quinta-feira, março 24, 2011

"Camino": o corpo, a fé, a alma


Que pena vivermos um tempo de tantas indiferenças...
Indiferença comercial, antes do mais: Camino, consagrado nos Goya (seis prémios, incluindo melhor filme espanhol de 2008), chega-nos de maneira ultra-discreta, sem 10 por cento da promoção que continua a ser dada a produtos da mais banal mediocridade.
E também indiferença de pensamento: contando a história (inspirada em factos verídicos) de uma menina vitimada pelo cancro, num processo de agonia cruzado com a mais veemente fé católica, Camino é um daqueles objectos eminentemente sociais, quer dizer, capazes de tocar todo e qualquer cidadão que viva numa sociedade de raízes católicas (para mais, problematizando implicitamente o papel da Opus Dei em Espanha).
Mas nada se fez, nada se fará para criar quaisquer condições de reflexão em torno de uma obra que, decididamente, tem menos valor mediático que as eleições para um qualquer clube de futebol. Javier Fesser, argumentista e realizador de Camino, consegue essa proeza invulgar de filmar a fé por dentro, expondo o intrincado e intrigante labirinto do corpo e da alma — em última instância, o objecto do seu filme é o conhecimento como aventura indissociável do prazer. Em resumo: um filme perturbante e inteligente, dois valores mal tolerados pela "ideologia-de-telejornal" em que vivemos.

>>> Site oficial de Camino.
>>> Camino: dossier no El Pais.