terça-feira, dezembro 15, 2009

Bach por Corboz (1/2)

J.L.: Foi com natural calor e simpatia que o público do Grande Auditório, na Fundação Gulbenkian, recebeu o maestro Michel Corboz — ele é, afinal, um símbolo maior da política musical da casa, assumindo as funções de Maestro Titular do Coro Gulbenkian desde 1969. Desta vez, Corboz dirigia o Coro e Orquestra para interpretar Weihnachtsoratorium («Oratória de Natal»), BWV 248, de Johann Sebastian Bach, com as Cantatas I, II e III nos concertos de ontem e hoje (e as restantes três em mais dois concertos, dias 18 e 19). Com alguma improvável nostalgia, torna-se forçoso reconhecer que não é possível repetir as condições de escuta do original, nem de contexto, nem de pose, repartido por seis dias ao longo da quadra natalícia e de Ano Novo. Sobra (o que não é pouco...) a excelência de uma música cuja religiosidade intrínseca coexiste com a precisão de um austero racionalismo — nesse difícil balanço, uma vez mais, Corboz soube expor a notável qualidade do Coro Gulbenkian. Pormenor cénico a sublinhar, saudavelmente estranho aos mais arreigados academismos: retomando a opção do concerto de Gustavo Dudamel, o palco voltou a mostrar a janela gigante para o jardim, fazendo coexistir a música com o pressentimento da natureza e da cidade, lá fora.

N.G.: Neste 2009 Michel Corboz assinala os 4o anos de ligação ao Coro Gulbenkian, de que é maestro titular desde 1969. E o que ficou mais nítido ao fim da primeira de uma série de quatro noites dedicadas a um reencontro com a Oratória de Natal de Johann Sebastian Bach foi mesmo essa clara e profunda ligação, o trabalho continuado resultando num corpo coeso que foi peça basilar num palco onde as vozes solistas não brilharam todas da mesma forma. Corboz estava, em todos os sentidos, "em casa". Não apenas pela história de quatro décadas frente ao coro, mas pela também antiga relação que mantém com a música coral religiosa, a que dedicou já parte significativa de uma vasta discografia. Discreto na direcção, Corboz soube conduzir orquestra, instrumentistas nos respectivos segmentos como solistas e quatro cantores (entre os quais se destacou claramente o tenor Christophe Einhorn), a música fluindo com espantosa e tranquila naturalidade. No formato dois mais dois, as cantatas I, II e III foram interpretadas ontem e hoje, as IV, V e VI agendadas já para sexta e sábado. 275 anos depois da sua primeira apresentação, este conjunto de seis cantatas (originalmente apresentadas entre o dia 25 de Dezembro e o feriado da Epifania, celebrado 12 dias depois) concentra em época próxima do contexto que viu nascer esta música uma rara ocasião para ouvir, na íntegra, ao vivo, uma das mais emblemáticas obras alguma vez compostas para a quadra do Natal.