sexta-feira, abril 25, 2008

A Nova Cultura Mediática

Há qualquer coisa de inevitavelmente incómodo e perturbante no discurso que o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, hoje leu na cerimónia da Assembleia da República comemo-rativa do 34º aniversário do 25 de Abril. Basta reparar nas respectivas palavras de abertura:
> Celebramos hoje, uma vez mais, o aniver-sário da revolução de 25 de Abril de 1974. Não vou repetir o que aqui afirmei o ano passado. Apenas direi que me impressiona que muitos jovens não saibam sequer o que foi o 25 de Abril, nem o que significou para Portugal. Os mais novos, sobretudo, quando interrogados sobre o que sucedeu em 25 de Abril de 1974 produzem afirmações que surpreendem pela ignorância de quem foram os principais protagonistas, pelo total alheamento relativamente ao que era viver num regime autoritário.
Não havia maneira mais directa (e, por isso mesmo, mais salutar) de identificar o problema — aliás, o discurso do Presidente tem a apoiá-lo um estudo da Universidade Católica, por ele próprio encomendado, que reflecte as relações fracas, ou mesmo vazias, que passaram a existir entre "Os Jovens e a Política".
Fica, de qualquer modo, um factor de profundo desencanto. De facto, todos sabemos — porque todos vemos no quotidiano — que muitos dos vectores essenciais dessa decomposição política dos jovens passam pelo triunfo daquilo que poderemos chamar, com inteira justificação, a Nova Cultura Mediática. Concretizando: desde a abertura do espaço televisivo (consumada no período em que Cavaco Silva foi primeiro-ministro de Portugal), todos os valores sociais — incluindo o enquadramento simbólico da juventude — foram objecto de muitas e dramáticas transformações, favorecendo o triunfo de conceitos puerilmente "hedonistas" que tendem a desresponsabilizar e despolitizar o cidadão comum, incluindo os jovens.
Raras vezes tem sido possível discutir estas questões em Portugal, já que o seu simples enunciado suscita automáticas cortinas de fumo. Daí que seja sempre necessário esclarecer duas ou três coisas muito básicas. Primeiro: que a abertura da televisão à iniciativa privada não é, em si mesmo, um mal e deve continuar a ser firmemente defendida. Segundo: que o reconhecimento da degradação da televisão contemporânea (portuguesa ou não) não implica a exaltação de regimes (como o Estado Novo) de partido único e televisão única. Terceiro: nenhuma crítica aos índices de responsabilização dos políticos implica qualquer forma de menosprezo pelas potencialidades da democracia, como regime político e tecido social.
Sou dos que consideram o alarme lançado pelo Presidente da República como inevitavelmente tardio. Em todo o caso, isso não lhe retira um duplo valor: o de defender um pensamento político activo, resistente aos lugares-comuns do dia a dia, e o de sublinhar a importância (também política) dos espaços específicos da juventude. Resta saber se a classe política, tantas vezes tão acomodada no próprio sistema mediático e no seu populismo informativo, tem respostas para dar.