Pensar o WikiLeaks como o anjo bom que veio, finalmente, expor a maldade do mundo é o golpe antológico da nova ideologia jornalística — é uma ideologia que se oculta, afinal, por trás da perturbação causada por uma avalancha de informações que saltaram de circuitos mais ou menos ocultos para a promiscuidade do nosso planeta mediático. Não que se possa banalizar essa informação, ainda menos contornar as questões que ela coloca a alguns modos da sua gestão pelos Estados democráticos. Em todo o caso, proclamar que, finalmente, conhecemos a "realidade" não passa de um gesto anedótico, típico da infantilização mediática do nosso mundo — em causa está, isso sim, a configuração de uma nova realidade.
O escritor americano Martin Cruz Smith (Gorky Park) coloca tal questão a partir de uma saborosa ironia: passámos a viver num mundo de pulp fiction em que a realidade é tanto aquilo que conhecemos como uma entidade ficcional cujo casting vamos refazendo. Daí o seu jogo divertido, imaginando um filme sobre o WikiLeaks em que Julian Assange seria interpretado por John Malkovich [fotos], Vladimir Putin por Arnold Schwarzenegger ou Silvio Berlusconi por Danny DeVito — vale a pena ler o texto de Smith: foi publicado pela Newsweek e chama-se 'Pulp fiction as the new reality'.