Andrea Booher/ FEMA News Photo |
Perspectivas sobre um dia que ninguém esqueceu para ler ao longo deste dia 11 de Setembro de 2011 no Sound + Vision. Dez anos depois recordamos, a várias vozes, memórias contadas na primeira pessoa... Aqui ficam mais três olhares, assinados por João Moço, Tiago Pereira e Mónica Jardim.
João Moço
(jornalista do DN)
Por alguma razão que a memória tratou de apagar, nessa terça-feira de manhã não estava na escola. Provavelmente as aulas ainda não tinham começado, mas é difícil de recordar com exactidão o porquê de estar àquela hora em casa, quando isso era raro noutros dias. Na sala a minha mãe passava a roupa a ferro à frente da televisão e eu acabava de sair da cama quando de repente o primeiro avião embate numa das Torres Gémeas. Era ainda demasiado miúdo para absorver o que se estava a passar, mas fiquei perplexo quando um novo avião embate na segunda torre e em segundos as duas desaparecem. Provavelmente não percebi rigorosamente nada das implicações sociais que aquele ataque teria, mas lembro-me na perfeição da revolta que senti, de pensar que nenhuma daquelas pessoas tinha feito algo nas suas vidas para merecerem um fim tão aterrador. Mandei sms a uma amiga, barafustando de raiva. Pouco depois passou, porque independentemente da nossa vontade, tudo muda.
Tiago Pereira
(jornalista do i e autor do blogue Independanças)
Em 2001 já não havia segredos na relação entre a realidade televisiva e a ficção mediatizada. A 12 de Setembro do mesmo ano, tínhamos a certeza de que nunca seríamos confundidos, nunca iríamos dizer “isto parece” quando algo, de facto, era. Até que o noticiário da hora de almoço – acontecimento quase todo noticioso, dada a fraca exigência dos anunciantes – mostrava o símbolo pop de Nova Iorque transformado no ícone da transformação que o novo século preparava. Estava mesmo a acontecer. Não estava nada. “Está mesmo”, ouvia-se do lado de lá do sofá, rabo chegado à frente, antebraços nos joelhos, queixo semi-caído. José Rodrigues dos Santos – ou isto já é a memória a ceder ao facilitismo do jornalismo entre armas, explosões e seus derivados – sem saber o que dizer. E do lado de cá, apesar de todas as evidências, um vasculhar intenso de capítulos cinematográficos armazenados algures. Nada, nenhuma cena batia certo. Era tudo uma grande novidade, a dobrar, quando no outro monte de aço se fazia lume do bravo. E já está, é o que é, não há volta a dar, e ainda cai, e as vítimas, e os bombeiros, e os comentários, e o presidente, e os presidentes. A esta altura já é noite mas ninguém deu por nada. A boa vida que o quotidiano sem horários oferece – pensávamos nós, na altura, que estudos e afins são coisas duras, sacrifício, coitados de nós, os pequenos – permitiu estar em toda a parte. Longe o tanas, estivemos lá todos, a sério, estivemos, só pode. Dez anos depois, é um domingo, o feriado virou pop negro, tão inevitável como dispensável. E promete repetir-se o cerimonial. Antebraços nos joelhos, queixo semi-caído. Isto aconteceu mesmo.
Mónica Jardim
(promotora discográfica)
A primeira vez que fui a NY foi em Setembro de 2000. Pode uma cidade ter um lado mecânico, funcional e humano ao mesmo tempo? A cidade que nunca dorme, onde as estrelas não se vêem no céu mas nas ruas e os sonhos por todo o lado. Tudo é ampliado, magnificado, vivido ou apenas sentado ao lado. Aqui e agora. "Gosto do teu casaco", "E eu do teu lenço", "de onde és?", "e tu?". Um ano depois, são duas da tarde. Estou a sair dum curso liga-me a minha melhor amiga. super aflita "Não imaginas. Um avião foi contra uma das torres gémeas.... acidente, erro de aviação, aconteceu alguma coisa com o piloto? .. diz-me que nem deu bem tempo para digerir, outro avião na segunda torre. Ao longo desta conversa estava já dentro do autocarro no Rossio... eu na baixa da minha cidade. A Sara não faz piadas de mau gosto. Já no escritório, planta-mo-nos à frente de Televisão. Não tenho memória das várias coisas que me passaram pela cabeça.acho que deve ter sido do choque, choque puro. Tudo foi um momento de embate. Quando se dá a queda da primeira torre, escorreram-me as lagrimas. Do que é que estamos a falar? De onde é que isto veio? Verdade seja dita, é cruelmente bem planeado. Os maiores simbolos da cidade, que quase encontram no céu, suas altezas ao chão. As pessoas, o fumo, há pessoas que estão a saltar (!). E isto alguém consegue acompanhar? Tudo Isto a passar pelos nossos olhos na tv . E sem TV quantas vezes já terá acontecido?