

Setenta anos depois, esta é, de facto, uma edição que nos ajuda a perceber um pouco como mudaram os modos de percepção do cinema e, mais especificamente, o seu imaginário comercial e artístico. Hoje em dia, há trailers de filmes que, literalmente, expõem momentos que, em princípio, deveriam funcionar como revelações (veja-se o caso do recente Lua Nova, da saga Twilight, e o modo como nele são dadas a ver muitas peripécias que cortam eventuais efeitos de surpresa). E Tudo o Vento Levou provém de um contexto em que o cinema era, de facto, o núcleo do espectáculo popular. Mais do que isso: ir ao cinema era uma prática colectiva de descoberta, não a “confirmação” de informações mil vezes repetidas por campanhas estereotipadas ou pelos videos virais da Internet (será preciso recordar que, em 1939, não existia Internet?).
O valor essencial da edição é... o próprio filme. A reconversão digital para Blu-ray está feita com verdadeiro espírito de cinemateca e consegue preservar as maravilhas do Technicolor original, postas em causa em 1967 através de um relançamento em cópias de 70 mm que, além do mais, apresentavam uma proporção de fotograma que não podia deixar de amputar o “quadrado” do original. Ironicamente, só com as primeiras edições em cassetes VHS e, mais tarde, em DVD, E Tudo o Vento Levou voltou a ser mostrado nas correctas proporções de imagem.

Por um lado, será inevitável experimentar um sentimento de nostalgia perante os sinais exuberantes daquela que foi, de facto, a idade de ouro de Hollywood (a edição inclui mesmo uma preciosa reprodução do programa original, distribuído nas salas). Por outro lado, este enquadramento histórico e a excelência do Blu-ray transformam E Tudo o Vento Levou num renovado objecto de sedução e fascínio.