segunda-feira, outubro 16, 2006

Discos da semana, 16 de Outubro

Cansei de Ser Sexy “Cansei de Ser Sexy”
Apesar da concentração de atenções mediáticas (lá e cá) perante outros destinos musicais, factos e figuras nascidas entre as muitas cenas underground brasileiras por vezes furam o pano e revelam-nos verdadeiras surpresas que fogem às bitolas do gosto instituído. E por todas as razões celebremos a chegada ao mundo das Cansei de Ser Sexy. Porque dão visibilidade, na hora certa, a mais uma manifestação de saudável rebeldia com código postal de São Paulo. Porque, com mais sorte que bandas como Fellini, Gang 90 ou Harry (colheita pós-punk de 80), saltaram em tempo de vida as fronteiras da atenção local e entraram nos circuitos internacionais. Porque não precisam mais do rótulo “Brasil” para chamar atenções, a sua música hoje colocada junto dos Ladytron em cartazes de concerto, a identidade musical e não a lógica do "habitual" exótico tropical a falar por si. Porque, mais e melhor que tantos outros cultores de referências comuns (dos White Rose Movement aos Every Move A Picture, dos Boy Kill Boy aos The Sounds), encontraram uma forma mais vincada de expressar personalidade demarcada acima da mera citação de ilustres heranças. Mais pop que as Chicks On Speed, cruzam guitarras, electrónicas e sentido de urgência. A canção é forte e dançável. O desafio ao corpo, inevitável (pontuais temperos funk a reforçar o dominante viço rock’n’roll). Há atitude (que quando aflora o português lembra euforia teen da velha Blitz). E grandes canções... Pena apenas que a versão internacional tenha deixado de lado Superafim ou Acho Um Pouco Bom, as melhores propostas do disco, na versão original.

Beck “The Information”
O contexto (a estreia das canções no YouTube, a capa na Wired, a nova forma de construção de albums na idade do download) fez de The Information um polo inevitável para relexões sobre o estado da nação tecnológica musical e alvo das justificadas atenções de espaços ligados à cibercultura. Porém, por trás de todo este mundo de zeros e uns, há música. E que nos dá um dos melhores albums da carreira de Beck. Mais que em Guero (onde não parecia aconterer mais que um episódio de síntese e catalogação de ideias já apresentadas), The Information promove reencontros com velhos destinos, projectando-os em novas direcções. Hip hop e folk são tijolos certos numa construção onde a canção é invariavelmente a meta, nunca forçada a um denominador comum. Sente-se um desejo de regresso ao ferro velho de sons do qual em tempos fez nascer híbridos estimulantes, todavia longe da pulsão visceral de Odelay ou do viço funk de Midnite Vultures. No fim reconfirma-se, sobretudo, o enorme talento do songwriter, assim como a visão de um encenador inspirado (que uma vez mais agradece à produção de Nigel Godrich).

Vários “Plague Songs”
Há um ano, a organização britânica Artangel desafiou dez músicos, pedindo-lhes que criassem, cada qual, uma canção baseada numa das pragas bíblicas rogadas ao Egipto, relatadas no Êxodo, através das quais se tentou convencer o Faraó a libertar os escravos israelitas. A ideia começou por ganhar forma em Exodus, um concerto apresentado em Margate. E agora tem conclusão natural na gravação e edição de um disco com as canções encomendadas. O resultado mostra de tudo, algumas das partes claramente destacadas sobre a soma de um todo apenas mediano. Pérola das pérolas no alinhamento do disco, a leitura da praga da escuridão por Scott Walker em Darkness transporta-nos para uma dimensão sombria, negra de facto, formas menos abstractas que as expostas no recente álbum The Drift num espaço todavia ainda sem noção exacta de corpo. Entre as melhores leituras das dez pragas contam-se The Meaning Of Lice, por Stephin Merritt (pop “com piolhos”, em registo não distante do que escutamos no novo álbum dos Gothic Archies); Flies, texturalmente cativante sob orientação plástica de Brian Eno e Robert Wyatt (numa canção com sonoplastia consequente, sugerindo voo de repelentes insectos); The Fifth Plague (a da pestilência e consequente morte de gado) por Laurie Anderson e ainda o simples, belo, Katonah, de Rufus Wainwright (num registo acústico, americano profundo, a lembrar The Maker Makes), sobre a décima e derradeira praga, a da morte dos primogénitos. Sem cativar nem incomodar, Imogen Heap (metade do duo britânico Frou Frou) faz da praga dos gafanhotos uma banal pop para FM generalista, Cody Chesnutt traz Soul pouco estimulante a Boils, King Creosote canta sapos sem convicção em Relate The Tale, os Tiger Lillies adormecem qualquer alma hiperactiva em Hailstones. Elo mais fraco, o hip hop de trazer por casa à la Klashnekoff, ainda por cima como faixa de abertura, nada faz pela saúde do disco.

Electronic “Get The Message”
A história não podia ter começado melhor. Getting Away With It, com a colaboração vocal de Neil Tennant, era perfeita apresentação para uma ideia pop juntando Bernard Sumner (New Order) e Johnny Marr (ex-Smiths) e a sua vontade em fugir aos cânones do meio. Seguiu-se um seguro álbum de estreia, pop de primeira água, inteligente, actual, eficaz. Ainda mais um single, Disapointed, novamente com Neil Tennant. E depois a asneira, ribanceira abaixo, em mais dois álbums onde a inspiração do primeiro não morava. Agora, em jeito de balanço, um best of nutritivamente débil, com telediscos num DVD de extras, mas retratando a realidade de uma banda que não deu forma às promessas com as quais se apresentou em 1989

Também esta semana: Osvaldo Golijov (ópera), Mercury Rev (best of), Chuck E Weiss, Yo La Tengo, Jesus & Mary Chain (reedição)

Brevemente:
23 de Outubro: PJ Harvey, Sérgio Godinho, The Byrds (caixa), Pet Shop Boys (ao vivo), Robbie Williams, Bright Eyes (raridades), Luna (best of), Acorda (compilação em mp3), Mercury Rev (best of), Depeche Mode (3 reedições), Maximilian Hecker, Isobel Campbell
30 de Outubro: The Gift (ao vivo), Goldfrapp (remisturas), Agnés Jaoui, M Ward, Joana Amendoeira, Ann Pierlé, Aimee Mann, Marie Antoinette (BSO)
6 de Novembro: Mariza (ao vivo), The Matches, Kool & The Gang (antologia), Philip Glass (ópera e BSO The Illusionist)

Novembro: Sam The Kid, Protocol, Goldfrapp (remisturas), Duran Duran (2 reedições), Clinic, Jay Jay Johansson, Humanos (ao vivo), Tom Waits, Moby (best of), Jarvis Cocker, Sons & Daughters, Bryan Ferry, The KBC, Third Eye Foundation, JP Simões, U-Clic, Joseph K (antologia), The Who

Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento

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