Spiritualized
“Sweet Heart Sweet Light” Double Six Records
4 / 5
4 / 5
A chegada de cada novo disco de Jason Pierce promete ser sempre um acontecimento. Quer nos Spacemen 3, onde em tempos militou, quer via Spiritualizded, onde encontrou o principal veículo para a sua voz criativa desde 1990, tem construído uma obra que definiu uma personalidade muito particular assente sobre fundações primordiais da cultura popular. Do gospel e de um gosto sinfonista nos arranjos a uma visão do rock que tem nos Velvet Undreground um ponto de partida e na noção de forma menos rígida do psicadelismo – que abordou todavia mais profundamente nos oitentas – um sentido plástico, Jason Pierce convoca elementos através dos quais compõe canções que são como grandes telas onde uma multidão de acontecimentos se juntam para uma visão que não teme ser coisa de grandes dimensões. Ao trabalho formal (onde por vezes, como se escuta em I Am What I Am lida com elementos nas fronteiras de um aparente caos, todavia arrumado com cuidado maior) junta depois as marcas pessoais de uma alma magoada e de um corpo por várias vezes já levado aos limites da sobrevivência. De resto, e tal como o anterior (e magnífico) Songs From A & E (de 2008) conhecera gestação atormentada por uma longa hospitalização, também o novo Sweet Heart Sweet Light conheceu na sua história momentos difíceis, uma nova etapa de internamento seguindo-se à conclusão da escrita das canções, adiando por mais alguns meses a sua gravação e arte final. Porém, ao passo que Songs From A & E era um canto assombrado pela experiência próxima com a morte que então viveu, o novo álbum traduz um reencontro com outra luminosidade e esperança, mesmo que o desencanto e frustração habitem o tutano de algumas das canções. Apesar de alguns instantes feitos de formas menos angulosas e polidas, algumas das canções são exemplos de uma escrita mais precisa e robusta, por elas passando ainda ecos de um fulgor certamente reencontrado por uma digressão que deu nova vida em palco ao absolutamente fulcral Ladies and Gentlemen We Are Floating In Space, de 1997 (muitas vezes apontdo como a “obra-prima” da discografia de Jason Pierce). Entre vitalidade rock’n’roll de um Hey Jane, as preces que lança em Life Is A Problem e o momento de inspiração maior que nos mostra, no final do alinhamento, em So Long You Pretty Thing, Sweet Heart Sweet Light confirma, sem surpresas, que em Jason Pierce continuamos a ter uma das raras forças realmente marcantes e com consequência continuada da música dos últimos 20 anos.