sábado, outubro 29, 2005

FOTOGRAMAS: O Acossado, 1959

Jean-Paul Belmondo contempla uma foto de Humphrey Bogart exposta na fachada de um cinema de Paris — o cigarro fumegante, o gesto de desenhar os seus próprios lábios, o ollhar fixo e indecifrável faziam parte de uma mitologia que o herói da primeira longa-metragem de Jean-Luc Godard assumia como o seu próprio património mitológico. Em boa verdade, a pose de Belmondo envolvia algo de muito mais vasto e, sobretudo, mais radical: Godard e os seus companheiros da Nouvelle Vague (François Truffaut, Eric Rohmer, Claude Chabrol, Jacques Rivette, etc.) começavam a materializar nos filmes uma visão transformadora do cinema e da sua história que se tinha consolidado através de um militante trabalho crítico, em particular nas páginas dos "Cahiers du Cinéma".
À Bout de Souffle é, assim, o filme de um par romanesco — ela é Jean Seberg, revelada ao mundo por Otto Preminger em Santa Joana (1957) e Bom Dia, Tristeza (1958) — que vive uma história em que já não é possível salvar o romantismo de outros tempos. Adoptando as novas câmaras ligeiras, filmando uma tragédia íntima como se estivesse a fazer uma reportagem, concebendo a montagem como uma luta (literal) contra o tempo, Godard abria as portas e os medos de um novo continente de expressão. Se o conceito de modernidade cinematográfica começa em algum lugar nomeável, é aqui.

À BOUT DE SOUFFLE / O Acossado
França, 1959

Realização: Jean-Luc Godard
Produção: Georges de Beauregard
Argumento: J.-L G., a partir de uma história de François Truffaut
Interpretação: Jean-Paul Belmondo, Jean Seberg

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