
Por uma vez, o cinema tentou lidar com o universo de Francis Bacon num registo mais ou menos biográfico. Aconteceu em 1998, no filme inglês Love Is the Devil, dirigido por John Maybury, com Derek Jacobi numa espantosa composição de Bacon, acentuando a sua convulsiva solidão. Infelizmente, nem mesmo o facto de a personagem de George Dyer ser interpretada por Daniel Craig (o actual James Bond) deu ao filme maior visibilidade, permanecendo como um título mais ou menos esquecido nos circuitos de DVD (entre nós, foi exibido na Semana dos Realizadores da edição de 1999 do Fantasporto).
Love Is the Devil filma a relação Bacon/Dyer como uma verdadeira máquina de produzir ilusões e fantasmas. Afinal de contas, a sua aproximação começa na proposta amorosa de Bacon, quando surpreende Dyer a assaltar a sua casa. Maybury encena a coexistência dos dois homens como uma tragédia suspensa que, por assim dizer, os quadros de Bacon vão superando, mais do que ilustrando.

Num caso como noutro, o cinema arrisca aproximar-se dessa fronteira figurativa que Bacon insistemente calcorreou: aí, onde o humano se contempla e, de algum modo, se prolonga na sua própria deformação — valendo a pena lembrar que na palavra deformação está contida a noção de forma.