quarta-feira, dezembro 11, 2024

Um balanço do ano
* SOUND+VISION Magazine [FNAC, dia 14]

Não "o" balanço do ano, antes "um" balanço do ano. Ou seja, em vez de um top, propomos a (re)descoberta de algumas referências marcantes, não necessariamente as mais faladas (ou mais visíveis), que ficam das imagens e sons de 2024 — exemplo, na imagem: o filme Guerra Civil, de Alex Garland.

>>> FNAC Chiado - 14 dez. 17h00.

terça-feira, dezembro 10, 2024

A IMAGEM: Hussein Malla, 2024

HUSSEIN MALLA
Palácio presidencial, Damasco [08 dezembro]
***
"Era daqui que Assad nos observava",
Arthur Sarradin / Libération [09 dezembro]


sábado, dezembro 07, 2024

História de um moço de recados


>>> Apocalypse Now (1979).

#SeAcabó
— o futebol como poderoso fenómeno cultural

O "Caso Rubiales" foi muito mais do que um banal "incidente" futebolístico

O chamado “Caso Rubiales” surge agora no filme #SeAcabó: O Beijo que Mudou o Futebol Espanhol, um documentário produzido e difundido pela Netflix. É importante ver e pensar o jogo para lá da aceleração quotidiana das notícias — este texto foi publicado no Diário de Notícias (7 novembro).

Eis uma boa notícia. Por uma vez, através do filme #SeAcabó: O Beijo que Mudou o Futebol Espanhol (produzido e difundido pela Netflix), há uma proposta mediática capaz de gerar uma reflexão sobre a dimensão realmente cultural do futebol. Entenda-se: sobre o futebol como fenómeno que transporta, consolida e transfigura valores que são transversais a todo o tecido social.
Foi preciso um facto extremo, realmente fracturante, para que tal acontecesse: o chamado “Caso Rubiales”. A saber: no dia 20 de agosto de 2023, nas celebrações da vitória da Espanha no Mundial Feminino de Futebol, Luis Rubiales, presidente da Real Federação Espanhola de Futebol, beijou na boca a jogadora Jenni Hermoso numa atitude, no mínimo, desrespeitadora. Mais do que isso: como mostra o filme realizado por Joanna Pardos, tal atitude não pode ser desligada de um sistema de relações com as jogadoras enraizado em mecanismos de regular instrumentalização emocional e rebaixamento moral.
Evitemos, por isso, relançar as histerias “militantes” que, na altura, foram promovidas por alguns discursos mediáticos, sobretudo de natureza televisiva. Não se trata de apelar a generalizações gratuitas sobre a condição masculina (ou feminina), como se o comportamento abusivo de um homem implicasse automaticamente “todos” os homens, obrigando cada um deles a demonstrar que não é um abusador de mulheres.
O filme de Joanna Pardos distingue-se por uma postura realmente pedagógica, não cedendo às facilidades com que se inventam “temas” polémicos apenas para instalar uma gritaria social que, em poucos dias, é descartada… sendo rapidamente substituída por uma nova barulheira concebida de forma igualmente gratuita e sensacionalista. O que está em jogo não se esgota no carácter irresponsável ou maligno de um homem, sendo exposto e analisado como um conjunto de regras (ou da falta delas) que contaminam (ou contaminaram) toda a organização do futebol feminino em Espanha.
Deparamos com uma visão que evita a facilidade, não só descritiva, mas moral, de tratar o “Caso Rubiales” como uma espécie de “prós & contras” da dupla Hermoso/Rubiales. Através dos depoimentos de várias jogadoras — e também da análise do tratamento noticioso do caso —, o filme expõe a perversa teia de comportamentos que permite perceber o “episódio do beijo” como mais, muito mais, do que um incidente descartável. Esta é também a história do nascimento do #SeAcabó, movimento que abalou a sociedade espanhola muito para lá do universo específico do futebol.

Parar para pensar

Daí que sejamos levados a reflectir sobre as regras de qualquer abordagem deste teor: não há um universo “específico” do futebol. Pensar o futebol (feminino ou masculino) como uma “ilha” temática será uma maneira de recalcar o seu imenso poder simbólico e económico, numa palavra, cultural — e isto em qualquer contexto social, incluindo o português.
A conjuntura retratada por #SeAcabó: O Beijo que Mudou o Futebol Espanhol é tanto mais significativa quanto a sua análise implica também um desafio ao próprio trabalho crítico. A pergunta é esta: como lidar com filmes que, de alguma maneira, retomam aquilo que já foi matéria de destaque no interior da aceleração informativa em que vivemos (ou somos obrigados a viver)?
A metódica realização de Joanna Pardos é eloquente. Trata-se de revisitar imagens que passaram pelo dia a dia das notícias, recusando agora a velocidade anedótica com que, por vezes, foram tratadas. Aquietar a vertigem pueril do olhar, parar para pensar, recusar transformar cada notícia em pretexto para um obsceno “tribunal popular” — eis algumas hipóteses clássicas do documentarismo cinematográfico cujo valor permanece intacto.

Autre Ne Veut
* Love, Guess Who​?​? (2024)

quarta-feira, dezembro 04, 2024

Portugalex inaugura presépio...

Lembremos a ficha: os textos são de Patrícia Castanheira, as vozes de António Machado e Manuel Marques. Dito de outro modo: que seria de nós sem o Portugalex? Como seria possível resistir à violência da estupidez lusitana (que falta Sena nos faz) sem termos o simples, mas tão raro, conforto da inteligência?
Satisfazendo a riqueza das nossas tradições, hoje é dia de inauguração do presépio...
 

domingo, dezembro 01, 2024

Roxy Music, 50 anos depois

[Eveline Grunwald e Constanze Karoli fotografadas por Eric Boman]

Há nos Roxy Music uma perene ambiguidade, algures entre a lógica programática de uma música de sofisticada ordenação e o pressentimento de uma primitiva desordem libidinal — a primeira sublinhando o seu classicismo, a segunda sinalizando uma rebeldia perversamente aristocrática.
Exemplo maior será o álbum Country Life (o título tem logo qualquer coisa de paródica sugestão civilizacional), lançado há 50 anos — celebremos o aniversário escutando (e lendo) Triptych.
 
[Eveline Grunwald e Constanze Karoli fotografadas por Eric Boman]

A Substância
— a mulher que não veio do outro mundo

Margaret Qualley sujeitando-se aos efeitos (pouco) especiais

As fábulas sobre os corpos humanos que adquirem formas monstruosas definem uma tradição que o filme A Substância tenta relançar. Infelizmente, o seu simplismo narrativo não ajuda… mas ganhou o prémio de argumento em Cannes — este texto foi publicado no Diário de Notícias (31 outubro).

Recentemente chegado aos ecrãs portugueses, o filme A Substância, coprodução França/Reino Unido/EUA com argumento e realização da francesa Coralie Fargeat, foi um dos chamados “acontecimentos mediáticos” do último Festival de Cannes. Isto porque há sempre sectores da imprensa internacional, com inevitável destaque para algumas vozes em língua inglesa, disponíveis para encontrar e celebrar o “filme-choque” de cada festival.
A saga de Elisabeth Sparkle, aos 50 anos despedida do seu programa de televisão, começa por ser uma história que avança com a elegância de um elefante numa loja de porcelanas… A sua transformação numa personagem “alternativa”, mais nova e atraente, graças a uma droga do mercado negro (a “substância” que o título refere), está quase por inteiro condensada nos dois minutos do trailer. Seja como for, isso não impediu o júri oficial, presidido pela realizadora de Barbie, Greta Gerwig, de lhe entregar o prémio de melhor argumento — registe-se, a propósito, que os filmes escritos e dirigidos por Francis Ford Coppola (Megalopolis), Paul Schrader (Oh Canada) e David Cronenberg (The Shrouds) saíram da Côte d’Azur sem qualquer distinção…
Acontece que A Substância se vai esgotando em variações banais sobre uma questão temática e figurativa — a decomposição do corpo humano em formas monstruosas — cujo assombramento se renovou, evoluindo tecnicamente, com dois filmes admiráveis do começo da década de 80: Um Lobisomem Americano em Londres (1981), de John Landis, e The Thing/Veio do Outro Mundo (1982), de John Carpenter.
Escusado será dizer que a passagem de Sparkle a uma nova encarnação, de nome Sue, não corre nada bem: os erros na aplicação da droga vão gerando uma parada de transfigurações monstruosas… Aquilo que alimentava fábulas tocadas pela irrisão da comédia (Landis) ou pela inquietação da tragédia (Carpenter) fica reduzido, no tratamento de Fargeat, a uma histeria visual próxima do sistema de redundâncias de muitas formas publicitárias.
A ânsia de Sparkle “renascer” através de um novo corpo, dando origem a Sue, surge tratada como uma performance, no sentido mais esquemático que a palavra pode envolver. É esse, aliás, um vício generalizado de muitos filmes contemporâneos que usam e abusam do cinema como um banal instrumento de “criação” de imagens susceptíveis de integrar o fluxo de “efeitos-choque” que passou a contaminar muitas formas mediáticas (incluindo, infelizmente, o jornalismo que vive da fabricação de simulacros de “polémica” e “escândalo”). Que podem as actrizes face a tudo isto? Muito pouco. Demi Moore e Margaret Qualley, respectivamente como Sparkle e Sue, bem se esforçam, mas este tipo de cinema nasce de um pecado sem remissão. A saber: encarar os intérpretes como meros suportes de alguma agitação visual.

quinta-feira, novembro 28, 2024

Energia Nuclear Já!
— a urgência de uma discussão

Marie Curie, evocada por Oliver Stone

Não é todos os dias que uma distribuidora cinematográfica se empenha na criação de condições para que um filme ligado a uma temática actual, social e politicamente urgente, possa ser visto (também) pelos espectadores mais jovens. Acontece agora com Energia Nuclear Já!, documentário de Oliver Stone revelado no Festival de Veneza (extra-competição): a Zero em Comportamento anunciou que, a par da exibição normal, estabeleceu acordos com as principais cadeias de cinema no sentido de criar condições para sessões especiais visando os alunos do ensino secundário.
Assumindo-se como narrador, Stone expõe a sua defesa da energia nuclear como alternativa para combater as alterações climáticas, recordando a vertiginosa evolução que vai desde as experiências de Marie Curie com a radioactividade até à vanguarda das investigações contemporâneas. Não se trata de um banal “prós & contras” para alimentar algumas histerias televisivas, antes de um genuíno labor de investigação que sublinha a urgência de uma discussão que envolve o futuro de todos os seres humanos.

sábado, novembro 23, 2024

Kim Deal, Opus 1

É mesmo uma estreia: aos 63 anos, Kim Deal, uma brilhante "ex-" de várias bandas indie (Pixies, The Breeders, The Amps), lança Nobody Loves You More, o seu primeiro álbum a solo. É uma coleção breve (pouco mais de meia hora...) de 11 canções capazes de conciliar uma multifacetada sofisticação musical com o fôlego discreto da mais pura intimidade — o tema-título apresenta-se num belo teledisco realizado por Alex Da Corte.