A revista Egoísta assinalou os 50 anos do Casino Estoril com uma edição especial dedicada ao número "50" — este texto integra essa edição, com o título 'She's not me' [fotogramas do video de Love Don’t Live Here Anymore (1996), dirigido por Jean-Baptiste Mondino].
[1/5] [6/10] [11/15] [16/20]
21. A invasão do Iraque pelas tropas dos EUA iniciou-se a 30 de Março de 2003. No dia 31, Madonna lançava o seu teledisco de “American Life”, do álbum homónimo (o teledisco fora rodado a 6 e 7 de Abril, em Los Angeles, sob a direcção de Jonas Akerlund). No dia seguinte, portanto 1 de Abril, Madonna decidia cancelar o teledisco: “Decidi não distribuir o meu novo video. Foi filmado antes da guerra ter começado e não creio que seja apropriado difundi-lo nesta altura.”
22. A retirada de circulação do video de “American Life” possui um valor simbólico pouco referido (e quase sempre banalizado pelos que se limitam a uma contabilidade mediática em que se avalia quem “ganhou” e quem “perdeu”). Ao cancelar a difusão do seu trabalho, Madonna compreendeu que tudo se joga a partir do poder institucional que as imagens contêm ou podem mobilizar. Naquele momento, ser “Rainha da Música Pop” não bastava.
23. Em finais de 1990, para lançar “The Immaculate Collection”, Madonna fez um teledisco para “Justify My Love”, sob a direcção de Jean-Baptiste Mondino. Encenado como uma viagem (pelos corredores de um hotel) em que Madonna descobre várias actividades de natureza erótica, o video seria recusado pela MTV, na altura, muito antes do YouTube, ainda o espaço por excelência de difusão deste tipo de produtos. Como resposta, Madonna lançou “Justify My Love” em cassete (VHS).
24. Não será arriscado supor que, daqui a alguns anos (décadas, se for caso disso), o teledisco de “American Life” virá a ter uma divulgação aberta, por certo com algumas componentes especificamente comerciais. Quando isso acontecer, será visto como um achado arqueológico capaz de nos iluminar sobre as atribulações de uma época “bizarra”. Ficará, então, a pergunta: por que é que as imagens interditas nunca perdem poder?
25. Fui educado num mundo de muitas imagens interditas. Ainda hoje me pergunto até que ponto as muitas restrições que envolviam a exposição de imagens de cariz sexual (no cinema, por exemplo) formataram a percepção das relações humanas – em particular do amor – por mim e, como é óbvio, por toda a minha geração. Embora sem qualquer atracção pelas formas estatais de censura, não tenho a certeza que o “liberalismo” da Internet nos faça mais inteligentes.
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21. A invasão do Iraque pelas tropas dos EUA iniciou-se a 30 de Março de 2003. No dia 31, Madonna lançava o seu teledisco de “American Life”, do álbum homónimo (o teledisco fora rodado a 6 e 7 de Abril, em Los Angeles, sob a direcção de Jonas Akerlund). No dia seguinte, portanto 1 de Abril, Madonna decidia cancelar o teledisco: “Decidi não distribuir o meu novo video. Foi filmado antes da guerra ter começado e não creio que seja apropriado difundi-lo nesta altura.”
22. A retirada de circulação do video de “American Life” possui um valor simbólico pouco referido (e quase sempre banalizado pelos que se limitam a uma contabilidade mediática em que se avalia quem “ganhou” e quem “perdeu”). Ao cancelar a difusão do seu trabalho, Madonna compreendeu que tudo se joga a partir do poder institucional que as imagens contêm ou podem mobilizar. Naquele momento, ser “Rainha da Música Pop” não bastava.
23. Em finais de 1990, para lançar “The Immaculate Collection”, Madonna fez um teledisco para “Justify My Love”, sob a direcção de Jean-Baptiste Mondino. Encenado como uma viagem (pelos corredores de um hotel) em que Madonna descobre várias actividades de natureza erótica, o video seria recusado pela MTV, na altura, muito antes do YouTube, ainda o espaço por excelência de difusão deste tipo de produtos. Como resposta, Madonna lançou “Justify My Love” em cassete (VHS).
24. Não será arriscado supor que, daqui a alguns anos (décadas, se for caso disso), o teledisco de “American Life” virá a ter uma divulgação aberta, por certo com algumas componentes especificamente comerciais. Quando isso acontecer, será visto como um achado arqueológico capaz de nos iluminar sobre as atribulações de uma época “bizarra”. Ficará, então, a pergunta: por que é que as imagens interditas nunca perdem poder?
25. Fui educado num mundo de muitas imagens interditas. Ainda hoje me pergunto até que ponto as muitas restrições que envolviam a exposição de imagens de cariz sexual (no cinema, por exemplo) formataram a percepção das relações humanas – em particular do amor – por mim e, como é óbvio, por toda a minha geração. Embora sem qualquer atracção pelas formas estatais de censura, não tenho a certeza que o “liberalismo” da Internet nos faça mais inteligentes.
[continua]