São de Seattle (no estado de Washington), mas têm nome com sabor mediterrânico. Os Hey Marseilles editaram o seu primeirio álbum há quase dois anos, mas voltam a chamar atenções com o teledisco, rodado por Hayley Young para o tema Rio (não é versão da faixa homónima dos Duran Duran, não senhor…). Uma canção luminosa, para dias quentes, na melhor tradição feita de diálogos entre a folk e a cultura pop/rock independente norte-americana. Aqui fica o teledisco.
quarta-feira, junho 30, 2010
Mais um 'Rio', em tempo de Verão
São de Seattle (no estado de Washington), mas têm nome com sabor mediterrânico. Os Hey Marseilles editaram o seu primeirio álbum há quase dois anos, mas voltam a chamar atenções com o teledisco, rodado por Hayley Young para o tema Rio (não é versão da faixa homónima dos Duran Duran, não senhor…). Uma canção luminosa, para dias quentes, na melhor tradição feita de diálogos entre a folk e a cultura pop/rock independente norte-americana. Aqui fica o teledisco.
Os amigos de Elijah
Novas edições:
The Chemical Brothers, Further
The Chemical Brothers
“Further”
Parlophone / EMI Music
2 / 5
Já com mais de década e meia de vida discográfica, os Chemical Brothers (juntamente com nomes como os Orbital, Orb ou Aphex Twin) ajudaram a apagar da prateleira das ideias feitas aquela que cantava que os projectos nas áreas da chamada música de dança se esgotavam num álbum, quando muito um segundo mais, e depois nada mais aconteceria… De resto, no seu álbum de 2007, We Are The Night, mostravam um dos seus melhores conjuntos de canções, num alinhamento que, de vistas largas, sublinhava contudo de forma clara de quem se estava a falar… Três anos depois procuram seguir outro rumo e em Further proõem, pela primeira vez, um álbum sem convidados, as curtas participações vocais ficando por conta da “casa”… Further, de resto, nem coloca a canção na agenda das suas preocupações centrais, seguindo antes um caminho (poderemos chamar-lhe “conceito”?) que se aproxima mais da sucessão de quadros, jogos de intensidade e sugestão que caracterizam a sua presença em palco. Na verdade, e escutado de fio a pavio, Further soa a banda sonora de qualquer coisa que, apenas no áudio não se vislumbra. Na edição limitada há um DVD que atribui uma materialização visual a esta música. Mas sem o palco ou os vídeos, o álbum acaba na verdade reduzido a uma caminhada por espaços que, salvo em ocasionais instantes, soam a mais do mesmo (e em menos interessante). Não há aqui um “momento” sirva o efeito de single (os dois já editados, Escape Velocity e Swoon passaram praticamente a leste das atenções)… Ou seja, brinda-se a tentativa de mudança na forma como desejaram pensar o disco. Mas não parece que a opção tenha seguido o melhor caminho, resultando no menos cativante título da obra do grupo.
Mahler, segundo Matthew Herbert
Reino Unido, século XXI (3)
A sequência de três imagem mostra, por esta ordem, Mondrian (lápis sobre papel, de 2006) de Alan Brooks, Lacuna (2010) de Nick Goss e Untiteled (2008) de Tasha Amini.
Mais imagens e informação sobre a exposição aqui
Johnny Depp em camaleão
terça-feira, junho 29, 2010
Em defesa de Cristiano Ronaldo
2. O que é espantoso nesta possibilidade de destruição mediática de uma imagem é o modo como assim se exprime a hipocrisia televisiva dominante. A Carlos Queiroz é atribuído o título de "intocável" mas, por muito menos, alguns líderes do nosso país — Pedro Santana Lopes e José Sócrates — foram e continuam a ser visados por mil e uma suspeitas e insinuações apenas porque alguém disse que... Em Portugal, faz-se mesmo "informação" e "política" na base de um diz-que-disse que ignora qualquer consistência deontológica no tratamento da pessoa humana.
3. Subitamente, temos apenas um jogador de futebol que tem um desabafo, impulsivo e frontal, sobre o trabalho obviamente falhado de alguém que é apenas um treinador de futebol e... grita-se ao escândalo: "O menino Cristiano Ronaldo portou-se mal!" Esperemos que venha rapidamente a sugestão lógica: já que o seleccionador nacional desfruta das graças mediáticas que Santana Lopes e Sócrates não tiveram ou não têm, promova-se Carlos Queiroz a primeiro-ministro — mesmo que isso hipoteque as relações diplomáticas com a Coreia do Norte.
Espanha - Portugal: o jornalismo da "frustração"
1. É relativamente fácil definir a trajectória desportiva da selecção portuguesa de futebol desde os tempos de Luiz Felipe Scolari. Que é como quem diz: uma equipa vulgar que perde, sistematicamente, nos momentos decisivos face às equipas com um mínimo de consistência. É uma equipa que se vê e deseja para empatar com uma selecção mediana, mas muito disciplinada, como a Costa do Marfim. É uma equipa que "esmaga" a Coreia do Norte, a mesma Coreia do Norte que, sem grande surpresa, teria a mesma sorte com uma equipa do meio da tabela do campeonato português. É uma equipa que, face a um Brasil em poupança de talento e esforço, consegue um "heróico" empate a zero. Enfim, é uma equipa que, em condições normais, perde com a Espanha — como perdeu.
2. Em boa verdade, para a selecção portuguesa, este foi apenas um Mundial normal. Claro que o futebol é um jogo de imprevistos e imponderáveis — factores decisivos para os seus delicados sabores — e imaginar Portugal como campeão do Mundo, mesmo que futebolisticamente insensato, era um delírio que a lógica não podia consumar, mas permitia. Resta saber se fazer jornalismo consiste em alimentar esse delírio como uma espécie de religião mediática que, em tudo e por tudo, dispensa o uso da inteligência de cada espectador.
3. O mesmo jornalismo que andou meses a alimentar a ideia (?) segundo a qual Portugal era um candidato "obrigatório" a campeão do Mundo mudou a agulha quando se ouviu o derradeiro apito do árbitro do Espanha-Portugal. Como? Lançando a palavra "frustração" para a arena da nossa mediocridade televisiva (e radiofónica). De repente, exigem-nos que vivamos a normalidade desportiva — a cruel perda de qualidades da selecção portuguesa desde a época Scolari — como se fosse uma tragédia nacional. São mesmo capazes de promoverem a indignação contra os cidadãos mais serenos que, com tristeza, apenas podem reconhecer que, por vezes, o normal acontece.
Super pop (e a cores)
Pulitzer para Jennifer Higdon
Novas edições:
Crystal Castles, Crystal Castles
“Crystal Castles”
Fiction / Universal
4 / 5
Quando uma banda com um percurso desenhado entre pragmatismos lo-fi e um certo gosto pelo ruído (até mesmo o caos) resolve “arrumar” a casa há sempre quem tema pelo pior, mas na verdade temos conhecido suficientes histórias de carreiras que, com inteligência, souberam dosear esse vontade de arrumação sem perder marcas de personalidade. Dos Animal Collective ao colectivo que hoje acompanha Ariel Pink, a “arrumação” acabou mesmo por nos conduzir aos seus melhores discos. E os canadianos Crystal Castles juntam agora o seu segundo álbum, ao qual voltaram a chamar, simplesmente, Crystal Castles, a essa lista de bem sucedidas operações de “arrumação”… Dois anos depois de um merecidamente elogiado álbum de estreia, a dupla canadiana propõe aqui um dos mais entusiasmantes discos feitos da relação das electrónicas com a canção que ouvimos este ano. Na verdade o que aqui se escuta resulta de um trabalho que, sem esquecer feitos anteriores, procura caminhar rumo a uma mais clara moldagem das ideias, por vezes enfrentando o formato da canção (como se escuta no espantoso Celestica) outras ensaiando mais claramente o tactear das dinâmicas da pista de dança (Baptism), não abdicando nunca de uma ideia cénica que assegura uma riqueza textural assombrada que se mantém bem presente. Chamado a co-produzir alguns dos temas, Jacknife Lee é importante contributo num disco que convoca ainda, embora via sample, contributos de Stina Nodenstam e Sigur Rós (a voz de Jonsi em Year Of Silence gerando um dos melhores momentos do disco). Curiosa é ainda a versão de Not In Love, canção dos hoje praticamente esquecidos Platinum Blonde, banda canadiana dos oitentas que, pela imagem (e não a música) chegou a ser comparada aos Duran Duran… Ao cabo de 14 temas, Crystal Castles é um disco que assinala de forma entusiasmante um novo capítulo na obra de uma banda que, sem perder o seu estatuto de aclamação indie, tem agora pela frente um mais vasto patamar de comunicação para outros públicos.
O mundo (como não o conhecíamos)
Foi apresentado, em Bergen (Noruega), um primeiro modelo do mapa gravítico do planeta que resulta do trabalho do satélite Goce (lançado em 2009). O mapa surgiu da recolha de leituras efectuadas em volta do globo, nas quais se registou a força com que a gravidade age sobre os corpos à superfície, ora passando pelas montanhas mais elevadas ou pelas fossas marinhas mais profundas. Um primeiro olhar localiza zonas de maior atracção gravítica (vermelhos e laranjas) sobre a Islândia e uma extensão oceânica a sul da ilha, acompanhando a crista média atlântica, igualmente elevadas sendo as leituras na região de ilhas do Pacífico a norte da Austrália. No sentido oposto, as zonas de menor atracção gravítica (azuis) localizam-se no Índico, a sul da Índia, nas estepes a norte dos Himalaias, na Antárctida e nas costas Este e Oeste da América do Norte e Central. Este mapa tem uma utilização prática em diversas áreas da ciência, entre elas a construção de modelos que estudem o comportamento dos oceanos e a evolução do clima.
Mais informação sobre a apresentação deste mapa gravítico e o satélite Goce aqui
Reino Unido, século XXI (2)
segunda-feira, junho 28, 2010
"Eu Sou o Amor": três hipóteses (3)
O filme Eu Sou o Amor, de Luca Guadagnino, situa os impulsos amorosos num quadro dramático — mais exactamente: melodramático — que funciona sempre como um desafio à consistência afectiva e simbólica dos laços de sangue. Daí que possamos formular uma hipótese familiar: não porque a família seja o saldo institucional que sempre redime o indivíduo (já basta da cretinice telenovelesca...), mas porque a teia familiar vive, e sobrevive, como um sistema de laços e contradições que nenhuma barreira consegue conter. Nesse sentido, o familiar não é uma paisagem estável, mas sim uma máquina de permanente produção de novas cumplicidades e clivagens, muito para além do que a tradição impõe. No limite, a familiaridade é também uma questão musical ou, se preferirem, que se diz por música. Sinal forte disso mesmo: o título Io Sono l'Amore provém da ária "La Mamma Morta", da ópera Andréa Chenier, de Umberto Giordano, tal como é ouvida — na interpretação de Maria Callas — por Tom Hanks e Denzel Washington numa cena de Filadélfia (1993), de Jonathan Demme, que a certa altura se imiscui na narrativa do filme de Guadagnino — vale a pena recordar a cena.
Cinema português: como sobreviver?
Para onde vai o cinema português? Eis uma velha e magoada pergunta que domina a conjuntura em que surge nas salas o novo filme de João Mário Grilo, Duas Mulheres [foto] — este texto foi publicado no Diário de Notícias (27 de Junho), com o título 'Histórias do nosso tempo português'.
O filme Duas Mulheres, de João Mário Grilo, chegou às salas num momento particularmente delicado para o cinema português, marcado, inclusive, por uma interrogação grave sobre as suas possibilidades de sobrevivência. Basta lembrar que a complexa conjuntura de crise levou o Governo a medidas drásticas (Decreto-Lei 72-A/2010), cativando 20 por cento das receitas do Instituto do Cinema e do Audiovisual [ICA] e cortando 10 por cento em todos os seus compromissos assumidos antes de 1 de Janeiro de 2010 (o que poderá ter consequências dramáticas, quer para projectos em marcha, quer para muitas empresas produtoras).
A agitação em que a profissão volta a estar envolvida (defendendo os seus legítimos interesses, não é isso que está em causa) contribui para que volte a passar para os espectadores comuns uma imagem simplista, porque meramente “financeira”, dos filmes que se fazem em Portugal. Não que isso apague a questão central. A saber: a continuada indiferença da maioria da classe política em relação à simples existência do cinema português. O certo é que aqueles espectadores são levados a encarar os filmes portugueses como uma coisa vaga (até porque muitos não vêem esses filmes) que se divide entre a “arte” que esbanja financiamentos e o “comércio” que dá dinheiro... Na prática, há que reconhecê-lo, tão grosseira visão continua a ser reforçada por discursos jornalísticos dependentes da moral grosseira dos blockbusters americanos (em boa verdade, ignorando até a excelência criativa do cinema dos EUA).
Tudo isto é tanto mais triste quanto Duas Mulheres contraria a ideia feita (mal feita, entenda-se) segundo a qual os filmes portugueses não sabem, ou não querem, abordar o nosso próprio presente. Bem pelo contrário: a história da relação de uma médica psiquiátrica (Beatriz Batarda) e uma “call girl” (Débora Monteiro) envolve referências que remetem para um tempo português em que reconhecemos temas que a actualidade nos impôs, desde a concentração de poder em alguns membros das classes mais abastadas até aos novos circuitos de comercialização do sexo.
Poderemos ter dúvidas sobre a construção dramática do filme. Poderemos até considerar que, por vezes, algumas personagens deixam de existir na sua singularidade para se perderem numa função “simbólica” que reduz a sua humanidade. Em todo o caso, isso não invalida o fundamental: Duas Mulheres desmente a noção corrente segundo a qual o cinema português não arrisca na relação com o país em que nasce e onde, bem ou mal (quase sempre mal), é publicitado, distribuído e exibido. A visão realmente grosseira, e hiper-poderosa, da sociedade portuguesa está noutro lugar: chama-se telenovela e já era tempo de alguém politicamente dizer que não é possível pensar o audiovisual português sem discutir as bases (económicas e mediáticas) do seu poder. Esperamos esse gesto político há cerca de 30 anos.
À sua maneira (a dele)
Of Montreal com disco em Setembro
Novas edições:
Scissor Sisters, Night Work
Scissor Sisters
“Night Work”
Polydor / Universal
4 / 5
Quatro anos depois de Ta-dah, os Scissor Sisters estão de regresso. E mostram, em Night Work, que a sua música (e portanto futura carreira) não vai viver fechada numa redoma feita de incessantes revisitações de mais do mesmo, mas antes está animada por um sentido de redescoberta e reinvenção que, sem evitar aquelas que são já as suas marcas de identidade, colocam agora pela frente uma entusiasmante mão cheia de novas canções. Night Work não teve parto simples. Na verdade, o grupo tinha já um álbum praticamente gravado quando, sentido que aquele não era o caminho, Jake Shears partiu de mala na mão para Berlim, aí acabando por encontrar um novo caminho. Convocou Stuart Price, que conhecia dos dias em que os Zoot Woman davam os primeiros passos, e apontou o foco da atenção ao que poderiam ser projecções no presente de ecos de memórias da vida nocturna que Nova Iorque chonhecera em finais dos anos 70 e inícios dos oitentas. Night Work é assim um álbum com alma nova-iorquina reencontrada na Berlim do presente. A essência do disco sound, que mora no código genético dos Scissor Sisters, aceita aqui novas revelações que levam a música rumo a outros horizontes. Mais electrónico, menos evocativo dos ecos festivos à la setentas (que haviam dominado a caracterização de grande parte dos hinos lançados no álbum de estreia), Night Work soma a visão pop dos Scissor Sisters aos métodos da dança que Stuart Price domina. Do poderoso tema-título (a pedir edição em single) que abre o alinhamento ao magnífico epílogo em Invisible Light, onde colabora a voz de Ian McKellan, Night Work é um seguro manifesto de uma banda que, ao terceiro álbum assim garante que não esgotou o baú das ideias. Temas como Something Like This, Running Out ou Skin This Cat mostram, de resto, que nunca antes o grupo alargou tanto os seus horizontes de possibilidades. Sejam bem regressados.
Reino Unido, século XXI (1)
Ao longo desta semana vão passar por aqui algumas imagens desta exposição. A abrir o post, uma das salas no piso térreo da Saatchi Gallery, com Pink Cher (2008), de Scott King (n. 1969) em evidência.
Neste conjunto de imagens, Politics (de 2005) e Diplomacy (2009), de Lynette Yadom Boakye (n. 1977) e The Losers (2008), de Edward Kay (n. 1980).
Mais imagens e informação sobre a exposição aqui
A "arte" da 'reality TV'
O modelo do concurso Project Runaway está, pelos vistos, a criar descendência. Apresentado pela Bravo TV, Work Of Art: The Next Great Artist é um novo concurso (criado pela mesma equipa), com alguma afinidade com o que há já alguns anos revela talentos na área do corte e costura, em vez de designers de moda trabalhando com artistas plásticos, propondo como prémio final uma exposição em Nova Iorque e 80 mil euros. Entre os concorrentes estão artistas figurativos e conceptuais, dos desafios finais resultando, como manda a regra, o apuramento de todos menos um, que sai ao som da frase “your work of art didn’t work for us”… O concurso já está a ser transmitido nos EUA, contando o júri com um crítico de arte e uma galerista como elementos fixos e com um conhecido leiloeiro de arte contemporânea como “Tim Gunn” de serviço…
Site oficial do concurso aqui
domingo, junho 27, 2010
Alex S. Kliszynski: o corpo pós-digital
Um corpo pós-moderno, debatendo-se com a teatralidade das suas heranças, reencontrando através do seu próprio desgaste simbólico a herança imensa do inconsciente freudiano?
Sim, por certo. Mas talvez tenha chegado o tempo de falarmos de um corpo pós-digital, nascido no labirinto instável de uma nostalgia carnal reconvertida aos perigos e delícias do novo continente (negro?) da tecnologia digital e da sua gélida contaminação dos sexos. Ou alguém duvida que Matrix era o filme de um novo erotismo, de solidão ainda mais cruel?
Formado na Cambridge School of Art, Alex S. Kliszynski é um espantoso artista inglês que nos ajuda a lidar com tão agreste conjuntura, oferecendo-nos corpos "híbridos" que, se outros efeitos não desencadeassem, nos ajudariam, pelo menos, a reagir contra os mais violentos e naturalizados clichés de representação do masculino e do feminino — nas suas próprias palavras: O essencial do meu trabalho é um conjunto de bonecos-humanos que tentam levantar questões sobre as numerosas imagens do corpo 'objectificado' e idealizado que vemos nos mass media.
Em jogo está não apenas o carácter ambivalente de qualquer identidade sexual, mas também uma reconfiguração do conceito de qualquer olhar. São fotografias que reunem o gesto infantil da edificação de um mundo imaginário e a hipotética celebração abstracta desse mundo. Impelem-nos para a difícil reconversão da palavra beleza, o que, num mundo de quotidiana celebração de tantas formas de fealdade, não é pouco.
"Scary monsters and super creeps"
>>> Site oficial de Ray Harryhausen.
Histórias da música portuguesa
De regresso a 'Let It Be'
'Let It Be... Naked' (álbum), 2003
Mais de 30 anos depois da sua edição original, o álbum Let It Be conheceu uma intervenção que assim colocou em cena uma visão diferente da que, na altura, fora produzida por Phil Spector. Desde sempre crítico da forma como o produtor tinha dado forma final às canções, foi Paul McCartney quem dirigiu este reencontro com as fitas originalmente gravadas em inícios de 1969. A partir das gravações que, então, se teriam destinado a um álbum que chegou para ter por título Get Back (mas acabou depois abandonado) Paul Mccartney e uma equipa de técnicos de Abbey Road reconstruiram o disco a partir das fitas (incluindo as que documentam o histórico concerto no telhado da sede da Apple) em arquivo, procurando assim um outro ponto de vista. Let It Be… Naked muda inclusivamente a ordem do alinhamento e troca Maggie Mae e Dig it por Don’t Let Me Down, acrescentando ainda, num disco extra, sob o título Fly On The Wall, um conjunto dfe excertos de canções e diálogos, recordando assim o ambiente de trabalho do grupo. O disco conheceu reacções longe de unânimes, entre aplausos e críticas menos entusiasmadas. Nas vendas, atingiu o número cinco nos EUA e o número sete no Reino Unido.
Kylie Minogue: corpo a corpo
sábado, junho 26, 2010
Saramago e Antonioni
O aparato em torno da chegada da urna de José Saramago a Lisboa constituiu mais um episódio da corrente pornografia televisiva, com a frieza dos factos transformada em apoteose do mais histérico vazio “informativo”. Imagens da espera (?) do avião, repórteres ansiosos, discursos saturados de lugares-comuns, perguntas ridículas aos “populares”... Num universo em que a cultura literária está quotidianamente atrofiada, pairava uma nuvem de hipocrisia muito humana. Demasiado humana.
Neste contexto, é arrepiante observar como há toda uma geração de jovens repórteres formados numa escola de sensacionalismo “jornalístico” que todos os dias reduzem tudo o que é diferença ou contradição a uma única lei: a do conflito maniqueísta. À saída da sessão solene na Câmara Municipal, não faltou sequer uma voz feminina para questionar Jerónimo de Sousa sobre a possibilidade de a bandeira do Partido Comunista ir ou não acompanhar a urna de Saramago. Reflexão sobre a trágica herança, factual e simbólica, do comunismo no século XX? Nada disso. Não há tempo para reflectir. Apenas a insinuação pueril da possibilidade de uma “polémica” em torno do papel oficial da bandeira de Portugal (o inquirido, honra lhe seja feita, teve a lucidez de sublinhar que se tratava de uma homenagem do país e que, por isso mesmo, prevalecia o uso da bandeira nacional).
Que se passa na cabeça destes repórteres que não têm gosto em olhar nem escutar e vão para a rua apenas à procura de agitações mais ou menos anedóticas e interlocutores que possam “entalar” com as suas perguntas? Será que, meio século depois, não conhecem os filmes com que Michelangelo Antonioni (A Aventura, A Noite, O Eclipse, etc.) nos ensinou a lidar com a incongruência do mundo e, muitas vezes, o seu vazio de significações? Encontramos, aliás, o mesmo determinismo no futebol: esta semana, algures, um comentador dizia que um golo resultante de um remate desviado por um defesa tinha sido um belo golo porque... “merecia entrar”. E se não “merecesse”? Repetia-se o jogo? Já nem nos deixam apreciar os paradoxos e maravilhas do futebol.
Reinventar os Tom Tom Club
Chicks On Speed
'Wordy rappinghood' (2004)
E hoje há arraial
Mais informação aqui
E agora só os números um
'1' (compilação), 2000
Para assinalar o 30º aniversário da separação da banda, uma nova antologia foi apresentada, explorando um conceito centrado na popularidade atingida pelas canções. Em concreto, 1 junta singles que atingiram um número um nas tabelas de vendas de singles no Reino Unido e EUA, num alinhamento que parte de Love Me Do (foi primeiro lugar nos EUA) e termina em The Long and Winding Road. Com uma capa desenhada por Rick Ward, 1 foi um dos maiores êxitos de vendas na obra “recente” dos Beatles, ultrapassando os 31 milhões de unidades vendidas.
O smoking de Carlos Queiroz
sexta-feira, junho 25, 2010
A morte, provavelmente
É bem verdade que, muito por culpa da miséria televisiva que nos rodeia, passámos a comemorar efemérides por tudo e por nada. Como se a celebração automática das datas nos pusesse em contacto com uma essência intocada pelas atribulações do tempo que passa. Afinal de contas, essa “transcendência” pitoresca faz parte da paisagem quotidiana e as festas impostas pelo calendário cumprem a missão piedosa de nos alhear de uma das nossas maiores tragédias existenciais: a de vivermos numa cultura que promove a proliferação festiva de memórias, mas favorece a indiferenciação do esquecimento.
Há, por isso, uma ironia inevitável (e inevitavelmente saborosa) quando nos mobilizamos para assinalar... o primeiro ano da morte de Michael Jackson! E é pena que os detractores oficiais tenham desaparecido de cena, infelizmente confirmando a pacata mediocridade dos seus pontos de vista sobre o criador de Thriller. De facto, os muitos discursos moralistas (se é que o puro insulto tem alguma moral) sobre a identidade “falsa” de Jackson, nomeadamente sobre a cor da sua pele, nunca conseguiram entender que a vulnerabilidade física e simbólica foi uma componente essencial do seu labor.
Há ainda outra maneira de dizer isso mesmo: Jackson é um dos criadores contemporâneos por cuja obra perpassa uma energia vital que, numa lógica de perversas contaminações, não se opõe à nitidez branca da morte (e que a brancura se confunda, aqui, com a nitidez, eis o que, por certo, é esclarecedor sobre este nosso lugar em que o evocamos). No limite, a morte não passa de um gimmick das paisagens criativas de Jackson, um abismo sem nome alegremente convocado em nome do espectáculo e dos seus valores comunitários. Há muitas décadas que isso tem um nome: cultura pop. E como ele fez questão em cantar, pode ser preta ou branca. É igual.
Aventuras num estúdio de TV
Um encontro (cortesia Converse)
Reedições:
Buggles, Adventures In Modern Recording
Buggles
“Adventures In Modern Recording”
ZTT Records
3 / 5
Trevor Horn é hoje um reconhecido produtor, com currículo que passa por trabalhos ao lado de importantes discos de nomes como, por exemplo, os Frankie Goes To Hollywood, Grace Jones, Belle & Sebastian ou os Pet Shop Boys, pela sua história passando ainda a bem sucedida (nos oitentas, sublinhe-se) aventura da ZTT Records, editora que co-fundou e através da qual aprofundou uma muito pessoal visão pop. Porém, antes de se afirmar como um dos mais conhecidos estrategas pop frente a uma mesa de gravação e mistura, Trvor Horn começou o seu percurso como um peão. Em finais de 70 era músico de estúdio ao serviço de Tina Charles. Mas em 1979, ao juntar-se ao telclista Geoff Downes assinava uma canção, com características quase de oráculo, que adivinhou os caminhos que a música pop tomaria nos oitentas. A canção de que se fala era nada mesnos que Video Killed The Radio Star, single de estreia dos Buggles, banda que em 1980 apresentava um álbum que juntava uma ideia pop electrónica a uma cenografia que não escondia algum interesse por ecos do sinfonismo prog dos setentas… The Age Of Plastic é um “clássico” pop do seu tempo. Mas, na verdade, não é episódio único na carreira dos Buggles. O grupo editou em 1982 um segundo disco, na verdade praticamente uma aventura a solo de Trevor Horn (que entretanto integrara a formação dos Yes), uma vez que o teclista Geoff Downes se afasta, antes mesmo de iniciadas as gravações, para formar os Asia. Ao leme, e por conta própria, Horn levou ao álbum uma canção que já tinham pronta (I Am A Camera, sem dúvida a melhor do segundo álbum) e juntou ideias nas quais tinha vindo a trabalhar… Adventures In Modern Recording (editado pela independente francesa Carrere, uma editora com nome essencialmente feito com o disco sound) é essencialmente, e mais que uma evolução directa de The Age Of Plastic, uma continuação do que o (mais consistente) álbum de estreia havia mostrado em 1980. Temas como Vermillion Sands ou Rainbow Warrior seguem a linha electrónica com aromas prog de um Astroboy, Lenny revisita os ecos rock (devidamente filtrados) de um Clean Clean, a mais ostensiva aventura rumo a horizontes mais distantes do som do álbum de estreia apresentando-se em On TV, tema pouco inspirado de alma electro que acabaria editado como single (sem resultados visíveis). Longe da relevância de The Age Of Plastic, o segundo álbum dos Buggles não mais fez senão arrumar essa etapa na vida e obra de Trevor Horn, um ano depois o músico apresentando-se a bordo da ZTT Records lançando os Frankie Goes To Hollywood, The Art of Noise e logo depois Propaganda e Slave To The Rhythm, de Grace Jones. A presente reedição permite contudo revisitar este episódio “perdido” na sua história pessoal. E junta ao alinhamento original dois lados B, a versão máxi de I Am A Camera e sete maquetes como extras.
Em conversa: The Drums (3)
Continuamos a publicação de uma entrevista com Jason Pierce, vocalista dos The Drums, que serviu de base ao artigo ‘O som do Verão de 2010 passa por aqui’, publicada na edição de 5 de Junho do DN Gente.
Acham que a vossa música atingiu já características de identidade que vos distingam de outras bandas do presente?
Há quem o diga. Mas acho que a questão do género é um tanto secundária face ao que é a canção. O nosso som veio daquela nossa opção em passar a trabalhar com guitarras e de usar um microfone que custou 30 dólares. E fizemos um disco assim...
O que gostariam fazer com o poder que a música agora vos dá?
O que queremos é mesmo, e apenas, fazer canções. E depois poder ajudar outras bandas em que acreditamos a poder fazer o mesmo..
E como vão ajudar outras bandas? Convidando-as a tocar nos vossos concertos?
Sim, já o estamos a fazer. Os Surfer Blood são um caso. Apareceram-nos um dia a dizer que os tinhamos inspirado a fazer a banda. Têm estado a tocar connosco. Gostava de poder fazer isto com mais bandas...
Parece tudo um sonho... E no meio disto onde anda a realidade?
Nem tudo são rosas, eu sei. Temos tido muita sorte com o que tem acontecido com a banda, mas temos de ter também em conta o lado mais pessoal das coisas. De resto em miúdo tive uma vida bem menos risonha. A minha vida foi mais assim... De resto nada assim me tinha acontecido antes de formar a banda, passava a vida cheio de problemas...
E levaram algumas dessas memórias desses problemas para as canções…
Book of Stories fala disto. Mas a nossa música é mais alegre que por vezes aquilo de que as canções falam.
Sugerindo um pouco de luminosidade em tempo de crise...
Ao longo da história a grande arte, a grande música, sempre nasceram de grandes momentos difíceis e de luta. Os tempos difíceis estimulam a criatividade. Tem de se lutar pelo que se não tem. As coisas tendem a acontecer assim. E depois é també um pouco como aconteceu comigo quando descobri a música dos Smiths e reparei que havia alguém neste mundo que era tão infeliz como eu! E isso foi reconfortante. Era infeliz, mas não estava só. E espero conseguir o mesmo com a música que fazemos.