Um dos mais esclarecedores sintomas da desvalorização triunfante do trabalho crítico é a proliferação de um novo tipo de personalidade (em boa verdade, um exclusivo da Internet): o fan desiludido. Fan de quê? De um determinado crítico.
Que distingue, então, o fan desiludido? É uma espécie de dedicação atraiçoada. Ou seja: o fan considera que manteve algum tipo de "fidelidade" a determinado crítico, até que um dia descobre, como se fosse um pesadelo, que a cabeça do dito crítico não pensa como ele julgava, esperava e, num certo sentido, exigia.
Que faz, então, o fan? Se tivesse um bocadinho de auto-estima, diria: "Que bom que é pensar pela minha cabeça." Mas não: indigna-se porque o outro não pensa como ele. Resultado: em 99,999 por cento dos casos desata a insultar o pobre do crítico que, coitado, não o conhece de parte nenhuma e se limita a continuar a fazer o seu trabalho.
Não que isto implique a ideia segundo a qual o pensamento do dito crítico seja, ou deva ser, intocável. Qualquer pensamento crítico — qualquer pensamento tout court — sabe que divide o mundo, potenciando os seus inconciliáveis. Que diabo, ninguém defende o exercício da crítica como uma coutada de verdade (eu não defendo, pelo menos).
O que é terrível é que a violência da Internet tenha chegado a este ponto: haver quem imagine (?) a figura do "crítico" como uma espécie de sacerdote dotado da palavra divina, para depois, quando finalmente se depara com a salutar diferença do seu próprio sentir e pensar, proclamar o carácter maligno do... outro!!! Chama-se a isto má fé virtual.