segunda-feira, maio 15, 2006

Discos da semana, 15 de Maio

Final Fantasy “He Poos Clouds”
Há um ano Owen Palett editava um primeiro álbum de canções nas quais revelava indubitável talento na composição, o que lhe não era adivinhado por quem o descobrira a tocar violino nos Arcade Fire, mas não constituía surpresa a quem estivesse mais atento à efervescente vida de aventuras paralelas, bandas e colaborações de um dos mais agitados músicos canadianos da nova geração, de alma dividida entre a música, os livros e, sobretudo, os jogos de computador (daí o nome do projecto, sim senhor). Se esse álbum de estreia, Has A Good Home, revelava ideias interessantes na escrita de canções estruturalmente pensadas para diálogos entre o violino e a voz, o novo álbum arruma mais cientificamente a casa, inspira ambição e revela um épico que está já distante da linguagem pop (apesar de aceitar alguns dos seus princípios e de tomar a canção como célula primordial da obra), e investe claramente num terreno de ensaio de uma escrita que quer colher ideias em escolas da música contemporânea, não só no mais óbvio minimalismo de Philip Glass, como também em registos para quarteto de cordas que temos escutado em diversos compositores nos últimos anos. De resto, nesta visão mais global e atenta de Owen Palett revela-se uma utilização mais vitaminada e liberta de lugares comuns da presença das cordas em contexto “pop”, tão banal e excessivo que tem sido o recurso de tantos “pops” a pequenas orquestras como verbo de encher e pouco mais. He Poos Clouds não é uma ópera (mais um ciclo de canções), mas tem a sua dose de personagens, de histórias e talvez mesmo uma linha narrativa, parecendo dominar a escrita das canções uma visão céptica sobre as relações amorosas e, mais ainda, o suicídio… Não falta depois um sentido de humor, que corta a tensão sugerida a dados momentos e nos desvia do mergulho sombrio nas amarguras da alma como nos lançou Mahler nos seus catárcticos Das Lied Von der Erde ou o mais magoado ainda Kindertodtlieder. Um primeiro contacto, sobretudo se feito de mente embebida na luminosidade de alguns dos melhores momentos de Has A Good Home ou na exuberância festiva dos Arcade Fire ou The Hidden Cameras (com os quais colabora) pode induzir-nos no caminho errado. Cabe a uma saudável insistência (que muitas vezes compensa) a descoberta de um monumento de grande ambição que Owen Palett enfrenta e domina de frente. Se Has A Good Home era a tímida apresentação, He Poos Clouds é a definitiva afirmação da visão de um dos grandes compositores da actualidade.

Faris Nourallah “Il Suo Cuore Di Transístor”
A relação de Faris Nourallah com a escrita e edição reflecte o seu modo de vida peculiar, alheado das normas habituais na pop. Não dá concertos. Nem sequer sai de casa, pelo que a cada nova colecção de canções entre mãos está pronto a juntá-las num novo disco. Assim se explica, tão depressa, um sucessor de King Of Sweden, do ano passado (Near The Sun, saído entre nós há poucas semanas, era uma compilação para iniciados ao cantor). Quarto álbum de originais em menos de três anos, Il Suo Cuore Di Transístor mantém as premissas dos anteriores King Of Sweden (2005), Problematico (2003) e I Love Faris (2003). Canções de recorte pessoal, sem lógica conceptual a ligá-las, antes apenas o desejo de as fazer nascer e juntar entre a mais recente fornada. Há por aqui pop, laivos de teatralidade (sempre interessantes porque nunca adiposa) e, sobretudo, magníficas baladas, claramente o formato no qual Faris Nourallah neste momento esboça as suas melhores canções. A uma escrita simples, mas amiga do desafio formal juntam-se uma voz expressiva e agradável e um gosto pelas artes decorativas, em ementa de contenção de gastos, nunca aqui se expondo o supérfluo. Todavia, o lote de canções não está ao nível do que nos mostrou em discos anteriores. Nada de grave, sabendo nós estarmos perante uma obra que nasce fluente, livre, e capaz do melhor na hora seguinte. Mas face à excelência da recolha no recente best of e da oferta em discos anteriores, este é claramente um álbum menos entusiasmante.

The Czars “Sorry I Made You Cry”
Chega finalmente aos nossos escaparates o álbum de versões dos Czars, uma das mais sedutoras bandas da actualidade, ainda à espera do momento que transforme as suas potencialidades em algo mais visível (e merecido). Este não será, contudo, o disco mais indicado para tal campanha, fechado e introspectivo que é o programa que nos propõem, despindo à estrutura primordial uma série de canções, a maioria reduzida a diálogos para voz e guitarra. O álbum é interessante, mas raras são as ocasiões em que se ultrapassa a tom conivente com que nos habituámos a ouvir covers em pequenos bares. Excepções para as soberbas leituras de Song To The Siren de Tim Buckley ou a soberba transformação de Angeleyes, dos Abba, nas quais a voz quente de John Grant molda o que é de terceiros ao seu jeito peculiar de respirar as palavras, gerando pequenas pérolas irrepreensíveis.

Phoenix “It’s Never Been Like That”
Os quarto franceses (amigos dos Air, que isto de ter amigos pode ajudar) editam o sucessor do aclamado álbum de há dois anos que os colocou na mira do firmamento pop para gosto alternativo. It’s Never Been Like That é mais um disco de canções pop, feitas de luz e viço, agradáveis e sedutoras quanto baste, mas longe de esmagar a alma com entusiasmo, longe de nos fazer bradar por mais. Um bom esforço, cuidado na escrita e mais ainda na produção, mas onde o rasgo visionário não mora (ou não quer morar). Um belo disco para ouvir sob o calor do Verão de começa. Uma boa colecção de canções para o FM. E nada mais… Quando chegar o Outono vai estar arrumadinho no armário…

Ovo “Ovo”
Os singles com os quais se apresentaram há dois anos faziam-nos sonhar na viabilidade de mais uma carreira capaz do melhor em registo pop em língua portuguesa. O álbum que só agora editam está, contudo, valentes furos abaixo das expectativas. Não só não se encontra aqui uma única canção com a dinâmica pop do magnífico Ferrugem A Atacar (single de estreia), como parece que lançaram mais ideias que as necessárias num conjunto de canções de boa escrita (especialmente nas palavras, confirmando o talento e capacidade de observação e reflexão de Nuno Barreiro), mas de arranjos por vezes pouco entusiasmantes, nos quais a palavra contenção podia ter sido mais vezes conjugada. Há belos momentos, nomeadamente no soberbo Reprise En Main, no eficaz Não Conselho (potencial segundo single) e mesmo no single O Mundo É Já Aqui (que não será poupado a inevitáveis comparações com os Mesa, o que não é grave). Mas esperava-se mais. E melhor.

Também esta semana: Thievery Corporation, Zero 7, Fatboy Slim, Fadomorse, Seu Jorge, Mind Da Gap

Brevemente:
22 de Maio: Pet Shop Boys, Hot Chip, Boy Kill Boy, Futureheads, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Houdini Blues, Hugo Largo (reedição), Tom Verlaine
29 Maio: You Should Go Ahead, Expensive Soul, Clear Static, Radio 4, Frank Black, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Matthew Herbert, Can (reedições)

Discos novos ainda este ano: Woman In Panic, U-Clic, Every Move A Picture (Junho), Primal Scream (Junho), Muse, Lisa Germano (Julho), Whitest Boy Alive (Junho), Sonic Youth (Junho), Protocol (Verão), B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Divine Comedy, Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters (Outono), Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Jesus & Mary Chain, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição)


Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.

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