quarta-feira, outubro 31, 2007

Filme dos Sigur Rós hoje na Fnac Chiado

Heima, o filme dos Sigur Rós que brevemente terá edição em DVD vai ser apresentado hoje, quinta-feira, dia 1, ao fim da tarde, no auditório da Fnac Chiado. Sessão pelas 19.30 como passagem integral do filme. Antes, uma introdução por Nuno Galopim.

A vida não é um filme... ou é?

Em repeat, por aqui, escuta-se The Stage Names, o magnífico novo álbum dos norte-americanos Okkervil River. E como aperitivo, servimos o teledisco de Our Life Is Not A Movie Or Maybe.

Gorillaz em 'Bananaz'...

Um olhar pelos bastidores do projecto Gorillaz vai poder ver-se em Bananaz, documentário em produção sobre o desactivado projecto de Damon Albarn. O filme será assinado por Ceri Levy, que em 1994 produziu Starshaped, sobre os Blur.

Fantasmas de Nova Iorque

O mais recente volume publicado entre nós da série O Escritor e a Cidade é dedicado a Nova Iorque. E junta aos anteriores uma novidade: a ficção. Ficção que, naturalmente, toma a cidade como mais que mero cenário, na verdade a sua história, lugares e gentes sendo, todos eles, os seus protagonistas.
Assinado por Patrick McGrath (autor de Spider, romance que David Cronenberg levou ao cinema), Nova Iorque, Cidade Fantasma divide, um pouco como os Dias Exemplares de Michel Cunningham, a nossa atenção por três curtas novelas com acção em épocas distintas que, em conjunto transcendem as suas figuras particulares para, no fim nos darem do espaço essa mesma ideia de protagonismo. No livro de Cunningham uma presença transversal de referências a Walt Whitman e uma coexistência de lugares ligava as histórias. McGrath liberta as suas histórias na cidade, em comum todas elas partilhando a presença de fantasmas. Não daqueles com lençol e correntes. Mas demónios interiores, assombramentos de culpa, de medo, de ressentimento, que em cada um dos três relatos se mostram implacáveis naqueles sobre quem se abatem. Todas as histórias acontecem em Manhattan. A primeira, em tempos de sublevação contra o poder inglês, em vésperas da independência na década de 70 do século XVIII, explora o sentido de culpa de um homem que, cinquenta anos depois, recorda como a mãe foi condenada por traição aos ingleses. A segunda narrativa leva-nos para a casa de um homem de sucesso na cidade em meados do século XIX e para a tragédia que se abate sobre o filho mais novo a quem o amor é negado, marcas de xenofobia contra a emigração irlandesa e o fantasma da perda a desencadear um processo que acaba por levar o jovem à loucura. Mais recente, a terceira história coloca-nos dias depois do 11 de Setembro, num debate entre um psiquiatra e o seu paciente, que revelará mais danos no primeiro que os que imaginaria... Como nos recentes filmes de Christophe Honoré, onde a cidade de Paris nos é mostrada porque nela a acção acontece, Nova Iorque vive e vibra entre estas palavras. À sua maneira, um livro que viaja pela cidade. E que dá vontade, em viagem futura, de conhecer os locais onde estas acções de ficção tiveram palco.

Alternativo, sem dúvida!...

Arcadid Fire? Fred Ferdinand? Nick Wave?... Lê-se num flyer de um bar lisboeta, em pleno Bairro Alto. Tocarão Devid Bóie?

terça-feira, outubro 30, 2007

Abuso de poder (televisivo)

O mundo mediático está a ser agitado pela promoção que a CBS tem estado a fazer de uma edição do programa 60 minutes (emitida no passado domingo): nele se vê Nicolas Sarkozy, Presidente da França, a abandonar uma entrevista, recusando responder a uma pergunta sobre a sua mulher Cécilia (a gravação foi feita cerca de duas semanas antes do anúncio oficial do divórcio do casal). A promoção é gratuitamente manipuladora, uma vez que suprime a própria pergunta. Fica a resposta de Sarkozy: "Se eu tivesse alguma coisa a dizer sobre Cécilia, certamente não o faria aqui."
Honra ao Presidente francês. Não será preciso discutirmos as suas políticas ou os seus modos de se expor publicamente — podemos discordar das primeiras e não gostar dos segundos. O que está em causa é de outra ordem: tem a ver com esse contínuo abuso de poder (quase sempre disfarçado de frivolidade) com que as televisões se assumem como tribunais das relações privadas e, em particular, do espaço conjugal. De facto, quem está a ser entrevistado — para mais tendo como pano de fundo as relações entre dois países tão poderosos e tão importantes na vida democrática do planeta como são a França e os EUA — tem o direito, básico e inalienável, de recusar ser um peão desse voyeurismo "institucional" das televisões. Recusar não falar em televisão pode ser tão importante como aceitar falar no interior do seus dispositivos. Foi assim (incluindo a pergunta):

Inquérito: Discos de Outubro

Mais um mês em balanço, desta vez em dose dupla. Ou seja, à votação para o melhor álbum internacional juntamos uma outra, para o melhor disco português editado em Outubro de 2007. A base da selecção, como sempre, assenta essencialmente sobre os títulos referenciados nos posts Discos da Semana, com pontuais excepções. A votação, como sempre, está disponível na barra lateral à direita do blogue, antes da zona dedicada à agenda. Aqui ficam, antes de mais, os títulos a votar:

Internacional:
Beirut “The Flying Club Cup”
Bruce Springsteen “Magic”
Efterklang “Parades”
Jens Lekman “Night Falls Over Kortelada”
Joni Mitchell “Shine”
John Vanderslice “Emmerald City”
Murcof “Cosmos”
Radiohead “In Rainbows”
Rosin Murphy “Overpowered”
Soulwax “Most Of The Remixes”

Nacional:
Clã “Cintura”
Cooltrain Crew “Southeast D’N’B Flavas”
David Fonseca “Dreams In Colour”
Rodrigo Leão “Portugal, Um Retrato Social”
Vários “Adriano – Aqui e Agora”

O regresso a casa

No novo álbum de Edwyn Collins, Home Again, mora uma canção que tem tudo para se transformar num dos maiores clássicos da sua obra. Junta a sua sensibilidade pop a uma evidente admiração pela memória do melodismo clássico das escolas r&b de 60. Aqui fica o teledisco de You'll Never Know (My Love). Simples e directo.

Reedições históricas a caminho

A Valentim de Carvalho vai encetar, a 19 de Novembro, uma série de reedições de álbuns históricos do seu catálogo, a maioria dos quais nunca antes editado em CD. Entre os primeiros títulos a surgir nesta primeira campanha destaca-se Independança (de 1982), álbum de estreia dos GNR, que surgirá com sete temas extra que correspondem às faixas dos singles de 1981 Portugal na CEE, Sê um GNR e do máxi-single Twistarte (1983). Com Independança saem, também com extras, os álbuns Álibi de Manuela Moura Guedes (1981), Qualquer Coisa Pá Música de Jorge Palma (1979), Mistérios e Maravilhas dos Tantra (1977) e uma antologia com a integral da obra dos Sheiks entre 1965 e 67.

segunda-feira, outubro 29, 2007

Discos da semana, 29 de Outubro

Mais um evidente herdeiro da “escola” Neutral Milk Hotel, o norte-americano John Vanderslice tem vindo a construir uma carreira a solo que, como poucas, sabe juntar a arte da escrita de canções a uma demanda pelas formas finais com que estas se podem apresentar. Alguns talvez se recordem da polémica em tempos gerada pelo seu Bill Gates Must Die (logo na estreia a solo, em 2000)... Muitos conhecem-no mais como o proprietário de um estúdio adoptado por nomes como os Death Cab For Cutie, Okkervil River ou Spoon e até mesmo pelo trabalho de produção que assinou em Gimmie Fiction, destes últimos. Mas, na verdade, a sua obra autoral merece mais destaque que estas afinidades profissionais. Depois de um conjunto de cinco álbuns nos quais explorou, sem evitar nunca a canção de autor, as potencialidades das cenografia lo-fi (electrónicas incluídas), mostra-se, ao sexto disco, inesperadamente despojado. O foco das atenções recai assim sobre um conjunto de canções que, em apenas 38 minutos (o tempo ideal para um álbum), nos confirmam em Vanderslice um magnífico contador de histórias. O seu álbum anterior, Pixel Revolt, era espaço de reflexão concreta das feridas deixadas pelo 11 de Setembro e pelas consequências que os factos desse dia tiveram na vida da América desde então. Sem evitar pontuais incursões pela mesma memória traumática, Emmerald City é, contudo, um disco mais pessoal e, na verdade, quase autobiográfico (as canções compostas durante um processo, frustrado, e ainda não resolvido, de luta pela obtenção de um visto de residência para a sua namorada, uma francesa). A arte de Vanderslice, além do evidente domínio de heranças musicais (que, além dos Neutral Milk Hotel, revelam a presença dos Beatles, Dylan e mesmo Bowie), reside numa rara capacidade em sugerir as histórias, lançar as ideias, e sair delas antes de as tornar óbvias. Um grande disco e a absoluta confirmação de um nome que merece maior visibilidade.
John Vanderslice
“Emmerald City”
Barsuk Records
5/5
Para ouvir: MySpace


Há estatutos que a eficácia do trabalho apresentado justifica. E se há exemplo no actual panorama da música de dança, encontramo-lo na dupla de irmãos belgas David e Stephen Deweale. Ou seja, 2Many DJs em dia de rodar discos ou Soulwax quando sobem, como banda, a um palco. Cedo compreenderam como associar o sentido de novidade e também o valor acrescentado das linguagens rítmicas da música de dança ao tronco histórico do rock’n’roll, à sua energia, às suas canções. Como banda, os Soulwax são o perfeito híbrido destas realidades amalgamadas numa só. Como produtores a quem outros entregam canções para remisturar, aplicam exactamente os mesmos princípios, das suas intervenções sobre terceiros brotando formas finais que, mais que meras intervenções directas sobre elementos escondidos, electrónicas adicionadas ou discursos rítmicos adaptados, são verdadeiros exemplos da mesma atitude híbrida que é a essência da sua personalidade. Ao adicionar fragmentos de música dos Daft Punk a Daft Punk Is Playing In My House, ao conferir verdadeira identidade rave ao Gravity’s Rainbow dos Klaxons, entre muitos outros exemplos, mostram sinais de inteligência e conhecimento ao interferir, ao mudar, ao criar, mais que remisturas, verdadeiras reconstruções. Este álbum, com um título de 101 palavras, mas que para efeitos práticos acabou conhecido como Most Of The Remixes, é disso exemplo. E junta, depois de um primeiro CD de remisturas, a interferência, dos 2Many DJs, num set que junta ao alinhamento momentos de Ladytron, Hot Chip ou Tiga. Soberbo!
Soulwax
“Most Of The Remixes...”
Parlophone / EMI Music Portugal
4/5
Para ouvir: MySpace


Este não é um disco fácil de enfrentar. Não pela música, já que na verdade representa uma espécie de esforço de síntese dos caminhos e referências percorridos por Edwyn Collins, inclusivamente com alusão aos dias dos Orange Juice. Mas porque representa um final feliz para um episódio sombrio. Há dois anos, estava o álbum praticamente gravado, faltando apenas a inevitável etapa de mistura, quando Edwyn Collins deu entrada súbita num hospital londrino na sequência de duas hemorragias cerebrais. O cantor sobreviveu ao acidente e, apesar de não estar ainda fisicamente recuperado em pleno, conseguiu finalmente este ano concluir o disco que deixara à beira do fim. O título, que pode parecer uma alusão ao regresso a casa depois do sucedido, na verdade é antes uma referência ao reencontro com as diversas etapas do seu passado musical que as canções traduzem. Estão aqui as marcas do jovem cantor que, nos Orange Juice, mostrava como um sentido de rejubilante alegria podia morar entre as sombras de um movimento pós-punk essencialmente dado à exploração da condição urbana da vida em finais de 70. Estão aqui as heranças da canção de autor, as memórias de um antigo gosto pelo rhythm’n’blues. E, ao fim de escutado o alinhamento, o ecletismo que afinal sempre habitou a música de Collins. Há canções que parecem ainda rascunhos, que felizmente assim ficaram registadas. E, entre muitos motivos para reencontrar o cantor, em Home Again mora um potencial clássico de rádio: You’ll Never Know (My Love), uma das melhores canções pop, de travo clássico, que o ano nos deu.
Edwyn Collins
“Home Again”

Heavenly / EMI Music Portugal
3/5
Para ouvir: MySpace


Em tempo de pousio depois de editado o álbum Fundamental e concluída a digressão que o levou a palcos de todo o mundo (e lá ficámos de fora, para variar), os Pet Shop Boys dão continuidade à série Disco, através da qual, desde finais de 80, têm registado algumas experiências mais próximas da música de dança. Há uma diferença essencial entre este quarto volume e os três anteriores e que se manifesta ao ler o alinhamento, antes mesmo de escutar. Desta vez, mais que juntar remisturas ou novas versões de temas seus, os Pet Shop Boys apostam desta vez na exposição de trabalhos de intervenção, seus, sobre obras de terceiros. Aqui juntam a muito eficaz remistura de Sorry, de Madonna, a igualmente cativante leitura para Read My Mind dos The Killers e a espantosa colaboração com Bowie em Hallo Spaceboy, assim com as menos vitaminadas aventuras de colaboração com Yoko Ono ou os Rammstein. De absolutamente seu serve-se, apenas a fechar o alinhamento, uma versão máxi do single I’m With Stupid, o primeiro extraído de Fundamental, assim como uma recente nova reestruturação de Integral. Cumpre. Documenta... E venha o próximo...
Pet Shop Boys
“Disco 4”
Parlophone / EMI Music Portugal
3/5
Para saber mais: site oficial
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A solicitação de António Barreto a Rodrigo Leão para que Rodrigo Leão compusesse música original para a série documental Portugal, Um Retrato Social, constituiu por si só um passo diferente do habitual num país onde o cinema e a televisão recorrem mais vezes a música pré-gravada que à composição de originais na hora de pensar nas suas bandas sonoras. A sua edição, agora, em disco, permite a esta música uma segunda vida que, mesmo livre das imagens, não esquecerá a sua memória (porque delas nasceu, delas fala, delas traz experiências). Há muito que tardava o reencontro de Rodrigo Leão com as imagens. Depois de uma experiência, em Um Passo, Outro Passo, e Depois..., de Manuel Mozos (1989), a sua música conheceu outros destinos, sobretudo entre os discos e os palcos. A edição, em 2004, de um álbum com o título Cinema, não escondia desejos e intenções. Que entretanto se concretizaram, este disco representando a primeira materialização dessa vontade finalmente compensada. Musicalmente, a banda sonora de Portugal, Um Retrato Social não representa uma aventura fora de portas na obra de Rodrigo Leão. Sem a carga dramática de grande densidade das composições de Theatrum, sem as vozes que o têm acompanhado nos tempos mais recentes, encontra aqui terreno para dar corpo a ideias que nos últimos discos experimentou em interlúdios instrumentais. No fundo, este é um retrato, não só das imagens da série, mas também da actual personalidade instrumental de Rodrigo Leão. Podia ter-se desafiado um pouco mais. Mas cumpre o pedido.
Rodrigo Leão
"Portugal, Um Retrato Social"

Sony BMG
3/5
Para saber mais: site oficial


Também esta semana:
Ray Davies, Youssou N’Dour, Sex Pistols (vinil) , Mazgani, Libertines (best of)

Brevemente:
5 de Novembro: Sigur Rós (CD + DVD), Boy Kill Boy, Nick Cave (banda sonora), David Byrne, Ladytron (repackage)
12 de Novembro: Susumu Yokota, Rolling Stones (compilação), LCD Soundystem, Raveonettes, Killers, Led Zeppelin (best of)
19 de Novembro: Duran Duran, Daft Punk (live), GNR (reedição), Jorge Palma (reedição), Tantra (reedição), Manuela Moura Guedes (reedição), Sheiks (antologia), Gorillaz (compilação), Live Earth

Novembro: Sex Pistols (singles), Scissor Sisters (DVD), Muse (live), U2 (reedição), Jean Michel Jarre (reedição)
Dezembro: Rufus Wainwright (CD+ DVD ao vivo), Johnny Greenwood

PS. A crítica ao disco de Rodrigo Leão é um excerto de um texto já publicado na revista NS

Agora em alta definição

Quando pintou A Última Ceia, em que estava a pensar Leonardo Da Vinci (1452-1519)? Na inspiração divina? Na solidão de Jesus? Por certo nos desejos de Ludovico Sforza, seu patrono e responsável pela encomenda da pintura... Dificilmente lhe viria a ideia louca de poder ver a sua pintura na tela imaterial da Net, numa imagem de mais de 16 mil milhões de pixels — mas essa imagem existe: a partir de hoje, A Última Ceia está disponível em alta definição. Não é apenas o triunfo de um modo de representação "maior que a vida" (e a arte...); é também uma apoteose da Idade Virtual. Como dizia o outro, o futuro é já hoje.

Um café em Lisboa

Esta imagem de Patti Smith tem mais de vinte (ou trinta) anos. Em todo o caso, a sua intensidade e verdade talvez possam ajudar a sugerir o que foi o seu concerto, no Coliseu dos Recreios. Digamos, para simplificar, que passa a haver um "antes-de-28-de-Outubro-de-2007" e um "pós": a autora de Horses (já lá vão 32 anos...) veio mostrar porque é — e como é — um dos ícones mais genuínos de um rock que se destrói e reconstrói no punk, ao mesmo tempo que integra a pulsão mágica da palavra poética e a contundência do discurso político.
Estaríamos porventura à espera de um concerto mais centrado nas covers que fazem o seu álbum deste ano, Twelve. O certo é que, mesmo com as memórias de Jimi Hendrix (Are You Experienced?) ou dos Nirvana (Smells Like Teen Spirit), o evento foi mais um vibrante e sentido best of que esteve, todo ele, ligado à energia do presente, não a uma mera nostalgia do passado. Acima de tudo, Patti Smith, aos 60 anos (completa 61 a 30 de Dezembro) mantém-se fiel aos poderes singulares da palavra poética, sempre cúmplice da teatralidade da performance, tudo encontrando o eco, a melodia e o ruído adequados na iniludível electricidade das guitarras.
Houve mesmo espaço e tempo para evocar a dimensão portuguesa da sua personalidade artística e, mais do que isso, a miragem de um café, em Lisboa, na companhia de Pessoa. O poeta, aliás, pode ajudar-nos a fechar este primeiro gesto de fixação de um concerto no labirinto de uma memória comovida: "Não sei quantas almas tenho / Cada momento mudei / Continuamente me estranho / Nunca me vi nem acabei."

domingo, outubro 28, 2007

Patti Smith: hoje, no Coliseu

ATENÇÃO: o site do Coliseu dos Recreios contém uma informação errada
— o concerto não começa às 22h00, mas sim às 21h30.

Desde finais da Primavera, Patti Smith tem andado em digressão na Europa [foto do concerto de 24 de Maio, em Sheffield, no Reino Unido], com regulares retornos aos EUA. 2007 foi também o ano de lançamento do belíssimo Twelve, álbum de covers onde se cruzam memórias de Jimi Hendrix, Bob Dylan e Nirvana, entre outros. Agora, é a vez de Lisboa: hoje, a partir das 21h30, canta no Coliseu dos Recreios. Em jeito de antecipação, estas são imagens do tema Elegie, cantado por Patti Smith, a 15 de Outubro de 2006, em Nova Iorque, no concerto final do CBGB.

Beethoven, com dedicatória

Não era raro um compositor pensar ou dedicar uma nova obra em função daquele que poderia ser o intérprete, ou solista, da sua primeira interpretação. E as duas peças de Beethoven (1770-1827) que encontramos neste disco são disso um exemplo. A primeira, de resto, um uma outra história a si associada e que mostra como, por vezes, era preciso trabalhar contra os ponteiros do relógio. Dedicada (e atribuída na sua noite de estreia) ao jovem prodígio Franz Clement (1780-1842), o Concerto para Violino e Orquestra Op. 61, de Beethoven começou a nascer apenas dez dias antes da sua primeira apresentação, a 23 de Dezembro de 1806, integrada num programa que incluía ainda, pelo mesmo violinista, obras de Mozart, Cherubini e Handel. O trabalho do compositor foi fulminante, mas sob pressão e a partitura entregue tão em cima da hora que, sem ensaio possível, Clement interpretou a obra à vista, descobrindo as notas ao mesmo tempo que as tocava... A obra não impressionou tanto quanto a sua interpretação, tendo Beethoven reescrito partes, apresentando uma versão final dois anos depois. Todavia, e apesar de estreada por um virtuoso, o concerto de Beethoven é, mais que um convite a uma exposição de talento interpretativo, um diálogo entre o solista e a orquestra. E, hoje, uma das suas obras de referência. O disco inclui ainda a Kreutzer Sonata, que, apesar de hoje conhecida e registada em nome de Rodolphe Kreutzer (um dos virtuosos do seu tempo), na verdade se crê ter sido pensada pelo compositor para o violinista britânico George Polgreen Bridgetower, que na verdade a estreou, em 1803. Nesta magnífica gravação agora editada pela Harmonia Mundi, são solistas Isabelle Faust (violino) e Alexander Melnikov (Piano), acompanhados pela Prague Philarmonia, sob direcção de Jiri Belohlavek.

Outros dois discos com obras de Beethoven chegaram, entretanto, aos escaparates, merecendo toda a atenção. Em primeiro lugar, um segundo volume de gravações de Sonatas para Piano, por Mitsuko Uchida. Depois de um primeiro, sublime, editado há um ano (com as sonatas Op. 109, 110 e 111), Uchida mostra igual sentido interpretativo nas Op. 101 e 106. Beethoven ganha nova vida nestas interpretações, que prometem fazer do ciclo em produção um conjunto tão marcante quanto o foi semelhante recente trabalho sobre a obra de Schubert. E um complemento aos cinco concertos para piano e orquestra que a mesma pianista já registou para a Philips, com a Toyal Concertgebow Orchestra, de Amsterdão.

A mesma Sonata para Piano op. 101 (frquentemente citada como uma das com maior repercussão posterior) surge a completar o alinhamento do mais recente disco da pianista francesa Hélène Grimaud, uma das estrelas em ascensão no actual catálogo da Deutsche Grammophon. O disco é todavia centrado no monumental Concerto para Piano Nº 5 (habitualmente citado como “Imperador”), no qual Grimaud é solista frente à Staatskapelle Desden, dirigida por Vladimir Jurowski. Grimaud, falando do sentido de heroísmo que este concerto sugere, chegou já a afirmar que, para si, os verdadeiros heróis são aqueles que tentam trazer ordem ao mundo. E que se mudam pelo bem do mundo. Um sentido que a sua abordagem a esta obra, de facto, sublinha.

Filme egípcio distinguido no DocLisboa

Foram atribuídos os prémios da 5ª edição do DOC Lisboa. These Girls [foto], filme egípcio de Tahani Rached, obteve o Grande Prémio Cidade de Lisboa (no valor de 7 mil euros); na secção investigações, Three Comrades, de Masha Novikova, foi o eleito (direitos de exibição na RTP2); o Grande Prémio Tóbis, para melhor filme português de longa-metragem, foi para Era Preciso Fazer as Coisas, de Margarida Cardoso (5 mil euros em serviços de pós-produção, com 15% de desconto quando ultrapassado o valor do prémio).

* No site do festival está disponível o palmarés completo.
* A
programação inclui hoje, domingo, os títulos premiados.

sábado, outubro 27, 2007

INQUÉRITO: Jodie Foster em "Silêncio"

O nosso inquérito sobre "a melhor interpretação de Jodie Foster" terminou com a escolha de O Silêncio dos Inocentes, de Jonathan Demme, filme de 1991 que lhe deu o seu segundo Oscar (três anos depois do primeiro, com Os Acusados). A saga de Clarice Starling e Hannibal Lecter (Anthony Hopkins) colheu uma confortável maioria de 40 por cento dos votos. Eis os resultados:

* O SILÊNCIO DOS INOCENTES (Jonathan Demme, 1991): 40%
* CONTACTO (Robert Zemeckis, 1997): 24%
* TAXI DRIVER (Martin Scorsese, 1976): 12%
* OS ACUSADOS (Jonathan Kaplan, 1988): 9%
* NELL (Michael Apted, 1994): 4%
* SALA DE PÂNICO (David Fincher, 2002): 3%
* ANA E O REI (Andy Tennant, 1999): 1%
* LITTLE MAN TATE (Jodie Foster, 1991): 1%
* PÂNICO A BORDO (Robert Schwentke, 2005): 1%

No caso de igualdade percentual, a ordem resulta do número absoluto de votos. A opção "outro" (filme) foi referida por 1% dos votantes.

Vieira da Silva em Lisboa

Inaugurou esta semana em Lisboa a exposição que reune obras de Vieira da Silva dos acervos da Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva e do Centro de Arte Moerna José de Azeredo Perdigão, que antes esteve patente no Centre Culturel Calouste Gulbeknian, em Paris. As obras estão organizadas não como um percurso de vida, mas por afinidades no traço, nas imagens, nas ideias que traduzem. São particularmente espantosos alguns desenhos a feltro e aguarela dos anos 50. Exposição no Museu Arpad Szenes - Vieira da Silva, na Praça das Amoreiras, até 17 de Fevereiro. Horário, de segunda a sábado das 11.00 às 19.00 e aos domingos das 10.. às 18.00. Fecha às terças. Bilhetes a 2,5 euros.

Na imagem: Le Hérault ou L'Héros (1939)

2057: Odisseia Solar

Há muito que não se via uma produção de ficção científica deste calibre. Sunshine – Missão Solar, de Danny Boyle junta o state of the art da tecnologia de efeitos visuais do momento para ilustrar uma história que colhe referências no 2001 de Kubrick e no Solaris (mais no de Soderbergh que no de Tarkovski), junta ao cocktail algum “psicologês” e relata a missão que tenta uma última hipótese de salvamento da vida na Terra, esperando conseguir reacender um Sol moribundo. O DVD inclui bons comentários e making of. Danny Boyle resolveu juntar duas curtas-metragens de outros realizadores para aproveitar as potencialidades de divulgação do DVD. Pena, aí, que tenha escolhido curtas absolutamente inconsequentes...

Estamos num futuro não muito distante, mais concretamente no ano 2057. Mas nada na Terra se assemelha ao que hoje conhecemos. Um longo Inverno há muito que atormenta o planeta. Um Inverno que se deve ao súbito e inesperado arrefecimento do Sol que, moribundo, ameaça a sobrevivência da humanidade. Há sete anos, uma missão de "salvamento" partiu rumo à estrela que nos deu vida. A bordo levava explosivos nucleares num porão do tamanho de uma cidade. Objectivo: reacender o Sol... Todavia, na recta final da missão perdeu-se o contacto com a nave. A "carga" não foi entregue. E o Sol continuou a arrefecer...
Este é o ponto de partida para este filme, que representa a mais ambiciosa e exuberante das produções de ficção científica dos últimos anos. Sunshine coloca-nos a bordo da Icarus II, segunda e derradeira missão de salvamento, levando a bordo todo o material nuclear resgatado pelo planeta fora. Entre a simplicidade militar de um submarino nuclear nas áreas de trabalho e carga, e o requinte de design minimalista dos compartimentos habitados, a nave acolhe uma tripulação escolhida a dedo. As pequenas tensões do dia-a-dia são controladas por um psicólogo que, em vez de comprimidos, receita minutos de paz numa sala que recria holograficamente situações relaxantes.
Perto da órbita de Mercúrio, porém, o que até então era uma missão controlada ao pormenor e cem por cento fiel ao programa estipulado, sofre reviravolta súbita no momento em que se descobre, inerte no espaço, a desaparecida Icarus I. Coloca-se a questão: manter a missão ou resgatar a carga explosiva da nave lançada sete anos antes, aumentando a hipótese de sucesso de detonação nuclear no Sol? O desvio de rota, decidido segundo o oposto do velho provérbio "mais vale um pássaro na mão que dois a voar", abre contudo uma sucessão de acidentes inesperados que, hora após hora, cada vez mais comprometem o sucesso da missão e, consequentemente, a última hipótese de futuro para a humanidade.
Um subtexto de fanatismo religioso atravessará uma história que, essencialmente contemplativa nos primeiros largos minutos do filme, caminha depois para um ritmo acelerado de acção, com episódio de arritmia à la thriller na recta final. No fim, tal como um astronauta deixa em mensagem à família, se o Sol se acender, foram bem sucedidos...
PS. Versão editada de textos publicados no DN e na revista NS

RTP: cópia ou alternativa?

Texto publicado na revista de televisão do Diário de Notícias (26 Out.), com o título 'O que é (ou pode ser) a RTP?' >>> Desde que, há cerca de quinze anos, começaram as emissões da SIC e da TVI, sou dos que pensam que a pedra de toque das opções do espaço televisivo português está, não nos privados, mas na RTP. Além do mais, há tendências gerais que os anos só agravaram: a generalização da reality TV, o triunfo do modelo “telenovela” no espaço da ficção e a contaminação populista da chamada área de informação. Face a tudo isso, a pergunta pedagógica continua a ser: que faz a RTP para contrariar este estado de coisas?
Agora que está em fase de consulta pública o Contrato de Concessão do Serviço Público, vale a pena repetir as perguntas. Não porque seja quem for (a começar por mim, obviamente) possa ter qualquer solução mágica para, pelo menos, atenuar a miséria criativa da televisão em Portugal. Apenas porque já é tempo de tentarmos ser adultos e reconhecer que as boas intenções são, mais do que nunca, a pior das ilusões políticas.
Cito: “A Televisão de Serviço Público tem de se constituir como um referencial de qualidade, que não se submeta a uma lógica exclusiva de mercado e preencha objectivos sociais e culturais, numa sociedade diversificada como a portuguesa, ajudando a formar públicos exigentes, motivados e intervenientes.” E pergunto: que significa isto numa televisão que, dia após dia, baliza as suas horas de maior audiência com a celebração pueril do consumo (O Preço Certo) e a redução das relações geracionais a uma competição anedótica (Sabe Mais do que um Miúdo de 10 anos?). A minha resposta é: significa zero, não passa de um arrazoado de generalidades para alimentar as boas consciências da classe política.
Não é um problema de pessoas. Por certo que a esmagadora maioria dos que trabalham na RTP tem talento para fazer mais, melhor e, sobretudo, para fazer diferente. Nem sequer é um drama financeiro: a gestão dos meios disponíveis poderia (a meu ver: deveria) ser infinitamente mais diversificada. É uma questão de atitude. Começa num princípio básico: arriscar ser uma alternativa às opções dos canais privados. Em boa verdade, esse é um dado de base que, em quinze anos, não mudou.

sexta-feira, outubro 26, 2007

Ermitage em Lisboa

A exposição "Arte e Cultura do Império Russo nas Colecções do Hermitage - De Pedro, O Grande, a Nicolau II", que traz a Lisboa mais de 500 peças do grande museu russo instalado num conjunto de seis palácios na antiga cidade Imperial de São Petesburgo, inaugura hoje ao fim do diama Galeria de pintura do Rei D. Luís, no Palácio da Ajuda. Estará patente até 17 de Fevereiro, de domingo a 5ª feira, das 11.00 às 19.00. Bilhetes a seis euros para a exposição (e oito para quem, além da exposição, queira também visitar a antiga residência real da Ajuda). Esta é a primeira de três exposições com peças do Ermitage que precedem a abertura, em 2010, de um pólo do museu russo em Lisboa. A imagem que ilustra o post não se refere à exposição de Lisboa, mas retrata uma das paredes do Ermitage. Terá Warhol visitado o Ermitage?...

PS. Ermitage e não Hermitage. Ou seja, a opção pelo nome habitualmente usado em Portugal e não a versão export anglo-saxónica, com "H". Mais próximo, portanto, da expressão "ermitério", que Catarina II dava ao espaço que, no século XVIII, naquele grande palácio, albergava a sua colecção de arte, na origem do museu que hoje conhecemos.

Cinema + iTunes: a revolução anunciada

De vez em quando, as coisas realmente revolucionárias acontecem mesmo ali, ao virar da esquina, e distraidamente nem reparamos... Esta notícia, via The New York Times, poderá ser um desses acontecimentos: pela primeira vez, um filme da produção independente dos EUA vai ser lançado directamente no iTunes americano. Que é como quem diz: sejam quais forem as suas qualidades, esse filme — Purple Violets, de Edward Burns [foto de rodagem] — entra directamente para a história do cinema e, muito em particular, para a história das relações (in progress) entre filmes e cinema, indústria cinematográfica e plataformas informáticas.
Claro que, já há algum tempo, e a par da música, o iTunes tinha começado a integrar conteúdos "cinematográficos", das curtas-metragens aos telediscos, passando pelos trailers. Em todo o caso, há uma diferença de grau que, desta vez, importa sublinhar: na verdade, e apesar de todas as convulsões do mercado audiovisual, a longa-metragem (e, muito em particular, a longa-metragem de ficção) continua a ser um objecto indissociável das salas, do seu papel comercial e social, e até do seu valor simbólico. Agora, com Purple Violets, a Net passa a funcionar como primeira montra (legal) de um filme.
Edward Burns tinha mostrado o filme no passado mês de Maio, no Tribeca Film Festival, sem conseguir mobilizar o interesse de nenhum distribuidor — agora, mais exactamente a partir de 20 de Novembro, Purple Violets será objecto de download. Para que conste, Burns acumula as funções de produtor, realizador, argumentista e protagonista, estando os outros papéis principais entregues a Selma Blair, Patrick Wilson, Debra Messing e Dennis Farina.
Que se segue? Cada vez mais filmes a surgir directamente na Net? Ou a possibilidade de filmes lançados na Net terem uma "segunda vida" nas... salas? Está tudo em aberto.

Memórias das férias

Os canadianos Tokyo Police Club estão a ultimar a gravação de um álbum de estreia. Revelados com uma série de singles e EPs editados em 2006 e já este ano, são mais uma prova da vitalidade e versatilidade das linguagens indie rock por aquelas bandas. Este é You're English Is Good, single que anuncia o álbum que vem a caminho...

Remisturas cool

A Cooltrain Crew celebra onze anos de actividade com uma compilação que recolhe 11 remisturas assinadas entre 2000 e 2006 por este colectivo determinante na história da disseminação de diversas linguagens da música contemporânea, sobretudo o drum'n'bass e territórios de reinvenção e recontextualização do jazz. Southeast D'N'B Flavas é o título da compilação (ed. Zounds Records), que recolhe olhares diferentes sobre temas de nomes como os Blind Zero, Da Weasel, Táxi, Dead Combo ou 1 Week Project. No inlay destaque para uma ilustração de André Carrilho.

Para reencontrar a ficção científica (18)

Stanislaw Lem
(1921-2006)


Foi, a dada altura, o escritor em língua não inglesa mais lido no mundo e um dos mais ferozes críticos da literatura de ficção científica, poucos sendo os autores que respeitava enquanto escritores (Philip K. Dick era o seu eleito). O seu mais célebre livro é Solaris, que já deu ao cinema duas magníficas adaptações, uma por Tarkovsky, em 1972, a outra, em 2002, por Steven Soderbergh.

Stanislaw Lem nasceu em Lwów (então território polaco) a 12 de Setembro de 1921. Filho de um antigo médico do exército imperial austro-húngaro, estudou medicina. Durante a II Guerra Mundial sobreviveu usando documentos falsos (que escondiam parcial ascendência judaica) e juntou-se à resistência. No fim da guerra, com a região da sua cidade entretanto anexada pela URSS, mudou-se para Cracóvia, onde, para fugir a um destino igual ao do pai, acabou a trabalhar como assistente num laboratório, tendo então começado a escrever nas horas vagas.
Começou por publicar poesia em 1946, apresentando ainda esse ano o seu primeiro conto de ficção científica Czlowiek z Marza (em português, O Homem de Marte), que publicou inicialmente por capítulos numa revista. Em 1948 um romance de características autobiográficas foi proibido pela censura comunista. Já Astronauci, o seu primeiro romance de ficção científica, teve autorização para seguir para a gráfica. A sua publicação convenceu-o a dedicar-se então prioritariamente à escrita.
Depois da morte de Estaline, o regime polaco permitiu uma maior liberdade de expressão, o que permitiu a Lem revelar-se internacionalmente como autor de ficção científica, tendo assinado uma multidão de livros rapidamente traduzidos noutras línguas. Em 1964 lançou Dalogi, o primeiro de uma série de textos de reflexão filosófica, característica de resto transversal a muita da sua obra de ficção.
A sua definitiva consagração internacional chegou em 1974, com a publicação internacional da antologia de contos Cyberidia, nos quais se falava, com humor, de um universo mecânico dominado por robots. Um ano depois, a adaptação de Tarkovski de Solaris (originalmente publicado em 1961) solidificaria o estatuto do escritor, que gozou ainda de grande popularidade em todo o mundo com A Voz do Dono e Fiasco.
Pela obra de Stanislaw Lem passam histórias de ficção científica no sentido mais tradicional do termo (especulativas, mas procurando um sentido de verosimilhança científica e tecnológica), assim como contos claramente construídos sobre alegorias. Um dos seus temas predilectos era a exploração do que defendia ser uma incapacidade de comunicação entre humanos e extra-terrestres. Um sentido de humor negro frequentemente sublinha marcas de cepticismo que passam pelas suas palavras.


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Alguns títulos fundamentais:
1959: Eden (Europa América, 1990)
1961: Solaris (Europa-América, 2003)
1967. Cyberiada
1968: A Voz do Dono (Europa América, 1985)
1986: Fiasco (Europa-América, 1988)

quinta-feira, outubro 25, 2007

Bem lido, Mr Chance

Um ano depois do excelente O Pássaro Pintado, a Livros de Areia publica outro dos títulos mais significativos da obra de Jerzy Kosinski (1933-1991), escritor nascido na Polónia mas naturalizado norte-americano em 1965. Chance (no original Being There, inicialmente publicado em 1971) é uma espantosa sátira política que, sobretudo, desenha uma caricatura mordaz dos bastidores de Washington.

Em, de apenas 140 páginas, Chance, numa escrita clara, directa, muito visual, conta-nos a história de um velho jardineiro, analfabeto, alheado do mundo, ingénuo, solitário, que durante toda a vida habitou um pequeno quarto numa mansão de um homem rico que o recolheu e deu trabalho. Foi jardineiro, estação após estação tratando das plantas da mansão, vendo televisão nas horas vagas. E nunca saindo deste pequeno mundo. Nem mesmo para um passeio na rua... A morte do “velho”, dono da mansão, deixa-o sem casa nem rumo. É atropelado na sua primeira passeata na rua da grande cidade. O acidente leva-o a uma outra mansão, a da mulher que o atropelou e do seu marido moribundo, figura da alta finança e amigo do Presidente... Chance é aceite na nova família, julgando-o estes um distinto homem de negócios. É apresentado ao Presidente e, questionado sobre a economia do país, responde como se de um jardim estivesse a falar e sem ambição de muito mais. É o que sabe. Responde ao que pensa que lhe perguntaram. A verdade é que a resposta deixa todos perplexos. E aí nasce um mito fulminante. Quem é Chance? É convidado para falar na televisão, os jornais querem fazer dele um perfil, a Casa Branca desespera sem entender que é, a espionagem de Leste disputa-o... Hilariante, ao mesmo tempo profundamente dramático, o livro foi adaptado ao cinema em 1979 por Hal Ashby (a imagem que ilustra o post é do filme), como Bem Vindo Mr Chance. O filme deu o seu último grande papel a Peter Sellers e respeita espantosamente o livro original de Kosinki agora publicado entre nós.
Discutível, parece, apenas, a opção de juntar a sugestão de uma imagem de Bush numa capa que, de resto, é soberbo exercício de tradução, pelo design, da ideia central ao livro. A caricatura de Chance é ao sistema, não a Bush ou a uma figura em particular. O livro é de 1971. Não havia Bush presidente... O livro português, é certo, surge na era Bush... Mas que não se tire o texto do contexto, por muito que a actual administração americana também justifique a sátira.

Fantasmas e almofadas

Está aí o segundo álbum dos norte-americanos Band Of Horses, editado pela Sub Pop. Tem por título Cease to Begin e é apresentado pelo single (apenas de edição digital) Is There A Ghost. Aqui fica o teledisco...

Sheiks vezes três

Numa mesma altura em que o grupo anuncia uma reunião para uma temporada de espectáculos no Jardim de Inverno do São Luiz, de 8 a 24 de Novembro, os Sheiks (a banda portuguesa dos anos 60), são também notícia nos livros e nos discos. Luís Pinheiro de Almeida está a trabalhar numa biografia do grupo, a publicar pela Assírio & Alvim. Ao mesmo tempo, a Valentim de Carvalho ultima a edição de uma antologia que, num CD, vai reunir as 32 gravações da obra dos Sheiks. O álbum sai a 19 de Novembro.

quarta-feira, outubro 24, 2007

A rapariga que era para ser estrela pop

O tempo fez de Vashti Bunyan uma figura de absoluta referência na folk (e por aí...). Mas os seus primeiros passos foram em tudo semelhantes aos de Marianne Faithfull, sob orientação do manager dos Stones e com canção de Jagger e Richards como single de estreia. Aqui está ela, em 1965, a apresentar na televisão o seu primeiro (e hoje quase esquecido) Somethings Just Stick In Your Mind...

Documentário Nº 5

A extensão ao Porto da 8ª Festa do Cinema Francês arranca hoje, pelas 21.30 no Auditório da Fundação de Serralves com a projecção do documentário Lagerfeld Confidentiel, de Rodolphe Marconi. Trata-se de uma perspectiva pessoal, íntima q.b., mas sempre consentida, pelo que “oficial”. Lagerfeld abriu os espaços da sua casa, da sede da casa Chanel, ao jornalista. Levou-o a um fim de semana numa casa de campo, mais tarde a Nova Iorque. Autorizou que o filmassem enquanto fotografava Nicole Kidman ou quando recebia Carolina do Mónaco. Mas o mais interessante do filme são as frases, sempre em pose, de um homem que ser revela mais que ícone e glamour sofisticado ao jeito do mundo da moda. O seu humor cortante e corrosivo, em entrevistas que vão acontecendo por onde passa a câmara alimentam um filme que é mais que um mero retrato biográfico, mas também uma peça com assinatura Lagerfeld.

O disco americano, que o foi

Ano Bowie – 65
‘Young Americans’ – Álbum, 1975


Durante a sua residência no Rower Theatre, em Filadélfia, em Julho de 1974, Bowie entrou pela primeira vez nos míticos Sigma Sound Studios, a “casa” do som negro que caracterizava a cidade. A sua antiga paixão pelo rhythm’n’blues (que podemos recordar nos singles que editou antes de 1966) ganhou nova visibilidade. Pediu a Coco Shwab (a sua assistente pessoal) uma lista de novos discos de referência na música negra, entre os quais títulos da emergente cena disco. As sugestões de 1984, em Diamond Dogs ditavam o rumo de um novo álbum que, meses depois, ganhou forma nesse mesmo estúdio em Filadélfia, contando novamente com Tony Visconti na produção e com um distinto lote de músicos, entre os quais o guitarrista Carlos Alomar e o baixista Willie Weeks. As sessões foram rápidas, gravado quase todo o álbum no curso de apenas duas semanas. Este foi desde o início um disco nocturno, gravado noite fora num tempo em que Bowie vivia com horas trocadas. Numa etapa posterior, já com o disco supostamente gravado, Bowie passou uma temporada em Nova Iorque. E aí aprofundou uma amizade com John Lennon que, meses antes, havia conhecido em Los Angeles. Juntos entraram em estúdio, trabalhando uma versão de Across The Universe (dos Beatles) e um inédito, Fame, que viria a dar o primeiro número um americano a Bowie. Os temas, naturalmente, entraram à última hora em Young Americans, tornando-se peças fundamentais no seu alinhamento. O disco acabou por reflectir plenamente a vontade de abordar a música negra norte-americana, abrindo novos caminhos na obra de Bowie com continuidade, mais tarde, em álbuns como Let’s Dance (1983) ou Black Tie White Noise (1993). Foi bem recebido, sobretudo nos EUA, onde Bowie se viu elevado de estrela de culto a figura de primeira linha do showbiz. Young Americans é um disco não unânime entre admiradores de Bowie. Mas, como os seus demais títulos de 70, teve imediato impacte junto dos seus contemporâneos. Os Roxy Music mostraram igual paixão negra em Love Is The Drug. E Rod Stewart fez o mesmo em Atlantic Crossing...

É desta?

Geoff Barrow anunciou que o álbum dos Portishead está a um dia de ser concluído. E que, agora, ele e Beth Gibbons vão trabalhar na capa do disco e na preparação de material para concertos. O disco será o sucessor do seu segundo álbum de originais, que data de 1997. Depois de adiamentos e mais adiamentos, será desta?

Holzmair: sob o signo de Schubert

O barítono austríaco Wolfgang Holzmair canta quase sem se afastar do piano. É uma espécie de ambígua humildade de quem, por assim dizer, não quer separar-se do próprio corpo do piano, fundindo-se com os seus tempos e melodias (por vezes, os movimentos das mãos "encerram-no" mesmo na concavidade da tampa, numa espécie de poética fusão). Foi assim, pelo menos, que Holzmair se apresentou no Grande Auditório da Fundação Gulbenkian (dia 23, 19h00), para a abertura do "Ciclo de Canto" 2007/08 — no programa constava O Canto do Cisne (Schwanengesang), de Franz Schubert (1797-1828), colecção póstuma de canções com poemas de Johann Gabriel Seidl, Ludwig Rellstab e Heinrich Heine.
Se é verdade que a posição termi-nal destas composições (Schubert escreveu-as nos derradeiros meses de vida) convida a todas as metáforas trágicas, não é menos verdade que há nelas uma pulsão de vida — plena de contrastes e deambulações — que o canto pode sublinhar e, de alguma maneira, engrandecer. Foi isso, justamente, que fez Holzmair, senhor de uma voz em que a precisão técnica se reconfigura através de uma es-pantosa riqueza de timbre, literalmente dramática, subtilmente teatral. O acompanhamento da pianista inglesa Imogen Cooper distinguiu-se pela mesma sábia contenção e pelas envolventes intensidades saídas do seu labor. Sem ter lotação esgotada, porventura pela ausência de nomes mais "consagrados", o concerto da Gulbenkian foi um momento de eleição e deixou um raro sentimento de plenitude — Schubert conjugado no presente.

terça-feira, outubro 23, 2007

Discos da semana, 22 de Outubro

Ao segundo álbum de temas originais (o anterior, Oh You’re So Silent Jens, na verdade, era uma antologia de velhas notas soltas), o sueco Jens Lekman confirma que nele temos a apontar um dos grandes herdeiros, no presente, da grande tradição da canção de autor. Sem os sinais de arte final lo-fi que há três anos se escutavam em When I said I Wanted To Be Your Dog (um álbum de estreia que não deixou ninguém indiferente, é verdade), o novo disco mostra o mesmo contador de histórias numa mais segura afirmação das suas capacidades na escrita e, sobretudo, mais desafiante na abordagem à sua forma. O título ainda sugere sinais de uma vivência de bairro de que estas canções podem ser vistas como pequenas crónicas vivenciais. Kortelada é, na verdade, o bairro de Gotenburgo onde estas canções ganharam forma. Um bairro familiar, de rostos conhecidos das rotinas do dia a dia, com o seu ritmo de subúrbio, as suas pequenas histórias. Cenários e gentes que Lekman assimila e transforma em canções onde ao real se junta a ficção, como que observando e comentando à distância o que outrora pode até ter sido próximo. Canções que ganharam, depois, eloquente forma em arranjos mais elaborados, mais ousados, herdeiros de escolas várias da cultura pop, mas cientes de que na nostalgia não moram todas as respostas. Jens Lekman é um crooner em afirmação, e tem neste disco a colecção de canções que cruza a dor e paranóia das histórias relatadas com o charme dourado dos arranjos que as adornam. Sedutores jogos de contrastes que a voz domina afirmando uma pop em technicolor que já se adivinhava no passado do músico mas não se esperava tão consequente e firme tão depressa.
Jens Lekman
“Night Falls Over Kortelada”

Secretly Canadian / Flur
4/5
Para saber mais: site oficial
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Depois de um primeiro álbum a solo decididamente irregular, Rosin Murphy parece reencontrar o caminho que, em tempos, de si fez uma das mais atraentes e enigmáticas vozes ao serviço de uma pop vitaminada em energias dançantes... Falamos dos primeiros tempos dos Moloko (em particular do álbum de estreia Do You Like My Tight Sweater, de 1995), cuja carreira deslaçou com o tempo, acabando ao fim de quatro álbuns, e quase com a memória da sua estreia apagada. Overpowered não é estilisticamente um sucessor desse álbum dos Moloko, mas nele encontra familiaridade ao afirmar uma existência que firma identidade na canção pop e se veste, depois, com trajes de glamour colhido nas tendências em voga na cultura de dança. É verdade que, em mais nenhum momento do alinhamento se repete o absoluto instante de génio pop que se escuta no tema título (em parceria com Seiji, dos Bugz In The Attic), que parece citar “clássico” I Wanna be Your Lover dos La Bionda. Mas pelo alinhamento do álbum não faltam outros exemplos de saudável relação entre a pop e a música de dança. Checking On Me mostra mais verdades r&b que muita da produção que como tal se afirma e ganha prémios na MTV. Let Me Know recupera a canção para piano com tempero house de finais de 80. Movie Star é puro e delicioso delírio electro pop. Footprints recorda o disco pré-Febre de Sábado à Noite. Cry Baby evoca o hi-nrg de Bobby Orlando. Em suma, não se trata de um compêndio pedagógico “viagem pela pop dançável em 11 faixas (e dois bónus)”, mas não deixa de ser uma das mais curiosas incursões da pop pela história da música de dança dos últimos tempos. E com algumas boas canções, acrescente-se...
Roisin Murphy
“Overpowered”
EMI / EMI Music Portugal
3/5
Para ouvir: MySpace
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Quantas são as bandas que dão o arzinho da sua graça depois de uns discos que passaram a Leste das atenções, ganham estatuto fugaz de nova banda favorita e, depois, aos poucos, perdem encantos e desaparecem. Parecia ser esse o futuro destinado aos suecos The Hives. Depois de dois álbuns que quase ninguém escutou na hora da sua edição, conquistaram meio mundo com um dos mais viciantes hinos de garage rock da década (Hate To Say I Told You So) e uma antologia, com a bênção da Poptones de Alan McGee. Há três anos, Tyrannosaurus Hives mostrava apenas sinais de gestão de continuidade em mais do mesmo, alertando para a possibilidade de, nesta banda favorita da véspera poder morar mais um caso de “já foi”... A verdade é que a resposta a essa etapa de continuidade inconsequente respondem agora com um álbum de inesperada versatilidade e vitalidade. Uma diversidade que não se esgota nas duas colaborações com Pharell Williams, nem no mero facto de passarem a recorrer mais a teclados, mas que mora ao longo de todo o alinhamento de um dos mais contagiantes discos de rock’n’roll deste ano. É, contudo preciso vencer a antecâmara do álbum para o descobrir de facto. As três faixas de abertura são Hives em modo “clássico”, garage rock melodista e estridente quanto baste. Segue-se We’re All Right, uma espécie de interlúdio de transição (uma das colaborações do senhor Pharrell). E então entramos num disco onde a pulsão garage pura destes suecos mostra porque tanta fama de bom pastiche tem a música da sua terra. Aqui há de tudo, do hino new wave (Return The Favour) ao coro de cervejas em noite de pub (Your Dress Up For Armageddon), de um rock temperado a funk (T.H.E.H.I.V.E.S.) aos diálogos de canto e fala à Adam & The Ants (Giddy Up!)... E até mesmo uma pequena folia pop que parece herdeira, bem arrumada, é certo, da fase final de Mr Bungle (Puppet On A String, que não é versão do hino eurovisivo de Sandie Shaw)... Eles voltaram. A preto e branco, como o título diz, mas com mais cores que nunca.
The Hives
“The Black And White Album”
A&M Records / Universal
4/5
Para ouvir: MySpace


Os manos Friedberg, que é como quem diz os Fierey Furnaces, são um caso complicado. Deram a esta década, no seu segundo álbum (Blueberry Boat, de 2004) uma das mais estonteantes surpresas. Ao álbum fizeram suceder uma antologia de singles (EP, 2005), na qual se escutava a sua evidente paixão pela canção pop e uma forma muito peculiar de a abordar. Mas depois o disparate instalou-se. Reharsing My Choir (2005, o tal disco gravado com a avó) e Bitter Tea (2006) eram pálidas materializações de potencialidades antes reveladas. E, convenhamos, frustração para quem neles procurou um álbum capaz de suceder, sobretudo, à excelência e personalidade pop das canções reunidas em EP. Valha-nos então este Widow City (a sua estreia pela Thrill Jockey), porque representa, finalmente, o ensaio de passo seguinte a essa experiência até aqui não dado. Deixaram de lado aquela vontade de fazer de cada disco um conceito... Juntam um baterista, mais guitarras às suas electrónicas. E no novo mais não mostram que um conjunto de canções nas quais são claras as marcas de uma banda que, na melhor tradição Monty Python, gosta de, ao fim de uns compassos, decretar “and now for something completly different”, para logo depois aplicar novo salto ou voltar à casa partida. As canções dos Fiery Furnaces são pequenos desafios. Atraem-nos com uma sequência de acordes ostensivamente doce, iludem-nos pelo canto e, depois, zás, levam-nos onde menos esperamos. Muitas vezes conseguem viagens inesquecíveis. Outras vezes enganam-se, e lá vamos com eles por atalhos de labirinto... Widow City tem casos num e outro destes caminhos possíveis. Aqui moram momentos de pop inventiva e superlativa. E alguns pontuais desvios, meio perdidos, pelo desconhecido, pelo acidental, por vezes inconsequentes... O bom, todavia, supera os eventuais desnortes. Se bem que, melhor mesmo teria sido um alinhamento mais curto, onde um filtro poderia aprumar a colecção pop que aqui se mostra. Mesmo assim, este é o seu melhor momento desde EP...
Fiery Furnaces
“Widow City”
Thrill Jockey/Dwitza
3/5
Para ouvir: MySpace
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Terão ainda conserto? Conserto de arranjo, que concertos de palco ainda os dão... Falamos dos R.E.M., em evidente rota pela ribanceira abaixo. Não se trata de uma aplicação primária daquela ideia que defende que o passado é sempre melhor que o presente numa banda. Até porque, em 27 anos de carreira, os REM já conheceram etapas melhores e piores, em diversos ciclos. Desde há uns tempos, contudo, parecem sob evidente ciclo-não. Around The Sun, o seu mais recente álbum de originais, foi o pior momento de uma digníssima carreira, uma das primeiras a trazer ao mundo os sinais de uma América rock indie nascida na alvorada de 80. Em tempo de pausa, lançam um registo ao vivo gravado há dois anos no Point Theatre, em Dublin. Dois CDs, um DVD... E uma espécie de best of ao vivo, com energia gritante a principio, encontrando Michael Stipe a calma logo depois, assegurando um desfile competente, representativo, mas longe do viço de concertos que, quem os viu, certamente recordará. Há temas recentes, como Bad Day ou Electron Blue que, ao vivo, mostram mais carne que nos originais de estúdio. Mesmo assim, este retrato de duas noites de palco mais não mostra que uma banda profissional, segura, a cumprir o que se lhe pede. Raros álbuns ao vivo justificam ser mais que uma desculpa para editar mais um besf of. Não é, decididamente, o caso...
R.E.M.
“Live”

WB / Warner
2/5
Para saber mais: Site oficial


Também esta semana:
Dave Gahan, Soulwax (remixes), Lilac Time, To Rocco Rot, Van Morrison (best of), Flaming Lips (DVD), Teddy Thompson, Teresa Salgueiro, Stevie Wonder (best of), Ian Brown, Steve Jansen, Tributo aos Mão Morta

Brevemente:
29 de Outubro: Rodrigo Leão, Bob Dylan (DVD), Ray Davies, Youssou N’Dour, Sex Pistols, Mazgani, Libertines (best of)
5 de Novembro: Sigur Rós (CD + DVD), Gorillaz (compilação), Boy Kill Boy, Nick Cave (banda sonora), David Byrne, Ladytron (repackage)
12 de Novembro: Susumu Yokota, Rolling Stones (compilação), LCD Soundystem, Raveonettes, Killers, Led Zeppelin (best of)

Novembro: Duran Duran, Sex Pistols (singles), Scissor Sisters (DVD), Daft Punk (live), Muse (live), U2 (reedição), Jean Michel Jarre (reedição)
Dezembro: Rufus Wainwright (CD+ DVD ao vivo), Johnny Greenwood

Lévy, Godard e as imagens

La Chinoise (1967), de Jean-Luc Godard

Texto publicado no Diário de Notícias (22 Out.), com o título ' Repensando a crise da esquerda europeia' >>> No mercado português do DVD, surgiu um dos grandes clássicos do “cinema político”: La Chinoise (1967), de Jean-Luc Godard, com o título O Maoísta. Muitas vezes apontado como um filme premonitório da crise de Maio 68, La Chinoise é uma visão crua, desencantada e, afinal, profundamente irónica, quase burlesca, de um grupo “maoísta” de estudantes franceses. Com admirável precisão sociológica, Godard retrata o “ar do tempo” e o delírio maniqueísta de muitas palavras de ordem. Ao mesmo tempo, porém, Godard celebra também a simples capacidade de indignação e revolta, isto é, a certeza de que a fealdade do mundo não é um destino, mas algo que, no mínimo, se pode discutir.
São velhas questões. São, sobretudo, questões que relançam novíssimos problemas, em particular no espaço ideológico da esquerda europeia. É essa a constatação brutal e, à sua maneira, didáctica de um livro admirável que acaba de sair em França: Ce Grand Cadavre à la Renverse (ed. Grasset), do filósofo e ensaísta Bernard-Henri Lévy. A expressão do título provém do prefácio que Jean-Paul Sartre escreveu em 1960 para uma reedição de Aden Arabie (1931), de Paul Nizan: podemos traduzi-la por “esse grande cadáver (virado) de costas” e refere-se, muito explicitamente, à esquerda.
Inevitavelmente, Lévy vai ser atacado por tudo e mais alguma coisa, à direita e à esquerda, nem que seja por causa do tipo de camisas que gosta de vestir (não estou a exagerar...). Digamos, então, para simplificar que a esquerda teria interesse em enfrentar as interrogações de alguém que arrisca pensar “o que resta da esquerda”, não separando-se dela, mas reafirmando-se, empenhado e disponível, no interior da sua crise.
Um dos aspectos mais espantosos do livro é que Lévy fala de uma esquerda que existe, antes de tudo o mais, como património de imagens. Que imagens? As de Maio 68, justamente. Mas também, antes, as de André Malraux. Ou do Bangla Desh, que o autor visitou aos vinte e poucos anos. Ou de Portugal, em 1974 (Otelo como “actor barroco e shakespeareano”). Ou ainda as da Bósnia, onde Lévy rodou (com Alain Ferrari) um admirável documentário: Bosna! (1994).
Para Lévy, trata-se de reorganizar todas essas imagens e questionar coisas pouco cómodas e, sobretudo, muito recalcadas. Por exemplo: que significa passar da crítica metódica da administração Bush para a histeria de um anti-americanismo que apenas favorece os inimigos da democracia? Ou ainda: no “confronto” das religiões, como sustentar o rigor político da laicidade, resistindo aos equívocos morais de algumas formas de tolerância?
No fundo, Lévy pergunta tudo aquilo que uma esquerda “generalista” e acomodada não quer perguntar, muito menos enfrentar. Em nome de quê? Do simples poder transformador da história. Resumindo (até onde é possível resumir um fascinante livro de 400 páginas): trata-se de combater “essa ideia idiota, e louca, segundo a qual a história acabou”.

segunda-feira, outubro 22, 2007

A IMAGEM: Inge Morath, 1961

Inge Morath / MAGNUM
Marilyn Monroe, rodagem de 'The Misfits', 1961

Joan Fontaine: 90 anos

Ironia hitchcockiana: Lady Aysgarth tira algumas dúvidas so-bre "psicologia infantil", enquanto olha o seu marido que, suspeita ela (e suspeitamos nós), anda a tentar matá-la... É uma imagem de 1941, do filme Suspeita, o quarto de Alfred Hitchcock em terras americanas. A senhora compreensivelmente ansiosa é Joan Fontaine, luminosa estrela de Hollywood que, aliás, Hitchcock dirigira um ano antes, em Rebecca, o seu primeiro título made in USA.
Joan Fontaine nasceu a 22 de Outubro de 1917 — faz hoje 90 anos. Parabéns!