segunda-feira, setembro 07, 2009

Novas aventuras de Steven Spielberg

1997 - promoção de Parque Jurássico: O Mundo Perdido

Cinema americano e produção indiana vão cruzar-se cada vez mais. Veja-se o caso de Steven Spielberg: a sua trajectória continua a passar por Hollywood, mas também por... Bollywood -- este texto foi publicado no Diário de Notícias (6 de Setembro), com o título 'As várias batalhas de Steven Spielberg'.

Não haverá cineasta americano mais ocupado que Steven Spielberg. Há várias décadas, como é óbvio. Afinal de contas, foi ele que, em 1975, mudou por completo a paisagem de Hollywood e, em boa verdade, o funcionamento de quase todos os mercados com o primeiro blockbuster da era moderna: Tubarão. Neste momento, entre os seus projectos incluem-se: uma trilogia com a personagem de Tintin, coproduzida com Peter Jackson (o primeiro título, dirigido pelo próprio Spielberg, chegará às salas em 2011); um remake do célebre Harvey, título de 1950 com James Stewart; um filme biográfico dedicado a Abraham Lincoln, baseado num livro de Doris Kearns Goodwin, adaptado por Tony Kushner (Anjos na América).
Entretanto, há poucos dias foi anunciado mais um projecto a que, de uma maneira ou de outra, o nome de Spielberg [foto] ficará ligado. Assim, o seu estúdio DreamWorks adquiriu os direitos de adaptação daquele que será o primeiro de dois romances póstumos de Michael Crichton: chama-se Pirate Latitudes (a ser lançado em Novembro) e narra uma aventura na Jamaica, em meados do século XVII. Embora a DreamWorks ainda não tenha revelado o nome do realizador, não será arriscado supor que Spielberg se interessará pela tarefa, tendo em conta que foi ele que dirigiu Parque Jurássico (1993) e Parque Jurássico: O Mundo Perdido (1997), ambos baseados em livros de Crichton. Aliás, sabe-se que David Koepp, argumentista desses dois títulos, será também o responsável pela adaptação de Pirate Latitudes.
Mas o valor simbólico desta notícia está para além das especificidades do projecto. Isto porque Pirate Latitudes [capa do livro] é o primeiro filme anunciado pela DreamWorks depois de ter sido oficialmente divulgado o acordo que Spielberg conseguiu estabelecer com o grupo indiano Reliance, especialmente interessado em desenvolver o seu papel no entertainment global. Ao longo do último ano, Spielberg manteve negociações com a Reliance, apostando em criar laços entre Hollywood e a produção da Índia (“Bollywood”, na gíria cinematográfica). De início, a ligação da Reliance com a DreamWorks apontava para um investimento de 50 milhões de dólares num único filme. O certo é que as negociações se desenvolveram num sentido muito mais amplo e ambicioso, tanto mais que a Walt Disney Company entrou no acordo na qualidade de distribuidora. Na prática, o negócio envolverá qualquer coisa como 825 milhões de dólares.
Para além dos números, podemos perceber que as várias batalhas de Spielberg são um dos reflexos mais directos de uma evolução da produção global que tem como componente nuclear uma certa “descentralização” de Hollywood. Poderá dizer-se que a DreamWorks, criada em 1994, surgiu como uma espécie de reinvenção do conceito clássico de estúdio, rapidamente conseguindo criar uma marca própria (incluindo na área dos desenhos animados, com o fenómeno Shrek). Ao mesmo tempo, a sua actividade decorre de um pragmatismo financeiro e artístico capaz de reconhecer a importância crescente de alianças com outras entidades, de outras zonas económicas e culturais. Quando Quem Quer Ser Bilionário [cartaz], ligado a outro estúdio (Fox), ganhou os últimos Oscars, percebeu-se que a abertura asiática podia ser uma hipótese importante para a produção anglo-saxónica. Agora, é uma certeza.