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sexta-feira, março 04, 2022

A caminho dos Oscars

Adriana De Bose em West Side Story:
a caminho do Oscar de melhor actriz secundária

Os prémios da Academia de Hollywood serão entregues a 27 de março. Com 12 nomeações, O Poder do Cão lidera a corrida aos Oscars referentes à produção de 2021, num ano em que, curiosamente, vários filmes, a começar por West Side Story, são testemunho de uma invulgar riqueza musical — este texto foi publicado no Diário de Notícias (9 fevereiro), com o título 'Os Oscars têm uma música própria'.

Música, eis a questão. Nas nomeações dos Oscars referentes à produção de 2021 encontramos, por exemplo: Billie Eilish, candidata na categoria de melhor canção, com No Time to Die, tema-título do último filme de James Bond (composto com o irmão, Finneas O’Connell). Ou ainda o baterista da banda The Roots, Questlove: o seu Summer of Soul, dando nova vida aos registos do Harlem Cultural Festival de 1969, surge entre os que podem ganhar a categoria de melhor documentário. Isto sem esquecer que Jonny Greenwood, membro dos Radiohead, volta a integrar os nomeados a melhor banda sonora graças à sua partitura para O Poder do Cão, de Jane Campion.
É caso para dizer que ecoa, aqui, uma música muito própria, de tal modo os prémios da Academia de Hollywood conseguem congregar aquela que é a maior estrela pop da actualidade, Billie Eilish, claro, com memórias do património musical afro-americano e o experimentalismo de Greenwood. Foi ele que compôs também a música de Spencer, de Pablo Larraín, porventura o mais “esquecido” dos grandes filmes de 2021, embora esteja representado por uma nomeação, na categoria de melhor actriz, para a admirável Kristen Stewart.
Enfim, não esqueçamos a renovada presença de Steven Spielberg. O seu West Side Story, com sete nomeações, possui o fulgor de um verdadeiro panfleto — musical, justamente. A recriação da obra de Leonard Bernstein e Stephen Sondheim — que deu origem ao primeiro West Side Story (1961), assinado por Robert Wise e Jerome Robbins — repõe na linha da frente um género nem sempre muito reconhecido na história moderna dos Oscars. E se é verdade que todas as apostas são sempre um exercício superficial, por vezes fútil, não é menos verdade que podemos supor que na comunidade de Hollywood todos ou quase todos acreditam que Ariana DeBose, a “Anita” escolhida por Spielberg, tem garantida a estatueta de melhor actriz secundária.
Enfim, a musicalidade de tudo isto não esgota a sedutora pluralidade das nomeações, este ano com um luso-canadiano também em destaque: graças ao seu excelente trabalho em Nightmare Alley, de Guillermo Del Todo, Luís Sequeira é um dos candidatos ao Oscar de melhor guarda-roupa. E também não diminui, de modo algum, a proeza de O Poder do Cão, líder na estatística das nomeações: encontramo-lo em nada mais nada menos que 12 categorias, incluindo, além de melhor filme, as de realização, actor (Benedict Cumberbatch), actor secundário (duas vezes: Jesse Plemons e Kodi Smit-McPhee) e actriz secundária (Kirsten Dunst). Uma coisa é certa: nenhum filme tem nomeações que lhe permitam obter o “quinteto dourado” dos Oscars — filme+realização+actor+actriz+ argumento —, essa conjugação mágica que só aconteceu três vezes (a última data de 1992, com a consagração de O Silêncio dos Inocentes).
Aliás, O Poder do Cão pode simbolizar também as evidências e ambivalências do confronto que, de uma maneira ou de outra, passou a marcar todo o território cinematográfico. A saber: a tensão entre o circuito tradicional das salas e as plataformas de “streaming”. Assim, O Poder do Cão é o emblema perfeito da produção multifacetada da Netflix e da sua ambição (muito legítima, entenda-se) de conseguir, finalmente, arrebatar o Oscar de melhor filme.
Até ao dia da cerimónia destes 94ºs prémios das Academia (27 de março), iremos, por certo, compreendendo melhor o modo como estas nomeações reflectem o estado convulsivo, afinal eminentemente criativo, em que vive a produção cinematográfica. Inclusive nas suas curiosas “contradições”. Exemplo? Repare-se no quinteto de nomeadas para o Oscar de melhor actriz: Jessica Chastain (The Eyes of Tammy Faye), Olivia Colman (A Filha Perdida), Penélope Cruz (Mães Paralelas), Nicole Kidman (Being the Ricardos) e a já citada Kristen Stewart. Que têm em comum? Pois bem, nenhuma delas está nos dez títulos que concorrem para melhor filme — não é inédito, mas não acontecia há 16 anos.

segunda-feira, dezembro 27, 2021

10 filmes de 2021 [1]


Steven Spielberg

Um musical gerado num contexto industrial dominado e, em muitos aspectos, atrofiado pelos super-heróis da Marvel e afins? É verdade. E, para mais, um musical apostado em reavivar a mágoa romântica do original de Leonard Bernstein/Stephen Sondheim, estreado na Broadway em 1957 (importa relembrar que o filme de Spielberg não é um remake do filme de 1961, assinado pela dupla Robert Wise/Jerome Robbins). Verdadeiro ovni de 2021, nele encontramos a energia de um cinema sem barreiras formais, ligando a música com o fresco social, as atribulações do quotidiano com a parábola política e, por fim, o melodrama com a tragédia — sem igual, isto é, literalmente, um objecto de esplendorosa solidão criativa.
 

quarta-feira, dezembro 08, 2021

Stephen Sondheim, Manhattan

Sondheim c. 1976
[Wikipedia]

Entre as muitas homenagens a Stephen Sondheim, falecido no dia 26 de novembro, contava 91 anos, eis uma das mais comoventes. Com apresentação de Lin-Manuel Miranda, uma multidão de profissionais da Broadway reuniu-se num local emblemático de Manhattan [Duffy Square], formando um coro que interpretou o tema Sunday, de um dos musicais de Sondheim: Sunday in the Park with George, inspirado no quadro Uma Tarde de Domingo na Ilha de Grande Jatte, de Georges Seurat.

Sunday, by the blue purple yellow red water
On the green purple yellow red grass
Let us pass through our perfect park
Pausing on a Sunday

By the cool blue triangular water
On the soft green elliptical grass
As we pass through arrangements of shadow
Toward the verticals of trees
Forever

By the blue purple yellow red water
On the green orange violet mass of the grass
In our perfect park

Made of flecks of light
And dark
And parasols
Bum bum bum bum bum bum
Bum bum bum

People strolling through the trees
Of a small suburban park
On an island in the river
On and ordinary Sunday
Sunday
Sunday

sábado, novembro 27, 2021

Stephen Sondheim (1930 - 2021)

24 novembro 2015
— Stephen Sondheim recebe de Barack Obama
a Medalha Presidencial da Liberdade

Génio do musical, Stephen Sondheim faleceu no dia 26 de novembro, na sua casa, em Roxbury, Connecticut — contava 91 anos.
Para os cinéfilos, a sua assinatura destaca-se, inevitavelmente, com West Side Story (1961), musical estreado na Broadway em 1957, para o qual apenas escreveu os versos, sendo a partitura assinada por Leonard Bernstein. Sem esquecer, claro, que o seu único Oscar foi ganho com a canção Sooner or Later (I Always Get My Man), interpretada por Madonna em Dick Tracy (1990), de Warren Beatty.


Em todo o caso, na maior parte dos seus trabalhos, Sondheim assinou música e lírica. Eis algumas referências emblemáticas da sua obra:
West Side Story: filmado por Robert Wise e Jerome Robbins (encenador da estreia na Broadway), tem uma nova versão assinada por Steven Spielberg [estreia: 8 dezembro].
Gypsy: musical de 1959 baseado nas memórias da bailarina de striptease Gypsy Rose Lee, é outro dos poucos casos em que Sondheim não foi o compositor (seria Jule Styne); foi adaptado ao cinema em 1962, com direcção de Mervyn LeRoy e Natalie Wood no papel central.
Company: estreado em 1970, invulgar pela sua complexidade narrativa e também pelo facto de integrar de forma subtil personagens heterossexuais e homossexuais; no mesmo ano, D. A. Pennebaker registou as gravações do elenco num documentário também intitulado Company.
A Little Night Music: o musical de 1973 inspira-se em Sorrisos de uma Noite de Verão (1955), de Ingmar Bergman, tendo sido levado ao cinema em 1977, com direcção de Harold Prince.
Sweeney Todd: a história do barbeiro assassino é, provavelmente, a peça de Sondheim mais vezes levado aos palcos — surgiu em 1979, tendo sido filmada em 2007, por Tim Burton.


Além do filme de Spielberg, Richard Linklater está a trabalhar numa outra adaptação de uma obra de Sondheim, Merrily We Roll Along (estreado em 1981), ainda sem data de estreia anunciada.
O seu legado envolve a releitura e recriação das matrizes clássicas do musical, rasgando novas possibilidades dramáticas e narrativas — os seus efeitos na história dos palcos, e também na relação do cinema com as matérias musicais, definem a modernidade de um género.

>>> Obituário na NPR.
>>> Stephen Sondheim no Internet Broadway Database.

terça-feira, abril 27, 2021

"West Side Story", primeiras imagens

De que falamos quando falamos de West Side Story? Pois bem, do musical de Leonard Bernstein e Stephen Sondheim estreado em 1957 na Broadway, da adaptação cinematográfica de 1961 com assinatura de Robert Wise e Jerome Robbins e, finalmente, da versão de Steven Spielberg, agora agendada para 10 de dezembro (depois de ter estado prevista para 18 de dezembro de 2020) — as primeiras imagens aí estão, 90 segundos de puro deslumbramento.

segunda-feira, junho 04, 2018

"West Side Story" por Steven Spielberg?

[ 1961 ]
Steven Spielberg vai refazer West Side Story: será que podemos antecipar uma nova idade para o cinema musical? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (3 Junho), com o título 'Spielberg reinventa o musical'.

Refazer West Side Story em cinema? É verdade. A notícia já tem quase seis meses e, em boa verdade, para além do anúncio da abertura do casting, pouco se sabe sobre o projecto. A conjuntura histórica poderá favorecer uma associação mais ou menos nostálgica, já que este é o ano em que se assinala o centenário do nascimento do autor da música de West Side Story, Leonard Bernstein (nascido a 25 de Agosto de 1918). Seja como for, no cerne de todas as expectativas está o nome do realizador: Steven Spielberg.
Para o autor de Tubarão (1975), Os Salteadores da Arca Perdida (1981) e A Lista de Schindler (1993), o musical de Arthur Laurents, com partitura de Bernstein e letras de Stephen Sondheim, não será uma referência abstracta. Em 1957, quando West Side Story se estreou nos palcos da Broadway, Spielberg tinha 11 anos. Mais do que isso, para a sua geração, a admirável versão cinematográfica de 1961, assinada por Robert Wise e Jerome Robbins, acabou por se consolidar como um título mítico (consagrado com dez Oscars, incluindo o de melhor filme do ano).
Tony Kushner
Como é que Spielberg irá recriar West Side Story? Sabe-se que o casting para os quatro papéis principais — assumidos no filme original por Natalie Wood, George Chakiris, Rita Moreno e Richard Beymer — aposta na descoberta de novos talentos, sem nome feito no cinema. Sabe-se também que a adaptação terá assinatura de Tony Kushner, o dramaturgo de Anjos na América (lembremos a notável série a que deu origem, em 2003) que já trabalhou com Spielberg nos argumentos de Munique (2005) e Lincoln (2012). E espera-se que Spielberg nos ajude a relançar uma velha expectativa: será possível refazer o musical como um dos géneros nucleares da produção de Hollywood?
Convenhamos que o cepticismo domina. Temos assistido à “ocupação” de Hollywood por entidades como a Marvel, impondo um modelo (de produção e marketing) que secundariza quase tudo o que não envolva algum super-herói a destruir arranha-céus digitais... Mesmo um filme com chancela de Spielberg dificilmente conseguirá, por si só, reconverter tais opções industriais.
Repare-se no apagamento a que foi sujeito um filme como O Grande Showman, de Michael Gracey (agora disponível numa excelente edição em Blu-ray). A sua reinvenção do musical clássico, integrando formas narrativas vindas da área dos telediscos, não bastou para lhe conferir a evidência mediática que merecia. Nem mesmo o protagonismo do brilhante Hugh Jackman ajudou... E, no entanto, quase todos o reconhecem como Wolverine.

>>> Abertura de O Grande Showman.


>>> Alguns clássicos do musical [NYT].

sexta-feira, agosto 28, 2015

Cécile McLorin Salvant, "Look at Me"

É mesmo a sério: depois de WomanChild, a americana Cécile McLorin Salvant aí está com For One to Love, reafirmando a sua radiosa conjugação de composições pessoais com recriações de referências do mais depurado classicismo. Numa galeria de doze faixas, encontramos, assim, cinco novas composições, a par, por exemplo, de The Trolley Song (Hugh Martin/Ralph Blane), cantada por Judy Garland no musical Meet Me in St. Louis/Não Há como a Nossa Casa (1944), de Vincente Minnelli, e Something's Coming (Sondheim/Bersntein), tema de West Side Story aqui recriado numa verdadeira jam session de mais de 10 minutos. O álbum pode ser escutado na NPR; este é o teledisco, simples e sedutor, de Look at Me, uma das peças compostas pela própria cantora.

sábado, agosto 01, 2015

Nos 50 anos de Sam Mendes

Recentemente, Sam Mendes anunciou que, depois de Skyfall (2012) e Spectre — 24º título oficial de James Bond a estrear em Novembro (Portugal: dia 5) —, não dirigirá mais nenhum filme de 007. Moralismos à parte, há um misto de lógica e sabedoria em tal decisão. De facto, com resultados mais ou menos interessantes, Bond será sempre uma franchise que não pode integrar as singularidades de um criador como Mendes.
Estamos a falar, afinal, do encenador do West End (lembremos o seu admirável revival de Company, de Stephen Sondheim, em 1995) que, nomeadamente como director da Donmar Warehouse, se distinguiu pelo misto de classicismo e experimentalismo das suas encenações, depois impondo-se no espaço de Hollywood através de filmes como Beleza Americana (1999) ou esse objecto genial, tão mal conhecido, que é Revolutionary Road (2008).
Mesmo aguardando com curiosidade as proezas de Spectre, é bom saber que Mendes regressará às suas origens — saudemos o seu talento, inteligência e versatilidade, hoje, 1 de Agosto, dia do seu 50º aniversário.

segunda-feira, junho 15, 2015

"Dick Tracy", 25 anos

Dick Tracy, de e com Warren Beatty, chegou às salas de cinema dos EUA no dia 15 de Junho de 1990 — faz hoje 25 anos. É uma data incontornável na evolução das técnicas de estúdio (evitemos o rótulo corrente e, afinal, equívoco dos "efeitos especiais"), marcante para a evolução de muitas matrizes de espectáculo. Adaptando a personagem do detective de gabardina amarela, criada por Chester Gould, Beatty e o seu director de fotografia, o genial Vittorio Storaro, recriava a banda desenhada através de um conceito de estúdio que, afinal, mantinha laços muito fortes com as leis do artifício clássico.
A presença de Madonna em Dick Tracy, interpretando a personagem de Breathless Mahoney, decorre de uma exuberante conjugação de talentos e valores. Importa sublinhar tal aspecto, quanto mais não seja porque o filme foi vítima da imprensa tablóide internacional, apenas apostada em caricaturar a relação Beatty/Madonna. A Rainha da Pop (lançara o álbum Like a Prayer cerca de um ano antes) constitui um elemento vital para o poder mitológico do filme, para mais assumindo um dos desafios mais radicais da sua carreira (porventura só igualado pelo álbum confessional, American Life, que surgiria em 2003): interpretar as canções compostas pelo grande Stephen Sondheim. Uma delas, Sooner or Later, recebeu o Oscar na respectiva categoria — ei-la numa montagem com imagens do filme.


>>> Dick Tracy no TCM.
>>> The Chester Gould Dick Tracy Museum.
>>> Site oficial de Vittorio Storaro.
>>> Site de The Stephen Sondheim Society.
>>> Madonna: o álbum I'm Breathless.

quinta-feira, novembro 13, 2014

Bryan Ferry, como num espelho

O espelho de Bryan Ferry devolve-nos a pose, o estilo e a música de... Bryan Ferry. Não há que enganar: dois anos depois de The Jazz AgeAvonmore, o seu 14º álbum de estúdio, exalta o romantismo de sempre e respectivas ambivalênciais sexuais e morais — a prova aí está, no teledisco do tema de abertura, Loop De Li. São dez canções, oito originais e duas versões (Send in the Clowns, de Stephen Sondheim, e Johnny & Mary, de Robert Palmer), com Rhett Davies na produção e ajudas pontuais de alguns companheiros de sempre: Nile Rodgers, Marcus Miller e Johnny Marr — durante alguns dias (até ao lançamento oficial, a 17 de Novembro), Avonmore pode ser escutado no site da NPR.

sábado, setembro 13, 2014

Cinco filmes de Robert Wise (2)


West Side Story - Amor sem Barreiras 
(1961)

Um dos maiores musicais de todos os tempos, nasceu originalmente para o palco da Broadway (apesar de ter estreado em Washington DC) em finais dos anos 50, juntando a música de Leonard Bernstein, as letras de Stephen Sondheim, as coreografias de Jerome Robbins e o texto de Arthur Laurents. Um quinto elemento entraria em cena pouco depois quando Robert Wise foi chamado para levar esta expressão urbana atual e nova-iorquina do Romeu e Julieta de Shakespeare para o grande ecrã.

Se a música e as danças não eram mais a surpresa - apesar de ter sido o filme a dar-lhes uma definitiva projeção global - a versão cinematográfica de Robert Wise junta interessantes pontos de vista, nomeadamente num trabalho de fotografia notável, uma montagem que valoriza a ligação à música e na forma como sugere uma certa teatralidade cénica nos espaços de exteriores nos quais decorre grande parte da ação. A direção artística é, de resto, um dos valores acrescentados da versão no grande ecrã, valendo a pena sublinhar a excelência da banda sonora registada com novo elenco para uma edição em disco que acompanhou a estreia do filme.

Podem rever aqui o trailer.

quarta-feira, setembro 10, 2014

Um reencontro com 'West Side Story' (2)


O maestro Michael Tilson Thomas apresenta, com a San Francisco Symphony, a primeira gravação da totalidade da música de ‘West Side Story’ feita num palco fora de uma produção teatral. Tal como o fizera Bernstein por ocasião da sua estreia em 1957, procurou nas vozes de atores cantores parte da alma que faz desta obra um caso ímpar de relacionamento entre várias referências. Este texto é parte de um artigo publicado na edição de 30 de agosto do suplemento Q. do DN com o título Um novo episódio na vida de ‘West Side Story’. 

As ideias fundadoras de West Side Story surgiram ainda em finais dos anos 40. O coreógrafo Jerome Robbins desafiara Leonard Bernstein para que, juntos, pensassem uma versão atualizada da história de Romeu e Julieta, situando-a em bairros degradados de Nova Iorque. E desde logo chamam Arthur Laurens para trabalhar um argumento. Mas a carreira de Bernstein como maestro toma então dianteira sobre o seu trabalho como compositor e a ideia fica adiada por uns anos até que, em 1955, uma notícia lida num jornal reanima o projeto. Publicada pelo Los Angeles Times, a notícia referia um caso de violência entre gangues rivais em San Bernardino, do qual resultara um morto. Estava ali o ponto de partida para uma história que ia levar a delinquência juvenil aos palcos do teatro. No outono de 1956, Stephen Sondheim é chamado para escrever as letras das canções. E no Inverno de 57 Bernstein está focado na composição.

“A equipa criativa estava à procura de algo que tivesse um tema universal. E não foi certamente a primeira vez que algo assim foi feito”, comenta Tilson Thomas, agora que chega a disco a sua abordagem ao musical. “West Side Story vem na tradição de espetáculos como Show Boat ou Porgy & Bess ou South Pacific – outras obras que abordaram questões sociais relevantes e controversas. Gosto de pensar que esta é uma tradição que remonta ao teatro Yiddish, cheio de risos mas que também tocava questões sociais e políticas. West Side Story não é uma paródia como Of Thee I Sing ou Let’Em Eat Cake dos Gershwin, que abordam questões sérias de um modo slapstick”, refere na entrevista que acompanha a edição do novo disco.

Numa série de textos e palestras que apresentou nos primeiros anos da década de 50, Bernstein refletira sobre o desenvolvimento das sensibilidades estéticas e intelectuais do público norte-americano. Num deles defendeu a busca de novas formas de expressão do teatro musical (em Whatever Happened to That Great American Symphony?, em 1954) como algo que iria substituir a sinfonia. Talvez se tenha equivocado quanto ao fim da sinfonia, já que obras posteriores de compositores como Philip Glass, John Adams, Arvo Pärt ou Henryk Gorécki deram claras provas contrárias. Mas sobre o desenvolvimento do teatro musical refletiu novamente em American Musical Comedy (Omnibus, 1956), texto em que “insistiu na importância de obras que integrassem as formas artísticas vernaculares norte-americanas” com “sequências musicais alargadas, contraponto e orquestração”. Para Bernstein o novo teatro musical “teria o seu lugar ao lado da revista e da comédia musical, da opereta e da grande ópera, combinando elementos de cada uma sem se restringir aos seus modelos”. (5)

West Side Story parece corresponder a uma materialização desta linha de pensamento. Bernstein juntou à sua formação clássica uma sensibilidade pelo discurso rítmico latino-americano, ecos do jazz e criou o que Barry Seldes descreve em Leonard Bernstein – A Intervenção Cívica de Um Músico Americano como uma “partitura norte-americana verdadeiramente urbana”. Neste seu estudo biográfico sobre Bernstein o autor aponta em West Side Story “o revezamento do jargão de rua com um misto da linguagem da chalaça e da injúria; as jovens porto-riquenhas cantando as grandes contradições da sociedade norte-americana; a euforia e depois o desespero dos namorados perseguidos pelo azar e condenados à infelicidade”, elementos que, diz, se juntam aos “gestos soltos de Robbins para elevar o nível do teatro norte-americano”.

(5) in Leonard Bernstein – A Intervenção Cívica de Um Músico Americano, de Barry Seldes (Bizâncio, 2010), pág. 103.

terça-feira, fevereiro 04, 2014

Bergman x 17 (5)

SORRISOS DE UMA NOITE DE VERÃO (1955)
Grande acontecimento em Lisboa e Porto (e mais algumas cidades): a apresentação de 17 filmes de Ingmar Bergman (1918-2007), a maior parte em cópias restauradas — razões de sobra para rever algumas imagens emblemáticas da filmografia do mestre sueco.

[ 1 ]  [ 2 ]  [ 3 ]  [ 4 ]

Com o seu impecável traje de noite, Gunnar Björnstrand não está a introduzir uma nota cómica no meio de um drama de Ingmar Bergman... Nada disso: ele está mesmo no interior de uma comédia visceral, ironicamente consagrada na filmografia de Bergman como o filme que lhe trouxe uma dimensão internacional, em especial através da sua passagem em Cannes/1956 (no mesmo ano em que o festival acolheu, por exemplo, Pather Panchali, de Satyajit Ray, O Homem que Sabia Demais, de Alfred Hitchcock, ou ainda o derradeiro filme de Humphrey Bogart, A Queda de Um Corpo, de Mark Robson). A partir das atribulações de vários casais, num contexto campestre, algures na alvorada do séc. XX, Bergman encena os êxtases e ilusões do impulso amoroso, por certo, como sublinhou Pauline Kael, ainda influenciado pelo facto de, imediatamente antes, ter dirigido em palco a opereta A Viúva Alegre. Para a história, ficam dois herdeiros muito directos de tais atribulações: o musical A Little Night Music, de Stephen Sondheim (estreado na Broadway em 1973), e o filme Uma Comédia Sexual numa Noite de Verão (1982), de Woody Allen.

segunda-feira, abril 08, 2013

Molly Ringwald regressa ao jazz

Nascida em 1968, Molly Ringwald foi um símbolo das comédias sobre a adolescência escritas e realizadas por John Hughes, há mais de um quarto de século: Sixteen Candles/16 Primaveras (1984), The Breakfast Club/O Clube (1985) e Pretty in Pink/A Garota do Vestido Cor-de-Rosa (1986), esta última já com realização de Howard Deutch. Na verdade, ela vinha do meio musical, cantando desde a infância, a ponto de aos seis anos ter participado em I Wanna Be Loved by You, um álbum de jazz do pai, o pianista cego Bob Ringwald, com o seu grupo The Fulton Street Jazz Band.
Pois bem, Ringwald está de regresso às origens, apresentado aos 45 anos o seu primeiro álbum a solo, Except Sometimes [video de apresentação] — com balanço muito jazzístico, encontramos temas como Sooner or Later (uma das canções compostas por Stephen Sondheim para Madonna, no filme Dick Tracy), I'll Take Romance e The Very Thought Of You (em escuta no site New Releases Now); a fechar o alinhamento, surge Don't You (Forget About Me), dos Simple Minds, precisamente um dos temas emblemáticos da banda sonora de The Breakfast Club.

quarta-feira, outubro 31, 2012

Novas edições:
Danny Elfman, Frankenweenie


Danny Elfman 
“Frankenweenie” 
Walt Disney Records / EMI Music 
4 / 5

Colaborador regular de Tim Burton (só não colaboraram em Ed Wood, por alturas de um desentendimento e Sweeney Todd, uma vez que este era um musical baseado em composições de Stephen Sondheim), Danny Elfman contribuiu, com a sua música, para a definição de uma marca autoral que reconhecemos há muito na obra do realizador, mal imaginando nós os seus filmes com outros sons... E meses depois de um Dark Shadows apenas de rotina – tanto para o realizador como no plano da banda sonora – eis que ambos se reencontram num dos seus melhores projetos dos últimos tempos. Se Frankenweenie, baseado numa curta-metragem sua de 1984, é um dos melhores e mais pessoais filmes de Tim Burton nos últimos anos, a partitura que Danny Elfman aqui assina é também uma das mais cativantes das que nos tem apresentado entre as suas produções mais recentes. Tal como o filme, que toma como central a figura de um cãozinho (na melhor linha Frankenstein) que é diferente de tudo e todos, evoca em vários elementos a memória do sublime Eduardo Mãos de Tesoura, também a música de Elfman reencontra aqui afinidades com esse que continua a ser o paradigma de referência para a relação entre ambos. Estamos pois novamente num terreno de um certo lirismo assombrado, a doçura de certas linhas vivendo sempre ameaçada por sombras (de eventual travo gótico por perto), aos coros cabendo ocasionais frestas de luz numa atmosfera mais densa (as vitaminas de ação de certas sequências exigindo depois maior fôlego rítmico e descargas de intensidade respetivamente sugeridas pelas cordas e metais, o órgão surgindo para acentuar o tom sepulcral da coisa). Apesar do natural mediatismo que o disco-companheiro Frankenweenie Unleashed! possa cativar, dos dois álbuns lançados por ocasião da estreia deste filme este é, claramente, o que mais traduz o que de melhor há em Frankenweenie. Até porque, à exceção da canção de Karen O que escutamos quando chegam os créditos finais e de uma outra, que escutamos no próprio filme, na voz de Winona Ryder, esse álbum companheiro inspirado pelas atmosferas de Frankenweenie é um verdadeiro susto!

terça-feira, agosto 28, 2012

Para regressar a 'West Side Story'


Um dos grandes acontecimentos discográficos de 2012 no departamento das bandas sonoras é a edição de uma versão remasterizada da música criada para o filme West Side Story. Sobre esse feito inesquecível da obra de Leonard Bernstein escrevi um texto na edição deste mês da Metropolis.

“Mas mais que a ideia de recontextualização noutro tempo e noutro lugar de uma história já tantas vezes contada e de uma soberba coreografia assinada por Jerome Robbins, era a música que dava a West Side Story uma alma única e fixava uma identidade. Entre uma série de canções (com letras que seriam todas elas assinadas por Stephen Sondheim) e peças instrumentais, a música de Bernstein revelava por um lado a herança da tradição da Broadway e a formação clássica ocidental do compositor, vincando as coordenadas de tempo, espaço e até mesmo ambiente cultural em flirts aos universos do jazz e da música latino-americana.

O sucesso imediato de canções como Maria, Tonight, Somewhere ou America sugeria desde logo o estatuto de standards em que o tempo as transformaria. Ao mesmo tempo, três das sequências instrumentais que serviam de base a algumas das mais célebres coreografias acabavam reunidas numa suite orquestral que – muitas vezes conhecida como West Side Story Symphonic Dances – que ainda hoje habitam muitos programas de concertos de grandes orquestras (o Mambo, por exemplo, era um “encore” inevitável em concertos da Orquestra Sinfónica Juvenil Simón Bolívar em finais da década dos zeros, quando o nome do maestro Gustavo Dudamel – que gravou e peça no álbum Fiesta! – começava a encher salas pelo mundo fora).”

Podem ler aqui o texto completo

segunda-feira, fevereiro 20, 2012

Bernstein (em versão pop)


Muitas e das mais variadas proveniências têm sido as canções de outros autores reinventadas pelos Pet Shop Boys, em alguns casos com direito até a edição no formato de single. Foi o que aconteceu, por exemplo, com Somewhere. Originalmente um dos temas de Leonard Bernstein (e letra de Stephen Sondheim) para o clássico West Side Story, surgiu em nova versão pelos Pet Shop Boys em 1997.

terça-feira, janeiro 17, 2012

West Side Story: 3 vezes 3


Ao longo desta semana, e aproveitando a edição em Blu Ray de West Side Story, evocamos memórias desse clássico maior do cinema musical norte-americano. Hoje recordamos capas de discos que, gravação após gravação, têm perpetuado e reinventado a música de Leonard Bernstein e as letras de Stephen Sondheim. As três primeiras capas recordam (a primeira) a gravação do elenco da produção original na Broadway em 1957 e (segunda e terceira) o registo da banda sonora original do filme de 1961.

Este segundo lote recorda algumas investidas do mundo do jazz pela música que Bernstein criou para a peça e filme. Recorde-se que não só há uma pulsão jazzística na medula de muita desta música, como a presença de ritmos latino-americanos em vários instantes é igualmente cara a algum jazz. Num dos discos note-se a ideia de abordagem, via bossa nova, aos temas de Bernstein.

A fechar três abordagens, com orquestra, à música de Leonard Bernstein, em alguns casos com o próprio maestro a dirigir as operações. Por todas as capas nota-se a presença quer da arquitectura urbana que o filme representa (e que assinala o cenário urbano, em bairro popular, da narrativa) e da própria cidade de Nova Iorque.

segunda-feira, janeiro 16, 2012

Nos 50 anos de 'West Side Story'


Mais que apenas um feito maior da história do cinema musical norte-americano, West Side Story é um marco cultural do século XX, espelho não apenas das artes que convoca (o cinema, a dança, a música) mas também do espaço social que retrata (a multiculturalidade e a xenofobia na América dos cinquentas). Uma edição especial que assinala o 50º aniversário do filme acaba de sair em formato Blu Ray.

A ideia era a de repensar a medula clássica do Romeu e Julieta de Shakespeare em novo contexto. E sob sugestão de Leonard Bernstein, apontou-se o repensar da trama à Nova Iorque daquele tempo, transformando o jogo de ódios entre as duas famílias de que Shakespeare deu conta num choque entre populações, de um lado os americanos caucasianos de herança europeia, por outro os chegados mais recentemente de Porto Rico, cada um dos grupo representado pelo seu gangue, a luta pelo território – um quase nada pelo qual dão quase tudo – parecendo dar sentido a um quotidiano onde pouco mais parece acontecer. É claro que não falta o Romeu nem a Julieta. Ele é Tony, americano desendente de polacos e trabalha num pequeno bar. Ela é Maria, porto-riquenha, irmã do líder dos Sharks (o respetivo gangue). Olham-se num baile. E, contra tudo e contra todos, não pensam mais senão um no outro. Não falta o tempero de tragédia e, conhecendo Romeu e Julieta, basta adaptar a ideia ao novo tempo e lugar...

Estreado em palco, na Broadway em 1957, West Side Story revelava desde logo uma vibração muito peculiar não apenas dadas as características de uma história que parecia, de facto, falar aquele tempo e aquela gente, mas também pela música de Bernstein, que juntava à tradição do musical (e a toda uma formação clássica) o fulgor do jazz e dos ritmos latino-americanos. Com letras de Stephen Sondheim, canções como Maria, Tonight, Somewhere ou America começavam a trilhar o caminho que delas fez verdadeiros standards, ao mesmo tempo que as danças sinfónicas davam primeiros passos numa vida que delas faz ainda hoje presença regular em programas de concertos de várias orquestras e maestros. A adaptação ao cinema contou uma vez mais com o trabalho exigente do coreógrafo Jerome Robbins, que inclusivamente co-assinou a realização com Robert Wise. Além da música e das impressionantes sequências de dança, o filme reflete ainda um cuidado ao nível da direção de fotografia, os jogos intensos de cores sublinhando os contrastes entre os grupos e lugares, criando uma ideia de encanto característica do palco sem todavia abafar nunca as marcas sociológicas do mundo real que definiam o conflito que serve de base à narrativa. O filme deixou um legado marcante. A visão aérea de Nova Iorque na sequência de abertura fez escola. Muitas das canções conheceram depois novas versões e novas vidas. E alguns gestos, nomes e frases ganharam expressão em outros, e bem diferentes, acontecimentos mais recentes no cinema, na ficção televisiva, na música.


A nova edição em Blu Ray revela uma magnífica transcrição digital que em tudo faz reviver o brilho da cor que caracteriza as imagens. E junta uma pequena multidão de conteúdos adicionais, entre os quais dois documentários – A Place For Us – West Side Story’s Legacy e West Side Story Memories – que permitem o reencontro com vários elementos do elenco e equipa técnica não apenas do filme como da própria produção original de 1957 na Broadway. A música e as danças estão em evidência nos extras com, inclusivamente, um comentário de Stephen Sondheim.

terça-feira, agosto 23, 2011

As primeiras imagens de "Tintin" (1/5)

As primeiras imagens de As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne foram apresentadas à imprensa internacional num encontro num hotel de Paris — estes textos foram publicados no Diário de Notícias (20 de Agosto).

Foi em 1993 que Steven Spielberg surpreendeu o mundo com Parque Jurássico: os seus dinossauros, fabricados digitalmente, ajudaram a lançar uma verdadeira revolução, não apenas nos efeitos especiais, mas também nos conceitos criativos e comerciais do espectáculo cinematográfico. Na altura, Jamie Bell tinha oito anos. A descoberta desse filme é uma fortíssima memória da infância: “Como é que ele tinha conseguido aqueles animais incríveis?”
Steven Spielberg
Bell conquistaria o seu próprio lugar no cinema, com o sucesso de Billy Elliott (2000), filme de Stephen Daldry sobre um rapaz que não quer abdicar do sonho de aprender a dançar. Agora, é o protagonista de As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne, onde interpreta o herói criado por Hergé através do processo de performance capture (a personagem é representada pelo actor e, depois, tratada digitalmente um pouco à maneira de uma figura de animação). E quem realiza o filme é... Steven Spielberg!
Primeiro título de uma trilogia produzida por Spielberg e Peter Jackson (estreia portuguesa: 29 de Outubro), as novas aventuras cinematográficas de Tintin foram apresentadas à imprensa, através de alguns extractos, num hotel de Paris. Bell e Andy Serkis (intérprete do Capitão Haddock) estiveram presentes e, naturalmente, falaram dessa “digitalização” dos actores.
Jamie Bell
Para Bell, a questão central tem a ver com a imaginação do actor: “Será que ainda tenho imaginação, será que ainda consigo estabelecer contacto com as minhas memórias de juventude? Na prática, acaba por ser um processo muito libertador: a nossa imaginação pode levar-nos onde quisermos.”
No caso de Serkis, o processo estava longe de ser uma surpresa, uma vez que, sob a direcção de Peter Jackson, já tinha assumido as personagens digitais de “Gollum”, na trilogia O Senhor dos Anéis (2001-2003), e do macaco gigante de King Kong (2005); recentemente, estreou entre nós Planeta dos Macacos: A Origem, onde ele interpreta “César”, o líder da revolta dos macacos. Em todo o caso, Serkis insiste que se trata “apenas” de um instrumento: “Para um actor, continua a haver uma representação total, imersa na personagem. Não há diferenças, a não ser que não estamos a usar guarda-roupa ou maquilhagem: alguém vai fazer isso a posteriori.” Daí a sugestiva proposta de classificação: “A melhor maneira de resumir o processo é chamar-lhe maquilhagem digital.”
Ainda assim, a experiência foi diferente dos filmes anteriores. Em O Senhor dos Anéis contracenava com os outros actores num estúdio normal e, depois, completava o seu trabalho “num outro estúdio”: agora, em As Aventuras de Tintin, “tudo foi criado no mesmo espaço digital” [Weta Digital, propriedade de Peter Jackson].
Spielberg quis que o seu filme retomasse o espírito tradicional das aventuras mais ou menos misteriosas. “É verdade que falámos dos ambientes clássicos do filme “noir”, de Hitchcock e de referências como Lawrence da Arábia”, recorda Bell. “Mas não se tratava de copiar o que quer que fosse. Para Spielberg, o essencial era apostar em qualquer coisa de novo, nunca vista. Ele consegue isso com os actores porque nos ensina a confiar no instinto, a não ter medo de arriscar, falhar e voltar a experimentar.” E a referência fulcral foi sempre “a estética dos desenhos de Hergé.”
Andy Serkis
Recordando como a experiência no teatro de repertório (Shakespeare, Brecht, Sondheim, etc.) foi essencial na sua formação, Serkis sublinha também a riqueza das personagens. E comenta assim o seu marinheiro bêbedo: “O Capitão Haddock é uma personagem fascinante, uma espécie de desastre ambulante que perdeu a identidade, transporta os pecados dos seus antepassados sem realmente compreender a sua relação com eles.”
Ao mesmo tempo que insiste no valor específico da representação, Bell acrescenta também que não vale a pena esperar grandes distinções: “Ninguém na indústria vai reconhecer este tipo de representação a ponto de ganhar um Oscar.” Mas não é isso que o preocupa. Tendo em conta a complexidade do trabalho efectuado, só não gostaria de ouvir alguém dizer-lhe: “Ah, então foi você que fez a voz de Tintin!”