sexta-feira, agosto 24, 2012

A guerra, segundo Terrence Malick


A edição em Blu Ray de A Barreira Invisível junta a uma magnífica transcrição do filme de Terrence Malick uma série de extras que conduzem alguns olhares interessantes sobre a criação deste filme e as memórias factuais que o contexto evoca.

A guerra como os filmes de guerra a não mostram. Podíamos reduzir numa frase (que é naturalmente redutora) a essência de A Barreira Invisível, o notável filme de 1998 no qual Terrence Malick parte do romance homónimo de James Jones e do contexto factual da batalha de Guadalcanal (episódio fundamental da guerra no pacífico). Através de uma série de personagens, cada qual com a sua perspetiva, medos, anseios, sonhos, compõe um ser coletivo que não esgota na tensão dos combates, no receio de uma morte iminente ou na consciência da impossibilidade de controlar o mundo à sua volta. Há no filme um curioso confronto entre o horror da morte e da batalha e a placidez de uma paisagem idílica. Entre ação e contemplação. Assim como é entre jogos de opostos que vive o espaço de relacionamento entre soldados e os “outros”, seja os japoneses com quem lutam (ao mesmo tempo sendo evidente que sentem o mesmo, da mesma forma) ou as populações locais com que se vão cruzando, eventualmente dialogando, mas que não deixam de sentir receio destes forasteiros de farda.

Com várias sequências que prenunciam uma linguagem poética que Malick aprofundaria em O Novo Mundo e, mais ainda, na sua obra-prima que é A Árvore da Vida, A Barreira Invisível explora, além da narrativa (bem evidente, de resto) e dos espaços e personagens, o seu mundo interior. E é desse saber na gestão entre o que vive, vê e faz e o que se pensa que se compõe uma obra absolutamente assombrosa, que muito deve, além da visão do realizador (e de uma belíssima direção de atores), a uma sublime direção fotografia, um trabalho notável na montagem e uma atenção maior para com a música. É por isso que são verdadeiramente esclarecedores e úteis os extras que encontramos na edição em Blu-Ray do filme. A transcrição para HD é notável, assim como o som é digno de elogios. Dos extras vale a pena destacar uma série de entrevistas cruzadas com alguns atores (onde explicam sobretudo o trabalho de preparação que os fez passar por uma verdadeira agenda de treino militar e a dureza das condições de rodagem na Austrália), montadores (que não escondem a dimensão hercúlea do seu trabalho e de como foram abdicando de planos de diálogos para promover espaços de respiração que acabariam por definir os caminhos da alma do filme) ou o compositor Hanz Zimmer (que aqui tem o seu melhor trabalho de sempre, explicando ainda como acabaram integradas na banda sonora as peças de Arvo Pärt, Charles Ives ou Gabriel Fauré que Malick optou por usar em algumas sequências).

Outro dos extras desta edição é uma coleção de reportagens / noticiários da época – as newsreels – sobre a batalha de Guadalcanal. Produções sob o título United News, mostram imagens reais dos combates, de grupos de soldados, navios, as ilhas... Com natural linguagem de propaganda (afinal não era só para dar notícias que estas imagens serviam).