Passaram quase quatro anos (e alguns EPs) desde a edição de
He Poos Clouds, o segundo álbum que
Owen Pallett editou sob a designação Final Fantasy e que, para todos os efeitos, é ainda a sua obra de referência. Reflexo de um período na sua vida em que escutava quartetos de cordas e reflectia sobre as canções de Schumann, esse álbum de 2006 surgia assim como uma expressão actual daquilo em tempos definia os “ciclos” de canções… Quase quatro anos depois, e após ter voluntariamente abandonado a designação Final Fantasy (à conta do que poderia ter sido um confronto com a marca que detém os videojogos com esse nome e que assim acabou sem “caso” a relatar), Owen Pallett vê a sua música a caminhar rumo a novo patamar, procurando agora o aprofundar de personalidade e referências no âmago da cultura pop… O músico, que nos últimos dois anos assinou arranjos para discis de figuras que vão dos Per Shop Boys e Last Shadow Puppets a Mountain Goats, escutava essencialmente pop electrónica (OMD e afins, em concreto) quando trabalhou as canções que agora revela em
Heartland. E, apesar de manter firme um mesmo método de composição e de recorrer ao trabalho com orquestra, estas novas canções reflectem essa mesma vivência pop. Depois do experimentar de terrenos de
Has A Good Home (2005) e das visões mais complexas e desafiantes ensaiadas em 2006 em
He Poos Clouds, o novo
Heartland é agora o seu grande álbum pop. É um disco de requintada gastronomia de formas e ideias, que na voz frágil e delicada conhece um protagonista que talha cenários e quadros feitos à medida das suas características. E é ainda um álbum feito de grandes canções que, mesmo sem a identidade transversal que acabava por unir o alinhamento de
He Poos Clouds, falam em conjunto sob um tecto comum. Como em qualquer grande álbum pop.
Owen Pallett
“Heartland”Domino / Edel
4 / 5Para ouvir:
MySpace
Poucos deram por eles quando, em 2006 se apresentaram com um primeiro álbum. Dois anos depois, o delicioso
Devotion levou-os um pouco mais longe, cativando novos admiradores. E agora, que editam um terceiro álbum, os
Beach House são a banda de que se fala em terreno
indie (não fossem os Vampire Weekend, seriam “a” banda que mais teria marcado a entrada em cena de 2010).
Teen Dream tem, contudo, argumentos suficientes para ser daqueles raros discos capazes de sobreviver a um ano que vai conhecer muitas mais edições de relevo. É um álbum de espantosas canções, todavia sem a necessidade de convocar uma agenda de grande novidade na sua abordagem à composição, uma vez que o duo pouco parece querer ir, por enquanto, além dos espaços que já visitara por ocasião do anterior
Devotion, apostando antes no aprofundar de uma relação com o trabalho cénico e nas qualidades do som. Gravado num estúdio montado no espaço de uma igreja,
Teen Dream segue as pistas antes conhecidas numa música que vive entre várias heranças (da pop luxuriante de uns Zombies ou do carácter dramático de uma Nico aos caminhos
indie de finais de 80 e os domínios da canção magoada ao jeito de uns Mazzy Star), cruzando com invulgar capacidade marcas de luz num quadro a que não é estranha a melancolia que, de facto, circula entre as canções. O som do órgão, a voz de Victoria Legradnd e um sentido de espaço que envolve as canções demarcam já uma linguagem. E
Teen Dream tem tudo para ser um dos “casos “ do ano.
Beach House
“Teen Dream”Bella Union / Popstock
4 / 5
Para ouvir:
MySpace
Já são sete os anos sem a edição de um álbum com inéditos de
David Bowie. O que não quer dizer que tenham sido sete anos sem edições novas do músico. Na verdade, entre reedições com extras, discos ao vivo e antologias, a agenda editorial tem mantido com alguma regularidade o seu nome na agenda dos novos lançamentos. Todavia, de realmente “novo” pouco tem aparecido… E
A Reality Tour, o álbum ao vivo que acaba de ser editado mais não nos apresenta senão um retrato da digressão que Bowie levava à estrada quando, em meados de 2004 foi submetido a uma cirurgia de urgência que não só amputou a digressão das suas datas finais (uma delas no Porto) como desde então o afastou dos palcos salvo em pontuais colaborações em concertos (como aconteceu ao lado dos Arcade Fire em Nova Iorque ou David Gilmour em Londres). Resultado de gravações no Point Theatre, em Dublin, em Novembro de 2003, o álbum duplo agora editado corresponde ao mesmo material já conhecido da edição em DVD de há seis anos, com três temas como extras… A gravação traduz o trabalho de uma sólida banda de palco, num alinhamento que toma o soberbo
Heathen e o mediano
Reality como protagonistas, com espaço também para incursões pelo passado mais remoto. É uma peça interessante para admiradores e coleccionadores. Mas convenhamos que, além de representar um registo áudio da sua última digressão, não traz argumentos que justifiquem muito mais atenções.
David Bowie
“A Reality Tour”ISO/Sony Music
3 / 5Para saber mais:
site oficial
É impossível evocar a história dos grandes discos dos anos 90 sem evocar pelo menos um álbum dos
Tindersticks (naturalmente o primeiro, o segundo não lhe ficando na verdade muito atrás). A década dos zeros viu contudo o grupo a perder gradualmente a sua vitalidade, repetindo cada disco formas e soluções em colecções de canções progressivamente menos interessantes, a carreira a solo de Stuart Staples, a dada altura, parecendo conceder cada vez menos espaço a um efectivo repensar de ideias… Dois anos depois de
The Hungry Saw, os Tindersticks mostram agora em
Falling Down From The Mountain aquele que talvez seja o seu melhor disco desde finais dos anos 90. O álbum, que representa a estreia do grupo na 4AD, não se limita a traduzir um entusiasmo reencontrado (talvez em parte fruto de mudanças na formação do grupo), como mostra uma abertura de horizontes da qual nasce espaço para ideias que vão da toada
jazzy e contemplativa do extenso (e cativante) tema título ao sinfonismo de
Piano Music, o instrumental que fecha uma série de novos temas onde não faltam as já conhecidas referências de sempre, todavia em canções que vão além de uma mera repetição de fórmulas, pontualmente revelando mesmo alguma luminosidade onde outrora pouco mais havia que sombras… Uma boa surpresa, portanto.
Tindersticks
“Falling Down From a Mountain”4AD / Popstock
3 / 5Para ouvir:
MySpace
O maior problema que hoje Stephin Merritt carrega nos seus ombros é a expectativa que se gera a cada novo álbum dos seus
Magnetic Fields que é anunciado. Os primeiros discos eram pequenos rebuçados feitos de grandes acontecimentos pop onde se cruzavam electrónicas, aventuras
folk, piscadelas de olho à música de palco, em clima desenhado por um certo apelo
lo-fi. O mítico álbum triplo
69 Love Songs, editado em 1999, elevou esta soma de ideias a um patamar de excelência, que todavia não mais se repetiu. Mais que os anteriores
I e
Distortion (discos respectivamente de 2004 e 2008, que deixaram de lado os sintetizadores em busca de outras ferramentas), o novo
Realism é de todos os discos pós-
69 Love Songs o que mais se aproxima desse paradigma na diversidade de sugestões, embora as canções revelem uma série de novas composições em regime mais do mesmo. Há na verdade uma diferença abissal entre este e esse outro mítico álbum de 1999: à excepção da faixa de abertura,
Realism revela um lote de novas canções alguns furos abaixo do que aqui seria de esperar.
Magnetic Fields
“Realism”Nonesuch / Warner
3 / 5Para ouvir:
MySpace
Também esta semana:Laura Veirs, Charlotte Gainsbourg, Kanye West (Storytellers), RJD2, Spoon, Georgie Fame (best of), Four Tet
Brevemente:1 de Fevereiro: Hot Chip, Get Well Soon, Los Campesinos, Midlake, The Mary Onettes, Soft Pack, Album Leaf, Dakota Suite, Marina & The Diamonds, Ocean Colour Scene, Peter Von Poehl
8 de Fevereiro: Pantha du Prince, Massive Attack, Sade, Yeasayer, Gil Scott Heron
16 de Fevereiro: Pet Shop Boys (CD + DVD), Peter Gabriel, Blur (DVD), Field Music, Lightspeed Champion, Buggles (reedição), Shearwater, Philip Glass (opera)
Fevereiro: Ratatat, Kasper Bjorke, The Spinto Band, XiuXiu, Efterklang
Março: Jonsi Birisson, Ruby Suns, Goldfrapp, White Stripes, Titus Andronicus, Jimi Hendrix, Nathalie Merchant, Rogue Wave, Black Rebel Motorcycle Club, Liars, Josh Rouse, Love Is All, She + Him
PS. O texto sobre os Magnetic Fields é uma versão editada de uma crítica publicada na edição de 23 de Janeiro da revista NS.