Com três prémios para dois filmes, o cinema português conseguiu um balanço especialmente feliz na edição de 2012 da Berlinale. A presença no palmarés de Rafa, de João Salaviza, e Tabu, de Miguel Gomes, envolve uma significação que importa não escamotear: um número significativo de títulos português continua a dar cartas nos grandes certames internacionais do cinema, confirmando a vitalidade criativa de uma (não-)indústria tantas vezes tratada, nos mais diversos sectores sociais e políticos, com lamentável indiferença, para não dizer agressivo menosprezo. O texto que a seguir se reproduz foi publicado como balanço do evento, no Diário de Notícias (19 Fevereiro), com o título 'Filmar, produzir e promover'.
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Dois filmes: Rafa, de João Salaviza, e Tabu, de Miguel Gomes. Dois prémios em Berlim. Que fazer com esta magnífica abundância? Quantas pessoas continuam a considerar que o cinema português é um fenómeno sem importância que só serve para esbanjar dinheiro?... Resposta: muitas (promovendo uma sistemática cegueira perante o facto indesmentível de o cinema ser, há muito tempo, um dos nossos principais cartões de visita na dinâmica global da cultura contemporânea).
Em Portugal, afirmar que o cinema português não passa de um devorador de “subsídios”, eis o que faz parte de um desporto antigo, promotor de ignorância. Sintomaticamente, os seus praticantes não dizem uma palavra sobre a avalancha de mediocridades (e desequilíbrios financeiros) com que, há mais de três décadas, a telenovela vai minando o tecido cultural português.
Provavelmente, aquelas mesmas pessoas ficariam satisfeitas por ver Tabu promovido como... uma produção brasileira. É verdade. Aconteceu na Berlinale: tratando-se de um título coproduzido por vários países (Portugal/Alemanha/Brasil/França), foi a parte brasileira que defendeu os seus interesses, publicando anúncios de página inteira, dedicados a Tabu, nas principais revistas internacionais editadas durante o festival.
Ora, como sempre, não se trata de favorecer unanimismos estúpidos. Defender o cinema português não é promover nenhum mentalidade de comité central. É, isso sim, considerar que as suas especificidades (incluindo a sua genuína diversidade) podem e devem ser preservadas de forma transparente e sistemática. E que isso, para além dos méritos e talentos de quem faz os filmes, implica estratégias de produção e promoção. Numa palavra, dinheiro.