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Pode estar aí o ponto zero da criação de um projecto que se seguiu: a escrita e gravação de um ciclo de canções. Glass começou a conversar com David Byrne, com quem tinha já trabalhado nos Knee Plays, e a este juntaram-se rapidamente outros letristas como Paul Simon, Suzanne Vega e Laurie Anderson. Letras de vistas largas, desde reflexões sobre a natureza a visões românticas mais clássicas foram ponto de partida para a escrita, depois, da música. E aqui Glass foi ousado, abrindo o leque da simples projecção da lógica operática (visível em Changing Opinion, herdeira da cena 1 do primeiro acto de Satyagraha) à assimilação da new wave (em Lightning), do onirismo de Freezing (com o Kronos Quartet) à construção da obra-prima pop da sua carreira em Liquid Days. A terceira etapa, final, levou Glass e colaboradores a sessões de casting vocal, do qual apareceram nomes da pop à ópera, como Linda Rondstat, Bernard Fowler, Douglas Perry ou o grupo The Roches.
O álbum é um dos mais espantosos ciclos de canções de sempre. Uma clara e bem sucedida adaptação de uma linguagem nascida erudita a formas populares. Se, nas raízes do pensamento dos minimalistas americanos estava uma vontade de cruzar a música de arte ocidental com novos públicos, vastos e populares, aqui está a mais bem sucedida materialização dessa filosofia primordial.
Philip Glass, “Songs From Liquid Days” (CBS, 1986)
Se gostou, experimente ouvir:
Moondog: H’Art Songs, 1978
Philip Glass: Glassworks, 1982
Ute Lemper: Punishing Kiss, 2000