sábado, novembro 19, 2005

RETRO: Lou Reed, 1972

Em Agosto de 1970 depois de uma actuação no Max’s Kansas City, e a dias do lançamento do álbum Loaded, Lou Reed abandona os Velvet Underground. Inicia assim uma carreira a solo irregular, na qual fez nascer alguns álbuns fundamentais (do mítico Transformer ao mais recente e genial The Raven), cimentando em 35 anos de vida em nome próprio o estatuto de visionário rock que mereceu logo pela obra assinada antes, na banda que instalou definitivamente uma ideia de música alternativa em panorama pop/rock.
O primeiro disco a solo de Lou Reed foi editado não muitos meses depois, já em 1971, e foi em todos os planos uma desilusão. Desnorteado, recuperava essencialmente temas menores já ensaiados antes com os Velvet Underground, era pouco viçoso e em nada igualava os mesmos patamares de inventividade. O passo seguinte, contudo, mostraria Lou Reed novamente em forma, lançando definitivas bases para a afirmação de uma carreira que ainda hoje de si faz um dos mais venerados veteranos rock’n’roll. Ajudado por David Bowie, admirador confesso do sentido de dcadência e ambivalência dos Velvet Underground, e pelo seu guitarrista de então Mick Ronson, Lou Reed reinventou-se a si e ao seu som em Transformer. É certo que a luminosidade e teatralidade do glam rock ao jeito de Ziggy Stardust não assentavam bem nas canções de Reed, mas Bowie e Ronson, que produziram o disco, deram-lhe novo lustro, energia e alma, entusiasmando o roqueiro a escrever algumas das suas mais memoráveis canções de sempre, entre as quais os míticos Perfect Day, Walk On The Wild Side (com génese num velho pedido de adaptação a um musical do romance de 1956, com o mesmo título, de Nelson Algren, transformado depois numa visão sobre a Factory e a corte Warhol), Vicious ou Satellite Of Love. Lou Reed registou aqui cenas da vida e alma do outro lado de Nova Iorque, definindo retratos de uma época e de uma maneira de viver que aqui encontraram hinos de identificação. Ronson tocou guitarra em Vicious e Hangin’ Round e criou espantosos arranjos para Perfect Day, Walk On The Wild Side e Goodnight Ladies. Apesar de centrado num corpo e imagética rock’n’roll, Transformer vinca ainda as vivências de vistas mais largas que construíam já uma invulgar identidade compósita em Bowie. Essas marcas são sobretudo evidentes no discreto abraçar de heranças vaudevillescas em New Your Telephone Conversation. Transformer é também uma perfeita materialização do espírito warholiano através de um dos seus protegidos musicais, com filtro aplicado por um dos seus grandes admiradores deste lado do Atlântico. O tempo em que nasceu, o olhar maquilhado de Reed e a presença de Bowie rotularam Transformer como álbum glam rock. Porém, do glam rock o álbum herdou apenas um público que então descobriu Lou Reed e o adoptou, transformando-o numa estrela planetária. Um ano depois, no mais elaborado e sombrio Berlin, o músico seguia o seu caminho.

Se gostou, experimente:
Lou Reed “Berlin” (1973)
David Bowie “Diamond Dogs” (1974)
Morrissey “You Are The Quarry” (2004)


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