GUSTAV MAHLER: Sinfonia Nº 9, em Ré maior
Orquestra Gulbenkian
Bertrand de Billy (maestro)
FUNDAÇÃO GULBENKIAN: 28 e 29 de Janeiro
Orquestra Gulbenkian
Bertrand de Billy (maestro)
FUNDAÇÃO GULBENKIAN: 28 e 29 de Janeiro
N. G.: Composta num momento em que as ondas de choque das primeiras convulsões de uma nova música começavam a fazer-se notar no coração da Europa musical, a 9ª Sinfonia de Mahler nasce como um espaço de reflexão (e talvez conflito) entre visões de duas realidades distintas. Por um lado a herança do romantismo (e até de formas mais antigas, como o segundo andamento parece indicar). Por outro, e como se sente no complexo primeiro andamento, os primeiros sinais de uma nova inquietação (que tinha já a cidade de Viena como um dos principais pólos de invenção). Foi portanto um desafio o que Mahler então tomou em mãos. Desafio que faz desta uma das suas mais interessantes sinfonias e, igualmente, uma das que mais exige de quem a leva da partitura ao som.
O maestro Bertrand de Billy, cuja obra em disco apresenta já abordagens à música de nomes como Wagner, Gershwin, Berlioz, Beethoven, Richard Strauss e, mais recentemente, Dvorák, enfrentou com a Orquestra Gulbenkian uma nona onde (na primeira noite) se sentiu como do progressivo estabelecer de uma relação com a música, ao avançar dos compassos, se definiu um tom de intimidade e confiança que o fez terminar a noite com merecida aclamação. A tensão, que se desenha entre metais e cordas no primeiro andamento sugeriu um clima de expectativa, cativando uma plateia que, tal como a orquestra, foi vencendo o desafio que o próprio Mahler terá enfrentado quando compôs esta sinfonia entre 1908 e 1909 (a última que completou).
J. L.: Comemorando-se em 2010 os 150 anos do nascimento de Gustav Mahler (a 7 de Julho de 1860), teve especial significado ouvir a sua 9ª Sinfonia para, por assim dizer, inaugurar um ano necessariamente mahleriano. Há nela o assombramento de um mundo em decomposição (mundo histórico e mundo musical), tanto mais carregado de simbolismo quanto a sua primeira apresentação pública — a 26 de Junho de 1912, no Festival de Viena, com Bruno Walter a dirigir a Filarmónica de Viena — ocorreu já depois do falecimento do compositor (a 18 de Maio de 1911). E se o primeiro andamento, Andante comodo, joga em dissonâncias e contrastes onde, agora, podemos ler, em forma cristalina, as diferenças entre século XIX e século XX, o quarto, Adagio, encerra a obra em clima de introspecção, quase quietude, em tudo e por tudo atípico face às matrizes sinfónicas do passado. A suprema actualidade de Mahler provém do génio dessa visão em que a consciência dos contrários é, não a barreira, mas o motor da própria criatividade artística — actualidade estética, política e simbólica.