quarta-feira, junho 04, 2008

Em conversa: Vampire Weekend (1/3)

Iniciamos hoje a publicação de uma entrevista com Ezra Koenig, dos Vampire Weekend, que serviu de base a um artigo publicado a 29 de Maio no DN.

Juntaram-se como banda na universidade. Que relação tinham com a música antes de se aventurarem em conjunto?
Eu sempre tive em bandas. Dava concertos... E não fui o único.

Mantiveram uma vida de estudantes depois de formar a banda?
Começámos a dar os primeiros concertos precisamente na universidade. Tocávamos sobretudo em festas... E nessa altura nem sequer pensávamos em fazer digressões ou algo mais... Ou seja, mantivemos intacta a nossa vida enquanto estudantes.

E como juntaram as referências que hoje fazem a vossa música. Já gostavam de música africana antes de a trazer para os Vampire Weekend?
Gostamos de muita música. E sobretudo reparámos que gostávamos de música à qual mais ninguém dava atenção. Ao começarmos a trabalhar juntos não demos por nós em busca de uma ideia na qual ninguém antes tivesse pensado. Mas, antes, a juntar, entre aquilo de que gostávamos, o que mais poderia fazer sentido naquela altura. Já ouvíamos música africana há algum tempo. Era, claramente, um dos nossos maiores interesses.

Há um rótulo que vos tem sido aplicado: “upper west side soweto”. Quem o “inventou”?
Fui eu!...

E não é perigoso inventar rótulos que depois se tornam difíceis de apagar?...
É bem verdade! Mas havia uma razão para a criação dessa forma de descrever o que somos. O lado upper west side reflectia sobretudo uma relação com a música clássica. O seja, o todo da expressão traduzia a presença de referências clássicas e desse outro gosto pela música africana. E há um contraste curioso entre ambas as referências do qual nasce o que somos. Houve, contudo quem, ao ver essa definição, a tomasse antes pela afirmação de classe de uns miúdos ricos do upper west side. Em primeiro lugar deixem-me dizer que quem assim pensa não nos conhece mesmo. No meu caso, o upper west side é um local que associo à minha vivência. É, sobretudo, uma zona associada a uma noção de atitude liberal. E na raiz do conceito daquele rótulo havia também essa vontade de cruzar a memória desse bastião liberal na América de 80 com o Soweto... Ou seja, não se tratava exclusivamente de um conceito musical mas também social. Até porque a nossa música fala muito da noção de classes. Ou seja, há mais ideias por trás daquela expressão que o que muitos a ela têm ligado...

Fala-se muito hoje na divisão da América entre democratas e republicanos. Entre religiões... A noção de classe também divide a América?
Sem dúvida. A religião divide as pessoas. Veja-se a maneira como as pessoas reagem à questão do aborto... Há, também, uma evidente divisão de atitudes entre conservadores e liberais. Mas o conceito de classe e o que representa é o que mais divide as pessoas. Há uma ideia errada de que a América é uma sociedade equitativa, mas as diferenças são enormes entre os muito ricos e os incrivelmente pobres. As questões que a divisão de classes levanta são bem evidentes no nosso dia a dia. Eu identifico-me como um liberal de esquerda. Mas não me identifico com aquelas ideias de revolução social, da morte aos ricos e por aí adiante... A razão não mora nos extremismos, mas em quem está no meio.

Acha que vos tomaram como meninos ricos?
As pessoas fazem assunções sobre o que não conhecem... E há quem o faça para ganhar a vida. As pessoas fazem esses juízos apenas porque estudámos na Columbia University... E é perigoso pensar-se que se é rico porque se vai estudar para uma certa universidade. É como aquela ideia da banda intelectual, que também se colou a nós de certa maneira. Essas confusões sobre classe, sobre educação até chegam a perturbar-me. A dada altura até parecer que ter uma educação numa universidade como aquela onde andei é mau!... Há muitas assunções erradas sobre o que somos e de onde vimos. Estão escritas. E parece que são verdade por serem publicadas...
(continua amanhã)