domingo, abril 10, 2011

Monte Hellman: independente, ma non troppo


Monte Hellman (nascido em Nova Iorque, em 1932), autor do clássico Two-Lane Blacktop (1971), está de volta com o belíssimo Sem Destino/Road to Nowhere — esta entrevista (via e-mail) foi publicada no Diário de Notícias (8 de Abril), com o título 'Este é o meu primeiro filme realmente independente'.

Como define Sem Destino? É um retrato realista da rodagem de um filme? Ou talvez uma nova espécie de “road movie”?
Duas vezes sim. É também a história de uma relação e ainda um sonho que podemos experimentar quando, segundo os outros, estamos acordados.

Será também sobre o cinema em geral? Ou será mais sobre o cinema “made in USA”?
De novo, duas vezes sim. Alguém disse, concisamente, que é tanto sobre fazer filmes como sobre o acto de os ver.

Porque escolheu as câmaras digitais? Será que constituem mesmo uma nova maneira de fazer um filme, tanto quanto de o pensar?
Em fotografia, já tinha adoptado as câmaras digitais por sentir que me dão um maior controlo. Sinto o mesmo em relação ao cinema, mas não creio que seja uma nova maneira de fazer ou pensar um filme. Coloca novos desafios à equipa de imagem, mas de facto, para mim ou para os actores, não muda a maneira de trabalhar. Com uma excepção: a câmara que usámos, em particular, é tão pequena que permite colocarmo-nos em lugares onde só poderíamos filmar se deitássemos abaixo uma parede.

Há quem considere que há uma ligação de Sem Destino com o Blow-up, de Antonioni? Pensou nisso? Ou não passa de uma coincidência?
Durante a rodagem, não pensei em nenhuma ligação com outros filmes. Quando acabei, de facto reconheci uma ligação com Blow-up... e com mais 99 filmes.

Faz sentido defini-lo como um “cineasta independente”? É uma expressão que tem o mesmo significado que tinha, por exemplo, há 40 anos, quando rodou Two-Lane Blacktop?
Originalmente, independente queria dizer “fora dos sete grandes estúdios”. Two-Lane Blacktop não era um filme independente, já que foi feito para a Universal Studios, uma das majors. Hoje em dia, a palavra quase deixou de ter significado, uma vez que a maioria dos chamados independentes pertence às majors. Também fiz filmes financiados por vias alternativas, esperando ter verdadeira independência: senti-me muitas vezes desiludido, acabando por ter muito menos liberdade do que trabalhando para um estúdio. Sem Destino é o meu primeiro filme realmente independente, já que a produção foi assumida pela minha filha Melissa, o meu argumentista Steve Gaydos e eu próprio.

Sente a falta dos anos 60, do tempo em que filmou Ride in the Whirlwind ou The Shooting? Sente a falta dos westerns?
Foi muito bom fazer esses westerns. E continuo a gostar de westerns. Mas não gosto dos westerns de agora, e não me parece que seja possível voltar a fazer um verdadeiro western. Na década de 1930, os cineastas estavam apenas a uma distância de 30 ou 40 anos da época que estavam a retratar, tal como hoje quando fazemos um filme sobre os anos 70 ou 80. Quando fiz os meus primeiros westerns, ainda havia pessoas vivas capazes de se recordar daqueles tempos; agora, estamos a uma distância de mais de um século desse período.

Qual é a sua relação com os filmes do presente? Pode referir-nos um ou dois filmes que, no último ano, o tenham realmente impressionado?
A minha relação com os filmes do presente é, normalmente, como jurado num festival de cinema. Dois filmes que me impressionaram no último ano foram Putty Hill, de Matt Porterfield, e The Raider, de Benjamin Heisenberg. E também Vais Conhecer o Homem dos Teus Sonhos, de Woody Allen.