Ainda as proezas do robot WALL-E. Ou como os avanços tecnológicos se combinam com a tradição narrativa — este texto foi publicado no Diário de Notícias (16 de Agosto), com o título '2815: Odisseia na terra'.
Será talvez inevitável que WALL-E seja avaliado em função da evolução dos estúdios Pixar, desde a eufórica revelação de Toy Story (1995) até à sofisticação de Ratatouille (2007), desde a afirmação do estúdio como força fundamental nos desenhos animados digitais até à sua integração no espaço de produção e distribuição da Disney. Estamos, de facto, perante um objecto que ilustra de forma exuberante o triunfo de novas técnicas de animação que, na prática, secundarizaram o tradicional desenho manual (durante décadas simbolizado pela própria Disney).
Em todo o caso, importa não esgotar o impacto de WALL-E num banal endeusamento da tecnologia. Porquê? Antes do mais porque aqui reencontramos um valor que, não por acaso, foi uma pedra de toque em todo o trabalho de Walt Disney. A saber: a importância da narrativa (ou, mais especificamente, do argumento) num filme de desenhos animados.
Escrito a partir de uma história da autoria de Peter Docter e do próprio realizador Andrew Stanton (que dirigiu À Procura de Nemo, em 2003), WALL-E possui esse poder, afinal muito clássico, de integrar uma série de referências do mundo (e dos filmes) da ficção científica para construir uma fábula actualíssima e, à sua maneira, muito política sobre o destino do planeta Terra e, em particular, a indiferença ecológica da raça humana.
Esta é a história de um robot, o derradeiro da sua série, que ficou para trás (entenda-se: permanece na Terra) para limpar o lixo com que os humanos, a partir do ano 2110, tornaram inabitável o seu querido planeta. Decorreram cerca de 700 anos (a acção remete-nos para 2815) e WALL-E entrega-se à tarefa quotidiana de reunir o lixo em pequenos cubos acumulados como novos arranha-céus.
Tudo se joga, então, a partir da visita de um emissário dos humanos que, algures numa outra galáxia, vivem uma vida de “bem estar” tecnológico que os fez esquecer as maravilhas do seu planeta verde. Aliás, trata-se de uma emissária, de nome Eva (hélas!...) que, muito romanticamente, vai viver com WALL-E uma aventura que coloca em jogo o destino do planeta.
A animação evoluiu para uma complexidade temática e dramatúrgica que transforma WALL-E, não num mero cartoon mais ou menos burlesco (o que já seria bem simpático), mas num filme que, embora visando os espectadores de todas as faixas etárias, possui a densidade de um objecto verdadeiramente adulto.
Quando muitos filmes enraizados na mesma área do entertainment americano escolhem uma ligeireza gratuita, apoiada na exploração de “efeitos especiais” cada vez mais estereotipados, WALL-E vem afirmar a possibilidade de o espectáculo arriscar pensar com o seu espectador, sem que para isso abdique das suas mais básicas delícias. Incluindo as delícias cinematográficas, ou não fosse WALL-E um cinéfilo que gosta de ver e rever a sua preciosa cassete do musical Hello, Dolly!, dirigido por Gene Kelly em 1969.
Será talvez inevitável que WALL-E seja avaliado em função da evolução dos estúdios Pixar, desde a eufórica revelação de Toy Story (1995) até à sofisticação de Ratatouille (2007), desde a afirmação do estúdio como força fundamental nos desenhos animados digitais até à sua integração no espaço de produção e distribuição da Disney. Estamos, de facto, perante um objecto que ilustra de forma exuberante o triunfo de novas técnicas de animação que, na prática, secundarizaram o tradicional desenho manual (durante décadas simbolizado pela própria Disney).
Em todo o caso, importa não esgotar o impacto de WALL-E num banal endeusamento da tecnologia. Porquê? Antes do mais porque aqui reencontramos um valor que, não por acaso, foi uma pedra de toque em todo o trabalho de Walt Disney. A saber: a importância da narrativa (ou, mais especificamente, do argumento) num filme de desenhos animados.
Escrito a partir de uma história da autoria de Peter Docter e do próprio realizador Andrew Stanton (que dirigiu À Procura de Nemo, em 2003), WALL-E possui esse poder, afinal muito clássico, de integrar uma série de referências do mundo (e dos filmes) da ficção científica para construir uma fábula actualíssima e, à sua maneira, muito política sobre o destino do planeta Terra e, em particular, a indiferença ecológica da raça humana.
Esta é a história de um robot, o derradeiro da sua série, que ficou para trás (entenda-se: permanece na Terra) para limpar o lixo com que os humanos, a partir do ano 2110, tornaram inabitável o seu querido planeta. Decorreram cerca de 700 anos (a acção remete-nos para 2815) e WALL-E entrega-se à tarefa quotidiana de reunir o lixo em pequenos cubos acumulados como novos arranha-céus.
Tudo se joga, então, a partir da visita de um emissário dos humanos que, algures numa outra galáxia, vivem uma vida de “bem estar” tecnológico que os fez esquecer as maravilhas do seu planeta verde. Aliás, trata-se de uma emissária, de nome Eva (hélas!...) que, muito romanticamente, vai viver com WALL-E uma aventura que coloca em jogo o destino do planeta.
A animação evoluiu para uma complexidade temática e dramatúrgica que transforma WALL-E, não num mero cartoon mais ou menos burlesco (o que já seria bem simpático), mas num filme que, embora visando os espectadores de todas as faixas etárias, possui a densidade de um objecto verdadeiramente adulto.
Quando muitos filmes enraizados na mesma área do entertainment americano escolhem uma ligeireza gratuita, apoiada na exploração de “efeitos especiais” cada vez mais estereotipados, WALL-E vem afirmar a possibilidade de o espectáculo arriscar pensar com o seu espectador, sem que para isso abdique das suas mais básicas delícias. Incluindo as delícias cinematográficas, ou não fosse WALL-E um cinéfilo que gosta de ver e rever a sua preciosa cassete do musical Hello, Dolly!, dirigido por Gene Kelly em 1969.