrei Zvyaginstsev



Estreados entre festivais


Vale-nos a cada vez mais bem recheada oferta de festivais para ver o que não chega às salas em sessões comerciais. O melhor que o ano nos deu nesse departamento chegou na noite de abertura do DocLisboa e, como outros títulos deste lista (mas poucos...), chegará a salas em 2013. Trata-se de A Última Vez Que Vi Macau, filme co-assinado por João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata, uma das duplas mais ativas do ano (o primeiro tendo ainda estreado as curtas Manhã de Santo António e O Corpo de Afonso, o segundo O Que Arde Cura, filme sobre o qual, por nele ter colaborado, naturalmente me abstenho de me pronunciar em público). Partindo de um projeto de documentário, A Última Vez Que Vi Macau mostra-nos como são ténues as fronteiras que o podem separar da ficção, bastando que o olhar nos conduza e, nele, faça nascer uma narrativa. Uma experiência única e arrebatadora, terá estreia nacional (e noutros mercados) em inícios do novo ano. Da colheita festivaleira destaco ainda o épico pop de Xavier Dolan em Lawrence Anyways, um dos mais interessantes olhares que o cinema alguma vez deu a uma personagem transgénero, magnificamente interpretada por Melvil Poupaud. A estes títulos somam-se experiências inesquecíveis como Keep The Lights On de Ira Sachs, vencedor do Queer Lisboa 16 e parte do top 10 do ano nos Cahiers du Cinema, o filme de Mathew Akers sobre a exposição de Marina Abramovic no MoMA, um olhar sobre a morte a história de um condenado, visto por Herzog ou uma visão (partilhada inclusivamente pela participação de um dos realizadores) de uma escola de dança na Índia. E juntem-se quatro ficções que não caberiam nada mal num programa de estreias, do retrato da culpa no confronto entre as aparências e vida sexual paralela de um sul africano em Beauty, uma história sobre os efeitos do bullying em Despues de Lucia, um espantoso jogo narrativo construído em torno da escrita em Dans La Maison ou a história de um homem que, quase de três décadas depois, não se libertou da vivência hedonista dos seus anos 80, em Avalon (sim, o título da canção dos Roxy Music).

1. A Última Vez Que Vi Macau, de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata
2. Lawrence Anyways, de Xavier Dolan
3. Keep The Lights On, de Ira Sachs
4. Marina Abramovic - The Artist is Present, de Mathew Akers
5. Into The Abyss, de Werner Herzog
6. La table Aux Chiens, de Cédric Martinelli e Julien Touati
7. Despues de Lucia, de Michel Franco
8. Beauty, de Oliver Hermanus
9. Dans La Maison, de François Ozon
10. Avalon, de Axek Pétersen


Bandas sonoras


Ao ser convidado a assinar, mensalmente, um espaço sobre bandas sonoras na revista Metropolis, estive mais atento que em muitos anos a este importante espaço discográfico profundamente ligado ao cinema. A lista que apresento é um top 10 dos melhores discos com música para cinema, não uma tabela da melhor música que o cinema viveu em 2012 (que nem todas as bandas sonoras foram editadas). A mais interessante das bandas sonoras do ano serviu em pleno as imagens e as personagens de Vergonha, de Steve McQueen, com particular brilho não apenas nas composições originais de Harry Escort, mas nos complementos escolhidos entre gravações de John Coltrane, Glenn Golud, Chic, Blondie ou Tom Tom Club. Igualmente soberba é a coleção de canções de Arthur Russell com que Ira Sachs valoriza os espaços de Keep The Lights On (sublinhando a identidade nova iorquina das vivências que retrata). E merece ainda nota maior a colaboração entre Howard Shore e os Metric na composição da música para o mais recente filme de David Cronenberg. Composições de Michael Brook, Alexandre Desplat, Nick Urata, Danny Elfman e David Wingo e uma invulgar colaboração entre um pianista e um cineasta, como vemos em Amor, de Haneke, que conta com uma contribuição de Alexadre Tharaud que não se limita ao plano do áudio completam uma lista de dez momentos que, depois de vistos no ecrã, podemos continuar a ouvir.

1. Shame, de Hary Escott + outros (Sony)
2. Keep The Lights On, de Arthur Russell (Audika Records)
3. Cosmopolis, de Howard Shore + Metric (Howe Records)
4. The Perks Of Being a Wallflower, de Michael Brook (Lions Gate Records)
5. Amour, de Alexandre Tharaud (EMI)
6. Moonrise Kingdom, de Alexandre Desplat + outros (Commercial Marketing)
7. Ruby Sparks, de Nick Urata (Milan)
8. Frankenweenie, de Danny Elfman (EMI Catalogue)
9. Extremly Loud And Incredibly Close, de Alexandre Desplat (Water Tower Music)
10. Take Shelter, de David Wingo (Grove Hill)